Clássica e Revolucionária: Travessia Marins x Itaguaré x 32
Mais uma caminhada clássica da Serra da Mantiqueira,bem na divisa de São Paulo com Minas Gerais. Emendamos com a trilha da revolução de 1932
Montañismo TrekkingCLÁSSICA E REVOLUCIONÁRIA: TRAVESSIA MARINS X ITAGUARÉ X 32
.........’’Amoitados juntos à Estação Túnel da Mantiqueira, na divisa entre Passa Quatro-MG e Cruzeiro-SP, observamos atentamente os desdobramentos da Revolução de 1932. De um lado as tropas mineiras à serviço do ditador Getúlio Vargas. Do outro lado do túnel, as tropas paulistas, capitaneadas por inescrupulosos senhores do café, que na ânsia de voltarem ao poder, sustentam vergonhosamente uma guerra estúpida, com a desculpa de se fazer uma nova constituição. Por incrível que possa parecer, é uma batalha travada por soldados que ontem mesmo eram irmãos, serviam juntos em vários quartéis espalhados pelo Brasil e agora lutam uns contra os outros por uma causa que nem eles mesmos sabem qual é. A batalha é sangrenta e já vitimou centenas de vidas dos dois lados do túnel. Os paulistas resistem bravamente entrincheirados ao longo da Serra da Mantiqueira, desde o Pico da Gomeira até o Itaguaré, parece mesmo que a batalha vai ser longa. De onde estamos é possível ver uma chuva de balas vindas do lado paulista e logo passa apressado o capitão médico da força pública, o senhor Juscelino Kubitschek de Oliveira, que mais tarde, em 1.955 se tornará presidente do Brasil. J K volta carregando em uma maca o tenente Coronel Fulgêncio de Souza Santos que havia sido atingido por um tiro de fuzil e faleceria logo depois, sendo mais um a tombar em combate. Como a coisa estava ficando feia, resolvemos tentar sair dali o mais rápido possível, mas foi nesse momento que uma granada caiu no local de onde estávamos, vindo a explodir a um palmo dos nossos pés. Essa foi a deixa para Eu e o Dema pararmos de viajar na maionese e voltarmos à 2014......”
A Travessia Marins X Itaguaré acabou se tornando um clássico do montanhismo nacional. Quando cruzamos por aquelas paragens no inverno de 2001, praticamente não encontramos ninguém, as trilhas eram confusas e os caminhos ainda guardavam muitas dificuldades para os raros montanhistas que se aventuravam por aquelas íngremes encostas rochosas. Muito alardeado por ser na época o ponto culminante do Estado de São Paulo, o Pico dos Marins foi cada vez mais chamando a atenção de gente de todos os cantos do Brasil. O Marins perdeu o posto de pico mais alto do estado para a Pedra da Mina, também na Serra da Mantiqueira, mas nunca deixou de perder seu brilho, ainda mais quando depois que um grupo de Campinas abriu e “sinalizou” a famosa travessia em 1993. Pois bem, passado mais de 13 anos desde a minha primeira caminhada por essa serra, achei que já era hora de voltar, ainda mais quando vislumbrei a possibilidade de emenda-la com outra famosa trilha, a da Revolução de 32.Para essa nova empreitada, como não poderia deixar de ser, convidei meu amigo Dema que havia estado comigo em 2001. Era hora de provar para nós mesmos que poderíamos estar velhos, mas ainda não estávamos acabados. Para compor o resto do grupo foram convidados ainda o Eduardo loures, o Marcos Prince, o Will Lian e Luciano Lourenço. Sendo que estes quatros últimos praticamente jamais tinham pisado em uma montanha antes, em compensação pesavam a favor deles todo o vigor que só a juventude poderia lhes dar.
Combinamos de nos encontrarmos de madrugada na cidade de Lorena-SP. Eu e o Dema Vindos de Sumaré-SP e os outros da capital do estado. Uma da madrugada Eu e o Dema nos juntamos ao grupo em Lorena e como o Eduardo e o Prince já haviam conseguido uma carona para Piquete-SP, coube a um parente do Luciano que também mora em Lorena, nos dar uma carona e unir todo o grupo. Todos unidos em Piquete, tentamos persuadir um cara com uma Vam a nos levar até o bairro dos Marins, que fica a 15 km de piquete e a 21 km do acampamento base do pico dos Marins, onde nossa travessia começaria. O cara não teve dó,por dinheiro nenhum largou a maldita cachaça par nos levar, então mandamos ele a merda e resolvemos enfrentar todo o caminho a pé mesmo, quem sabe não rolaria uma carona.
