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Eduardo Campos 05/11/2016 11:49
    Às Vezes, Ir Embora é uma Breve Aventura

    Às Vezes, Ir Embora é uma Breve Aventura

    Relato da partida da cidade de Powell River, outro paraíso para o MTB

    Partida de Powell River

    Dia de partir de Powell River. Apesar dessa cidade ficar localizada no continente, numa região conhecida como Sunshine Coast, é preciso pegar duas balsas para chegar à Vauncouver.

    Eu, como estava com minha bike desmontada e embalada numa caixa de papelão, tive que optar por um caminho mais longo. Ao invés de margear o continente, teria que atravessar o braço de mar para chegar a Ilha de Vancouver (não confundam com a cidade de Vancouver, que era meu destino final) e então voltar para o continente num ponto mais ao sul. Isso porque o trajeto pela costeira, depois da primeira balsa, é feito numa van. E conversando com os caras da empresa de transporte eles me disseram que não era possível garantir espaço para a magrela. Se ela estivesse montada, beleza, iria no rack dianteiro da van. Mas não estava porque eu tinha um trem para Portland no dia seguinte cedinho e não daria tempo de encontrar uma nova caixa para embalar a bike.

    Bom, comprei a passagem pelo caminho mais longo. Acordei cedo para chegar à balsa às 7h30.

    À noite anterior a minha partida o tempo piorou e começou a ventar e chover. Cheguei ao pier e descobri que travessia havia sido cancelada. Talvez voltasse a operar apenas às 11h. A primeira peça do dominó foi derrubada. Eu tinha duas passagens de ônibus compradas em empresas diferentes e a primeira delas iria perder com certeza. Fiquei ali matutando em como chegar à Vancouver, tinha que ir para lá naquele dia. Primeiro me ocorreu tentar uma carona. Mas não me pareceu razoável carregar a mochila e a bike na caixa de papelão, embaixo de chuva, até a estrada e ficar lá com o polegar estendido torcendo por uma pick-up com espaço na carroceria.

    Então me lembrei da empresa que faz o trajeto pela costeira. Poderia ser uma alternativa, ao menos até a primeira balsa. Só há um ônibus por dia. Fui até o local onde ele passa e fiquei esperando. O tempo corria e eu achava que esse ônibus não viria, pois não havia mais ninguém no ponto. Pensei que o motorista não iria desviar seu caminho para passar ali uma vez que ninguém havia comprado a passagem. Toma começar a elaborar um plano C, pois o B parecia que não iria funcionar. Ainda bem que nem tudo que parece é. Com um certo atraso o ônibus dobrou a esquina. Consegui colocar a bike dentro desse primeiro, que era grande. O desafio agora estava no segundo, após a balsa. Parei de pensar e decidi tirar um cochilo.

    Ao chegar à primeira balsa havia uma pequena fila de carros. Comecei a mapear quem poderia me dar uma carona. Precisava ser um carro grande, com espaço vazio e que estivesse indo para Vancouver. Identifiquei alguns carros e seus motoristas. Achei melhor abordá-los dentro da balsa.

    Embarquei. Deixei a bike próxima aos carros e subi para a área reservada aos passageiros. Fui pra frente da balsa e encostei minha mochila na murada e sentei para pensar a elaborar o plano de abordagem. À minha esquerda estava um cara magro, alto, cabelos claros e um pouco longos. Parecia um tipo argentino, na verdade. Estava lá carregando seu celular e começou a cochilar. Eu coloquei no meu radar um tiozão nada simpático que tinha uma bela pickup. Comecei a bolar a frase matadora para ir falar com ele. Mas aí o tipo argentino desperta, olha para minha mochila e pergunta se eu estava fazendo trekikng. O papo engata e ele falou que estava com uma van branca (que eu não tinha visto), tinha espaço de sobra no baú, estava indo para Vancouver e que poderia me levar. Maravilha!

    Ele se chamava Martin, na pronúncia espanhola e não na inglesa. Havia se mudado há pouco para Powell River, para trabalhar como carpinteiro. Veio menino da Inglaterra (tinha quase certeza de que era argentino!), de barco com família toda, para o Canadá. Trabalhou no mar, velejou muito, e disse que aos 40 anos havia reinventado sua vida, transformou-se em carpinteiro. Pensei que isso fosse recente, pois achava que ele teria no máximo uns 45 anos. Mas me disse que tinha 52. Cara muito tranquilo. Adora caminhar pela mata. Acha bacana Powell River, mas sente falta da diversidade. Não vê negros pela cidade. É árduo defensor do convívio das diferentes culturas para o enriquecimento dos indivíduos.

    Seguimos papeando pela estrada até pararmos numa cervejaria local onde ele encheu um garrafão de vidro que carregava. Tínhamos tempo de sobra. Após atravessar a segunda balsa, paramos em Horseashoe Bay, onde mora seu pai, um octogenário com muitos planos pra o futuro. Almoçamos lá. Por fim, ele me deixou na porta do meu hotel. Nos despedimos ao modo brasileiro, com um bom abraço, daqueles que traduzem cumplicidade e agradecimento pelo encontro.

    Mais um estranho que me faz um grande favor que provavelmente nunca poderei retribuir. Espero que alguém o faça por mim. E não estou desejando que Deus lhe pague. O que devo a ele irei pagar para alguém que estiver pelo meu caminho, fazendo assim girar a roda do Random Acts of Kindness, algo bem bacana que parece ter surgido em Powell River (se eu me animar explico num outro post).

    P.S. Esqueci de pagar o passagem de ônibus até a primeira balsa. Escrevi para o Dmitri, gerente da empresa, e ele respondeu: ano que vem você acerta bróder! E a foto da caixa comunitária, onde você pega ou deixa alguma comida, foi feita em Powell River. Definitivamente esse é um lugar com gente especial.

    Eduardo Campos
    Eduardo Campos

    Publicado em 05/11/2016 11:49

    Realizada em 14/10/2016

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    Eduardo Campos

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