Rio Araguaia e Ilha do Bananal
Três dias pela região do rio Araguaia - Tocantins, Parque Estadual do Cantão e Ilha do Bananal
Hiking NavegaçãoRio Araguaia. Foi em uma aula de Geografia no colégio que pela primeira vez esse nome deixou de ser apenas o rio que separa Tocantins do estado do Pará e ganhou para mim também uma história. E foi nos meandros da resistência da Guerrilha do Araguaia que eu naveguei por toda juventude, seduzida pelos seus mistérios e tomando-a como símbolo de um outro Brasil que poderia ter sido possível. Assim, não era pouca a emoção quando pisei em suas águas pela primeira vez, em julho desse ano.
A experiência toda foi organizada pelo Leonardo, da agência CCTRekking, que opera na região há muitos anos e que desenvolve um trabalho tão apaixonante, capaz de amolecer os corações mais endurecidos que por ali chegar. Saímos de Palmas em direção a Caseara, onde tomamos um barco e seguimos a norte até um acampamento muito bem estruturado montado dentro da mata, às margens do rio Araguaia - que fica bastante baixo nessa época do ano, formando praias belíssimas em toda sua extensão.
Lá, fomos recebidos com arroz, feijão tropeiro, tucunaré e mousse de açaí, feito por uma equipe que esbanjava dotes culinários e também muita simpatia. Barriga cheia, saímos para uma volta de barco, quando pudemos avistar inúmeros biguás, garças de diversas espécies, os coloridos jacu-ciganos e colhereiros. A agência opta por não atrair os animais silvestres por meio de uma alimentação forçada, o que faz a experiência ser sempre uma grande surpresa. Agradável surpresa.
Ao fim da tarde, paramos em uma praia já no estado do Pará, onde o sol dourado iluminava o Seu Manoel, pescador da região, que nos divertiu com suas histórias mirabolantes sobre as piranhas que habitam o rio. Quando a meia-lua começou a aparecer, voltamos ao acampamento e finalizamos o dia com aquela conversa sem fim aos pés de uma fogueira.
Os dias de uma boa viagem são aqueles que começam cedo. E antes do sol nascer estávamos Sara e eu caminhando pelas margens do rio em busca do nascer não do sol, mas dos pássaros, que acordam com aquela típica alegria estridente e também inspiradora.
Nascido o dia, partimos para mais uma volta de barco na região, dessa vez a sul, tomando o caminho do Rio do Coco até a unidade de conservação criada em 1998 chamada Parque Estadual do Cantão, também conhecida como berçário do Araguaia, uma vez que mantém em seu interior inúmeros lagos que servem para reprodução e engorda de diversas espécies de peixes amazônicos. Aliás, vale a pena comentar que a região do Cantão é de uma biodiversidade única. Trata-se de um encontro de dois grandes ecossistemas brasileiros: o cerrado e a amazônico. Por essa razão, encontramos características de ambos em um mesmo lugar. Lá é possível observar mais de 50 espécies de mamíferos, principalmente a ariranha; mais de 400 espécies de aves; sem contar os répteis e os peixes.
No parque, que também serviu de cenário para a gravação do filme brasileiro “Xingu”, fizemos algumas trilhas de observação na companhia agradável novamente do barqueiro Seu Manoel. Mestre raizeiro e dono de um sotaque gostoso de ouvir, nos contou sobre os chás de cagaita, da abortiva folha de “mata-menino”, da estranha “folha de carne”, da caraíba e de um universo de tantos outros saberes - da mata, do rio e da vida – e que me fizeram pensar no quão poderosa é essa gente Brasil afora.
Na parte da tarde, partimos de carro em direção à cidade de Lagoa das Confusões, onde passamos a noite ao som de um animadíssimo forró. No dia seguinte, nosso destino era a maior ilha fluvial do mundo, a Ilha do Bananal. No caminho passamos por uma plantação de soja pertencente à Fazenda Diamante. Cenário triste e tão simbólico de nosso país, a gigantesca fazenda acaba por abrigar em seu interior uma diversidade absurda de animais, de tuiuiús e carcarás a veados do cerrado e emas, de jacarés-açus a gaviões.
Já às margens do Rio Javaé, atravessamos de barco e caminhamos para o interior da Ilha do Bananal. A região abriga muitos grupos indígenas, principalmente das etnias Karajá-Javaé, Avá-Canoeiro e Tapirapé. Alguns, aliás, que se recusam a estabelecer contanto inclusive com outros grupos étnicos da região. Fomos visitar uma das mais acessíveis, a aldeia javaé Boto Velho, onde vivem cerca de 30 famílias.
E mesmo sem dominar a língua Inãm, houve troca, houve alegria e muitas brincadeiras com as pequenas netas da Dona Belina. Porque mesmo sem língua, a vida pulsa em conjunto, numa batida que é a da irmandade.
Com o coração que cabia o mundo inteiro e a saudade que já se anunciava, voltamos para Palmas.
A região é belíssima! Trata-se de um tipo de viagem que pode ser feita por pessoas de todas as idades, inclusive crianças. O Leonardo faz tudo com tanta paixão pelo lugar que chega a transbordar e não há quem possa se abster de sentir tudo aquilo com ele. As caminhadas são tranquilas e a agência monta uma estrutura de cair o queixo.
Fiquei com muita vontade de voltar, especialmente em outra época do ano para poder ver também a cheia do Rio Araguaia. E se para mim por tanto tempo esse nome foi carregado por uma história de luta, hoje só consigo pensar em paz. E pensar na vontade de voltar para lá junto de todas as pessoas que eu amo e que têm o coração do lado certo do peito.
Contatos da CCTreking
Leonardo Azevedo
(63) 8405.5011 ou (63) 3379.1016
http://www.cctrekking.com.br/
Bruna todos os teus relatos são claros e apaixonantes. Este em particular, fiquei emocionada e sentir as lágrimas rolarem. Muito bacana, Parabéns. Amo td isso. Um grande abç!
Parabéns, realmente conseguiu descrever com clareza a experiência e me fez querer ir conhecer e viver essa história. Obrigado
Vera, Luiz, muitíssimo obrigada! Fico lisonjeada com o carinho que tiveram na recepção do texto. Obrigada mesmo. <3