Jogamos as mochilas às costas e nos pusemos a caminhar pela rodovia sentido Itajubá-mg e meia hora depois abandonamos essa rodovia e entramos à direita em direção ao Bairro dos Marins, onde a placa indicava a direção do pico de mesmo nome. Passamos pela igrejinha que fica do lado esquerdo e seguimos enfrente, um pé à frente do outro, caminhando madrugada adentro. Pouco a pouco o sono vai tomando conta da gente e em uma curva do caminho, paramos para um breve descanso. Foi aí que eu cheguei a uma conclusão : Não precisa ser a mãe Dinah para adivinhar que muito provavelmente o Will e o Luciano nãoconseguiriam ir até o final nessa travessia e que a minha bota, ainda mau amaciada, acabaria com o meu pé. Aos poucos o rio que corre ao nosso lado direito vai ficando cada vez mais próximo e em outra curva do caminho, às 05 horas da manhã, nos jogamos em um gramadinho à beira da estrada e por quase duas horas tiramos um cochilo, esparramos sobre uma lona preta.
O dia amanhece lindo e o Pico dos Marins anima a galera a continuar seguindo enfrente, mesmo sabendo que será uma tarefa árdua, porque o caminho só sobe e agora teremos a companhia do sol a nos desgastar mais ainda. Finalmente às 07h30min desembocamos no bairro dos Marins e logo à frente pegamos a esquerda, seguindo as placas indicativas. A estrada asfaltada da lugar a um calçamento e logo o calçamento se reveza com estrada de barro e logo mais à frente chegamos a uma cachoeira, enfim água fresca. Já andamos mais de 15 km desde Piquete e daqui para frente a estradinha fica cada vez mais íngreme e o Will e o Luciano vão ficando cada vez mais para trás, o que nos obriga a esperá-los por muito mais tempo. Mas não demora muito para o Luciano enfim conseguir uma carona e levar a tira colo o Will com ele. Aliás, fica aqui um protesto contra os montanhistas motorizados, que passaram por nós e não ofereceram caronas, muitos com seus carros 4 x 4 totalmente vazios.
Como não há sofrimento que dure para sempre, finalmente ao meio dia chegamos ao acampamento base do pico dos Marins, tiramos nossas mochilas das costas e desmaiamos de canseira. O Will e o Luciano já haviam se dirigido para o Pico do Careca, então o que tínhamos a fazer era cozinhar algo para comer e tentar refazer o roteiro que havíamos traçado e que já havia ido “pro saco” faz tempo. Traçamos uma meta de alcançar o topo do Marins até o anoitecer, não iria ser fácil, mas teríamos que tentar, mas antes decidimos comer e beber até não aguentar mais.
Alimentados, nos despedimos dos amigos do Campo Base, atravessamos a porteira de arame e nos enfiamos trilha adentro. Cruzamos uma língua de matoe em menos de 20minutos interceptamos a estradinha que da acesso ao Pico do Careca. Em mais meia hora atingimos um platô, onde as vistas se alargam. Aqui a estradinha foi fechada por uma porteira, em 2001 ela seguia até o topo do Careca. Então nos enfiamos por uma trilha larga e para nossa surpresa encontramos o Luciano e o Wil lagarteando ao sol. Imaginávamos que eles teriam seguido a trilha em direção ao Marins, ganhando tempo já que eles estavam umas 3 horas à nossa frente. Passamos por eles e desembocamos notopo de rocha nua a 1.638 metros de altitude. O Pico do Careca é um ótimo lugar para acampar, um pouco exposto em dia de muito vento, mas com um visual incrível, principalmente das íngremes paredes do Marins. Em 2001 acampamos aqui e pegamos uma noite de lua cheia espetacular e uma temperatura muito baixa. No local também existe uma clareira junto à mata, bem mais abrigada e com água perto. Quando todos chegaram ao topo, nos reunimos para uma foto com o Marins ao fundo e essa seria a ultima foto com a galera toda reunida.
Nosso caminho vira à direita, entra na mata, passa pela clareira citada, onde uma placa nos diz que estamos no caminho correto, atravessa um pouco de mata e minutos depois nos leva ao aberto e nos encaminha para uma trilha larga com um sulco arenoso e em meio ao capim elefante. Ela sobe sem dó, passa por lajes rochosas e uma hora depois chegamos a uma ótima área de acampamento, onde paramos para esperarmos o Luciano e o Will, que estavam subindo a passos de tartaruga tetraplégica, (rsrsrsrsrsrs). Seguindo pelas pedras expostas chegamos a borga de um Canyon, onde fizemos mais uma parada para uma foto em uma grande rocha que beirava o abismo. O caminho seguinte se enfia no meio dos grandes matacões, seguindo alguns totens e outros sucos de trilha. Na minha memória eu imaginava que teríamos que bordejar todo o topo deste morro, deixando-o a nossa direita, mas parece mesmo que a trilha foi realocada para cruzar por cima e não ao lado ou é mesmo minha memória que envelheceu e eu tenha me esquecido deste trecho 13 anos depois da nossa passagem por ali. Seguindo então por cima do grande morrote pontilhado por grandes rochas, vamos avançando aos poucos, pulando de pedra em pedra quando é necessário e logo nos deparamos com uma parede rochosa de outra montanha, desta vez intransponível. Sentamo-nos à beira da parede para apreciarmos o visual e esperarmos os mais lentos. O caminho a seguir não poderia ser outro: desce-se do morrote e pega-se para a esquerda, onde iremos ter que contornar a montanha deixando-a a nossa direita. Aproveitando o sulco nítido e nos guiando por uma seta pintada na pedra, escalamos grandes rochas e ganhamos um pouco de altura, mas não muito. Foi aqui que encontramos um grupo que havia se perdido, voltando do Marins para o acampamento Base. Vendo-os totalmente desorientados, demos sinais para que subissem até onde estávamos e então lhes indicamos o caminho correto. Contornando parte da montanha, logo nos deparamos com uma grande parede, onde uma corda serve de guia e de amparo para a subida. Passado esse trecho, pegamos para a esquerda e fomos seguindo em direção a um vale e como os meninos continuavam ainda muito lentos, vou sinalizando com meu bastão na parteda trilha arenosa para onde eles devem seguir. Logo chegamos a uma área de acampamento e vendo que o sol já começava a querer se jogar no oeste, resolvemos parar e esperar que todos se juntassem. Já passava das 17h30min e o Luciano e o Will nada de aparecer. Gritamos por eles e nada, os caras sumiram. Preocupados, fomos atrás dos caras e logo encontramos o Will e muito tempo depois apareceu o Luciano, que disse que havia tirado um cochilo na trilha. Diante da situação, resolvemos que seria hora de pararmos e montar acampamento ali mesmo, racionar o pouco que tínhamos de água, prepararmos uma janta e fazer com que os meninos descansassem bem e se recuperassem para o dia seguinte. Pra nós quatro já haviam ficado bem claro que o Luciano e o Will não tinham a menor condição de seguir enfrente naquela travessia, pelos menos no tempo em que a gente tinha proposto para empreitada. Mesmo assim jamais havia passado pelas nossas cabeças deixa-los para trás. Caberia a eles o bom senso de avaliarem suas condições físicas e tomarem a decisão de retornar, mas mesmos assim estávamos dispostos a persuadi-los a irem pelo menos até o cume do Marins, o que já seria um grande feito, haja vista que essa era a primeira vez que os caras pisavam em uma grande montanha.
Eu e o Dema ficamos em uma barraquinha de dois lugares, o Will montou também a sua barraquinha e os outros três dividiram mais uma barraca. A temperatura apesar de fria encontrava-se excelente para essa época do ano, já que estávamos a mais de 2.000 metros de altitude, mas o Will e o Prince foram para montanha sem saco de dormir e sofreramde tanto frio e se esses caras tivessem pegado a temperatura que pegamos no passado, teriam virado picolé. Foi realmente um erro de principiantes, que poderia ter lhe custado um sofrimento ainda maior e desnecessário, espero que tenham aprendido a lição.
O dia amanheceu novamente extraordinário e com ele se renova a nossa esperança de nos colocarmos novamente no nosso roteiro original. Tomamos café e partimos logo bem sedo. A trilha entra no capim e um minuto depois já estamos novamente nos pendurando em mais uma parede íngreme, sem mesmo dar tempo de aquecermos os motores. Agarrando- nos nas saliências da rocha, ganhamos altura e logo nos encostamos na grande parede que já havíamos avistado desde de quando começamos a pequena escalaminhada. O caminho vai seguindo pela esquerda e vamos nos equilibrando em uma lamina de pedra com todo cuidado, até que hora e meia depois já temos à nossa frente um selado e mais acima o Pico do Marinzinho, mas não é para aquela direção que iremos, pelo menos por enquanto. Vamos seguindo pela rocha nua, nos guiando pelos totens, deixando o Marinzinho agora à nossa esquerda e nos direcionando para o próprio cume do Marins. Passamos por duas lombadas e logo começamos a descida até a água, que marca o início da subida final até o topo do Marins. Antes de descermos essa ultima rampa de pedra até a água o Will nos comunica que não irá mais continuar conosco nessa travessia, irá somente até o topo do Marins e resolve esconder sua mochila por ali mesmo e seguir sem carga. Enquanto ele esconde a cargueira, deslizamos rampa abaixo e ao chegar a água, jogamos as mochilas no chão e fomos nos fartar de tanto beber o precioso liquido, mas não sem antes colocarmos algumas gotas de hidrosteril afim de tratá-la , já que uma placa indicava que poderia haver contaminação.
O ponto de água no pé do Marins é um grande encontro de montanhistas de tudo quanto é lugar. É ali que a galera acaba trocando informações, planejando futuras travessias e é ali também que caminhantes acaba por encontrar velhos amigos de outras travessias, resumindo, uma festa, uma grande confraternização.
Antes de seguirmos nosso caminho final até o cume, escondemos também nossas mochilas no capim junto à água, primeiro que é muito mais fácil subir leve ao cume do que carregando 15 ou 20 quilos nas costas e também porque nosso caminho para a Travessia do Marins para o Itaguaré parte exatamente alguns metros dali e não há porque gastar energia para subir e descer carregado. Seguindo os totens e o caminho óbvio, que é subindo a grande rampa, vamos caminhando rapidamente, de rampa em rampa, de pedra em pedra, parando de vez enquando para uma foto que nos indica qual será o caminho que seguiremos para o Itaguaré , depois que voltarmos do Marins. Às 10 horas da manhã passamos por uma área de acampamento e pouco depois por mais uma, desta vez ocupada por três barraquinhas, que logo depois serão avistadas novamente quando tivermos na rampa final rumo ao cume.
Alguns metros antes do topo passamos por mais uma área de camping e finalmente às 10h20min fizemos uma pose para a grande foto no cume do PICO DOS MARINS – 2.421 METROS. Chegar ao topo de uma grande montanha como o Marins é uma sensação muito boa, principalmente depois de um grande esforço como foi o nosso, vindo desdelá de Piquete até o cume, mas ver a cara de satisfação dos amigos principiantes , não tem preço. Pisar no topo é a coroação para os determinados, para aqueles que tiveram que superar seus limites, tiveram que ir além das suas forças. E isso foi o que aconteceu principalmente com o Will e com o Luciano, apesar dos pesares, os dois foram bravos, superaram todos os limites físicos e psicológicos que só uma grande caminhada e uma grande montanha podem impor. E como eu nunca me canso de dizer: As pessoas não superam montanhas, as pessoas superam limites, as pessoas superam a si mesmas, para provar para si mesmas que são capazes de qualquer coisa, subir montanhas é só mais uma.
Ficamos no topo por mais ou menos uma hora, escalamos algumas grandes rochas, conversamos com outros montanhistas e descemos a todo vapor e só paramos quando estávamos de novo de volta à água, onde paramos novamente para uma refeição fria e discutirmos que rumo tomaria nossa expedição. Logo em seguida chegou o Luciano, anunciando também a sua desistência de continuar a travessia. O Will já havia se despedido de nós e já havia tomado o caminho de volta para o Acampamento Base. Por algum motivo, talvez incompatibilidade de genes, o Will e o Luciano não quiseram descer juntos, cada um tomaria seu próprio rumo. Mesmo assim pedimos para que um grupo que desceria depois deles os auxiliassem caso precisassem, não queríamos que os dois tivessem o mesmo fim do Escoteiro Marquinhos, que ao descer o Marins em 1985, desapareceu sem nunca mais ser encontrado e hoje permanece como o maior mistério do montanhismo nacional.
Pois bem, agora nosso grupo seguiria somente com quatro integrantes, Eu, Dema, Eduardo e o Prince. Poderíamos imprimir um ritmo um pouco mais rápido porque, mesmo havendo uma diferença bem grande de idade, com total “desfavorecimento” para Eu e o Dema, que eram os idosos do grupo, ainda assim a “velha guarda ainda tava” aguentando o tranco. (Rsrsrsrssrsrsrsrs).Jogamos as mochilas às costas e partimos decididamente às 13:00. Pulamos o riacho, abastecemos as garrafas com 3 litros de água por pessoas e subimos a rampa até a metade e fomos nos guiando em direção a área de acampamento que estava da direção do Marinzinho. Aqui não tem erro, precisa olhar para a grande rampa de pedra que sobe a encosta da montanha e tocar para cima, às vezes se guiando pelos totens, outras vezes subindo por onde dá até chegar ao topo para depois descobrir que é um topo falso e que o verdadeiro ainda está muito mais à frente.
A sequência do caminho é pela esquerda do topo principal, tem que descer e ir contornando até conseguir escalaminhar sua parede e ir subindo aos poucos até o cume verdadeiro. Nós gastamos para ir do ponto de água até o cume do Marinzinho 2.432 metros de altitude, o ponto mais alto de toda nossa travessia, umas duas horas, mas imprimimos um ritmo não muito rápido porque paramos muito para apreciar o visual e tirarmos umas boas fotos. O cume é marcado por uma grande pedra, onde é muito difícil de subir, mas com ajuda dos companheiros, lhe dando apoio para os pés é possível fazer uma foto no ponto mais alto. Nós ainda pegamos uma placa que existe embaixo e levamos para cima do grande matacão e aí fizemos uma foto espetacular. O Dema e o Prince ainda se arriscaram a saltar de cima do monólito para outra pedra mais embaixo, um pulo ariscado de mais para um lugar ermo e sem nenhuma chance de socorro, mais confesso : a foto dos caras ficou de dar inveja, (rsrsrsrsr).
O nosso objetivo era acampar junto a Pedra Redonda e por isso tínhamos que nos apressar para não pegarmos trilha à noite. A saída do Marinzinho é pela esquerda, como indica uma pequena placa colocada ali pelo pessoal da pousada Maeda, aliás, do próprio Marinzinho parte uma trilha para a pousada, encurtando a travessia para quem já estiver sem condições de prosseguir e quiser ir embora para casa mais sedo. Seguindo um totem, também à esquerda, contornamos uma pedra e damos de cara com um vale gigantesco que teremos que descer e para começar, teremos que nos pendurar em uma corda, colocada estrategicamente para dar segurança na descida. A descida é lenta e penosa, porque a tendência é que a mochila te jogue abismo a baixo e então é preciso fazer muita força no braço para não se emborrachar lá embaixo. Terminada a descida, descemos atrás dos arbustos até o fundo do vale e então começa uma enorme subida, onde temos que escalaminhar e botar os joelhos na boca para podermos chegar ao cume de mais um morro. No topo é possível admirar a grande descida que acabamos de descer e também ter uma das mais belas visões de toda a travessia, que a visão magnífica da Pedra Redonda, se fundindo com o Itaguaré ao fundo. Mas infelizmente não há tempo para muita contemplação, pois já passa das 16h00min e logo o sol já vai começar a se recolher, portanto demos adeus ao cume e começamos novamente a descida em direção a Redonda.
Vamos descendo como dá, seguindo totens ou simplesmente pulando de pedra em pedra, desescalando, escalaminhando, abrindo mato no peito, escorregando, passando por dentro de pequenas tocas até finalmente alcançarmos os 2.353 metros do cume da Pedra Redonda. Cume é modo de dizer por que a pedra é realmente difícil de subir, dois monólitos um encima do outro, que por incrível que pareça, nem de longe são redondos( bom, de longe é sim, rsrsrsrs). Pois é, a Pedra Redonda é pura ilusão de ótica. Há uma medíocre área de camping junto à pedra, mas a não ser que se chegue por aqui realmente destruído, o melhor mesmo é seguir por mais algum tempinho e encontrar um lugar mais descente para esticar o esqueleto. A descida começa por entrar na mata , mas logo sai e começa a contornar mais um pequeno morrote, até voltar a entrar na mata, virar a esquerda e sair em campo aberto. Passa por mais uma área de camping, mas igualmente medíocre, passamos batido até atravessarmos por um alto capim elefante e nos vermos a beira de uma grande descida. Nós queríamosacampar de qualquer jeito , pois o sol já estava nas últimas, por isso resolvemos não descer até a crista logo abaixo. Voltamos e resolvemos abrir uma nova clareira de acampamento.
Junto à trilha larga no meio do capim elefante, encontramos um bom local para cortamos as folhas do capim. Fomoscortando as folhas com uma faquinha de cozinha e jogando no chão para forrá-lo e protegê-lo da umidade. Fizemos um serviço tão bom, que essa agora é sem dúvida a melhor área de camping de toda a travessia, cabendo umas três barraquinhas de dois lugares. A noite caiu e a temperatura estava novamente muito boa. Fizemos o jantar e como desta vez estávamos menos cansados que na noite anterior, pegamos nosso fogareiro, nossas lanternas, um pouco de água , chás e cappuccino e fomos uivar para lua e celebrar a vida no topo do morrote que havíamos descido depois da Pedra Redonda. Ficamos por lá até depois das oito da noite, observando as estrelas, jogando conversa fora e planejando futuras caminhadas e novas explorações. Depois descemos e cada um se recolheu para a sua barraca e foi ter sonhos mais impossíveis de realizar.
Bem cedo, acordamos. Desmontamos rapidamente as barracas e logo partimos sem mesmo tomar café, pois não havia água para tal luxo. Tínhamos agora meio litro de água por pessoa para realizarmos a travessia entre a Pedra Redonda e o pico do Itaguaré. Atravessamos novamente por dentro do capim elefante e logo chegamos à borda do platô, onde havíamos acampados. Na grande crista uns 150 metros de desnível abaixo de nós, identificamos ao longe um grupo grande e suas barraquinhas coloridas. Fomos descendo com cuidado, ora pulando e descendo pedras, ora seguindo por dentro de caminhos nítidos por dentro do capim. Chegamos à crista e começamos a imprimir um ritmo muito rápido, sem quaisquer paradas, avançávamos destruindo tudo que aparecia à nossa frente,seja bambuzinho, capim elefante ou outro obstáculo qualquer. Não demora muito, tropeçamos em uma barraquinha, onde um senhor de uns 60 anos ou mais, acampava solitário. Perguntamos ao velho se teríamos água antes do Itaguaré e ele com todo simpatia nos disse que não. Despedimo-nos e fomos conversar com o resto da galera que estava alguns metros à frente, em outra grande área de acampamento. Além da turma que havíamos encontrado no Marins, estavam também outros montanhistas de idade avançada. Era uma expedição guiada que estava fazendo a travessia ao contrário, do Itaguaré para o Marins. Até aí nada de mais, a diferença é que o homem velho que havíamos encontrado primeiro era nada mais nada menos que o S.r. Afonso, juntamente o guia que havia sido dispensado pelo grupo de escoteiros no fatídico sumiço do Marquinhos em 1.985, pena que fiquei sabendo disso somente quando me deparei com toda a história, dias depois, já em casa.
Seguimos enfrente, sempre seguindo alguns totens e tentando nos manter sempre na crista e logo chegamos à beira de mais um gigantesco vale verdejante, onde se tem uma vista espetacular do Itaguaré. Paramos ali para mais algumas fotos, para bebermos o último gole de água do cantil e nos lamentarmos de não termos conseguido encontrar nenhuma água desde o Marins. Nossa pernada continua para a direita, onde logo encontramos uma larga trilha que se enfia na mata e desce ao fundo do vale, para depois voltarmos a subir novamente e retomarmos a altitude perdida. Mas não sem antes termos que suarmos muito para escalarmos muitas lajotas ásperas, nos enfiarmos por debaixo de matacões que insistiam em travar nossas mochilas, nos obrigando a retirá-lase a arrastá-las feito um saco de batatas.
Cansados já estávamos a muito tempo, mas agora a sede vai tomando conta das nossas entranhas e cada passo dado vai se tornando em um tormento, que só acaba, ou é esquecido, quando as grandes formações rochosas vão aparecendo e inundando a nossa alma. Eu e o Dema procuramos uma grande rocha em especial, uma rocha que havíamos escalado em 2001, no auge da nossa forma física, em tempos onde a juventude e a irresponsabilidade reinavam sobre nós. Queríamos provar para nós mesmo que apesar da idade, ainda éramos capazes de nos agarrarmos feito lagartixas naquela pedra e chegar ao topo, 13 anos depois.
Atravessamos mais um selado, sempre com as mesmas dificuldades dos anteriores. Vamos subindo e escalando outras grandes pedras e nos maravilhando com a grande visão oeste do Pico do Itaguaré, que guardada as suas devidas proporções, se parece muito com o Agulhas Negras. Do nosso lado direito, um deslumbrante Canyon se descortina, onde a centenas de metros a baixo, uma mata ainda dos tempos de Cabral, reina absoluta e quando a GRANDE PEDRA que procurávamos aparece, não demora para Eu e o Dema nos atirarmos à borda do vale e nos posicionarmos ao pé do nosso desafio. São duas grandes rochas, uma equilibrada sobre a outra, bem à beira do precipício. O Dema vai primeiro, apoia-se em minhas mãos e faz a alavanca até conseguir se agarrar em uma saliência mais acima. Toma impulso e se projeta encima da primeira pedra. Deita-se e me estende as mãos. Tomo impulso também e me agarro firmemente e o resto é puro esforço e superação física até eu conseguir chegar ao topo do primeiro desafio. Aproveitando que o Dema já se encontra deitado sobre a pedra, aproveito o embalo para pisar em suas costas e me catapultar para o cume da formação rochosa e logo em seguida dar a mão e facilitar que o Dema também atinja o topo. Agora somos dois velhos amigos se regozijando de tanta felicidade. Dando uma banana para a idade, gargalhando do tempo. Somos dois homens de meia idade que se recusa a abandonar o montanhismo, mesmo que muitos digam que é hora de parar. A gente não desiste fácil e mesmo que o corpo possa dar sinal de cansado, o espírito ainda faz planos de outras grandes aventuras e enquanto tivermos forças para carregarmos nossas mochilas, estamos nas trilhas, no mato, nas montanhas, nas cavernas, nos cânions, nas praias desertas ou em qualquer outro lugar onde formos desafiados pela mãe natureza.
O Eduardo e o Prince também vão ao topo da “nossa” pedra e logo todos nós estamos partindo para o estirão final até o Itaguaré, afinal de contas a sede já estava nos matando. Passamos por dois irmãos que moram na mesma região que eu e o Dema e continuamos em passos apressados, escalando, pulando, passando por baixo, passando por cima de outras tantas pedras que eu nem poderia descrevê-las com exatidão, mas o caminho é bem óbvio, há de se ir seguindo os totens e sulcos de trilhas e às vezes algumas marcações pintadas nas rochas, até que sem perceber estamos encostados à grande parede do Pico do Itaguaré, mas sem água, nos recusamos a ir ao cume, pelo menos por enquanto.
Se o nosso corpo ainda estava aguentando o tranco depois de tantos anos, o nosso cérebro não estava colaborando muito, pois não nos lembrávamos de onde seria a tal água do Itaguaré. Da parede de acesso ao Itaguaré, saem várias trilhas para todos os lados, o que acaba confundindo o trajeto a seguir. Os dois irmãos chegam e também não fazem ideia do caminho a seguir e olha que eles estiveram ali há poucos anos. Usando a nossa experiência e intuição, vamos descendo em direção ao vale verdejante logo a baixo, nos guiando em direção ao selado entre duas pequenas montanhas a nossa frente. Uma trilha tosca acaba se perdendo no vale logo abaixo e então a abandonamos em favor de alguns totens à nossa esquerda, o que acabou nos levando a uma clareira de acampamento, de onde parte a verdadeira trilha. Aí foi só ir descendo por ela até nos depararmos com um pequeno córrego, enfim Água!
Eram exatos meio dia e além de matarmos a sede com a água muito melhor que a do Marins, assassinamos a fome comendo tudo que estava ao nosso alcance, enquanto batíamos um bom papo com os dois irmão, que de tão cansados, não foram ao topo do Itaguaré e isso não é exceção, boa parte dos montanhistas que passam por ali, estão tão extenuados que não tem forças nem para ir até o cume, uma pena porque é uma linda subida.
Nós não quisemos nem saber, escondemos nossas mochilas no mato e seguimos “voados” para cima. Passamos novamente pela clareira de camping, contornamos uma grande rocha, que ficou à nossa esquerda e logo estávamos novamente na grande parede rochosa que dá acesso ao cume. Pegando um caminho alternativo, (poderíamos ter seguido alguns totens), escalamos nos valendo das fissuras ásperas da parede rochosa e logo ganhamos grande altura. Logo seguimos um pouco mais para a esquerda, onde a visão das nuvens bem abaixo de nós, nos fez pararmos para algumas fotos e logo estávamos em um platô, de onde os mais tímidos não passam e costumam ficar por ali mesmo, admirando a paisagem. Deste falso cume é possível atingir umas formações rochosas espetaculares e de lá, se assombrar com o vazio que se descortina a sua frente. Mas a gente não se contenta com pouco, queremos o ponto mais alto. E para ir ao cume verdadeiro é preciso enfrentar uma fenda potencialmente perigosa, se esgueirar ao lado de um abismo, escalar uma grande rocha e fincar de vez o pé no PICO DO ITAGUARÉ – 2.308 metros.
Que lindo lugar! Que sensação maravilhosa essa de estar acima das nuvens, de olhar a mediocridade da civilização lá de cima. Tudo é belo e esplendoroso, estamos realmente extasiados diante do poder desta visão arrebatadora. Não importa quantas vezes se vai ao topo de uma grande montanha, a gente nunca se cansa de admirar. Estamos todos no topo e o clima de euforia contagia cada um de nós. Valeu cada gota de suor derramado, cada aranhão, cada tombo, cada queda, cada escorregão, cada joelhada na rocha, cada calo no pé, cada esfolada e furada de espinho nos dedos. O sofrimento é passageiro, mas as lembranças destes momentos no topo, não há tempo que apague.
Satisfeitos, partimos! Abandonamos o cume e voltamos para o lugar onde havíamos escondido nossas mochilas, no caso a água do Itaguaré. Jogamos as mochilas às costas, pulamos o riozinho e pegamos a trilha que em pouco tempo chega a uma bifurcação, onde pegamos para a direita e saímos logo na grande área de acampamento. Estamos no selado, bem no meio das duas montanhas, que víamos quando já estávamos na parede do Itaguaré. Aqui foi onde titubeamos para encontrar a trilha de saída, mas chegando a primeira área de camping é preciso pegar para a esquerda e subir a montanha se guiando por alguns totens até que diante de uma grande rocha, a trilha quebra para a esquerda e desce de vez ao vale, se enfiando em algumas verdadeiras voçorocas, até se enfiar de vez na mata e virar quase uma estradinha de tão larga. O caminho a seguir é um pé à frente do outro, sentindo todas as dores nos joelhos possíveis, já que o caminho só desce e seguirá assim por quase duas horas, até que às 15h30min chegamos ao primeiro riacho e então o caminho arrefece e logo cruzamos novamente o mesmo rio e ao cruzarmos ele pela terceira vez, desembocamos no gramadinho à beira da estrada, é o Barreiro, a Travessia Marins x Itaguaré chega ao fim.
No gramadinho final é o lugar onde todos que fazem essa travessia são resgatados e levados de volta para o acampamento base do Marins. Por estrada de terra são quase 20 km de distancia. Em 2001 nós enfrentamos esse pedaço caminhando, mas é um esforço descomunal, feito em quase cinco horas de caminhada. Passa da 16h00min e o sensato é ficar por ali, tentar uma carona ou mesmo acampar e seguir só no dia seguinte, já descansado. Nosso corpo diz que é hora de parar, encerrar a caminhada, comer uma comida quente, dormir em uma cama macia, mas nosso espírito de aventura insiste em dizer que devemos seguir enfrente, aproveitar o feriado de quatro dias por inteiro, terminar de fazer aquilo que a gente havia proposto quando abandonamos nosso lar há três dias.
Para a esquerda é o caminho para a cama e comida quentinha, para a direita é o caminho para o desconhecido, para as dores nas pernas, para sofrimento sem limite. Pegamos para a direita. E naquela estradinha vazia, deserta e sem nenhum movimento, fomos seguindo, arrastando nossos corpos destruídos, feitos zumbis que vagão sem rumo. Caminhamos até um amontoado de casas e seguindo a informação de um morador, pegamos para a direita em direção ao povoado de Caxambu. A estradinha sobe um pouco, passa por entre algumas casas, enfrente a um sítio e sobe loucamente e quando chega ao topo, a noite já se foi. A nossa intenção é assim que possível, arrumar um lugar para acampar porque ninguém mais tá aguentando de cansado e de tanta fome. Andamos, andamos e nunca chegávamos a lugar nenhum. A fome era tanta que eu já estava torcendo pelo aparecimento de um despacho para poder me apoderar do frango. Quando chegamos a um cruzamento, pegamos para a esquerda e entramos em uma área de mata, onde paramos junto a uma bica de água. Dei uma revistada no local para ver se havia a possibilidade de acampar, mas não havia. Andamos agora sob a luz da lua e a cada curva da enfadonha estradinha, sonhávamos com a possibilidade de encontrar um lugar para esticar o esqueleto, até que uma placa de POUSADA RESTAURANTE TAIPA BRANCA nos chamou a atenção.
Paramos em frente da pousada e ficamos discutindo se não deveríamos tentar arrumar um cantinho para acampar por lá, haja vista que lá havia um ótimo gramado. Mas como era uma pousada vimos logo que seria difícil arrumar algo. Mesmo assim eu e o Prince nos encarregamos de ir verificar. Chegando lá fomos atendidos por um simpático casal de velhinhos, que nos convidaram para conhecer o restaurante. Acampar não seria possível, já que não estávamos dispostos a pagar nada por isso. Mas a visão da comida mineira nos chamando não dava para recusar. Corremos lá fora e avisamos o Dema e o Eduardo. Iguais a refugiados de guerra, vindos da Somália, nos servimos da farta mesa, onde cada num pegou o que pode e o que coube no prato. Sem saber que o estilo era o do coma à vontade e o quanto puder, o Eduardo fez um prato tão grande, que teve de ser carregado até a mesa com a ajuda de todo o grupo, rsrsrsrsr. Quando abandonamos aquele pequeno restaurante, deixamos para trás um casal de velhinhos totalmente falidos, lamentando o dia em tiveram como clientes quatro aventureiros esfomeados.
Apesar de ainda muito cansados, estávamos com as energias renovadas e seguindo um conselho dos donos da pousada, pensávamos em acampar no barracão da igreja, que estava a uns 3 km à frente, mas a noticia de que estava rolando a festa de São José, acabou com nossa esperança. Fomos caminhando sempre de olho em algum gramadinho à beira da estrada, mas logo tivemos que parar porque o Dema teve um ataque de dor de barriga. No desespero o cara saltou por cima de uma cerca de arame farpado e foi fazer a sua obra em um matinho. Foi aí que percebemos que o local era um excelente gramado para passarmos a noite, foi literalmente na cagada que encontramos nosso lar por mais uma noite. Forramos um plástico no chão e improvisamos um bivak, já que o tempo estava maravilhoso. Dormimos muito bem e lá pelas cinco da manhã acordamos e enquanto o sol não nascia, ficamos observando as estrelas cadentes e os satélites rodando sobre nossas cabeças. Depois tomamos café e partimos para o nosso último dia de caminhada.
Quarenta minutos de caminhada nos levou ao povoado de Caxambu e em mais uns 15 minutos tropeçamos na linha férrea, onde um marco da famosa Estrada real marca o inicio da nossa caminhada pelo Caminho da Revolução de 32. Nosso caminho agora segue pela linha de trem para a direita em direção a divisa de estados, entre Minas Gerais e São Paulo. Como ainda é muito sedo, o caminhar é tranquilo e prazeroso e logo chegamos a primeira ponte do nosso trajeto, onde um riacho de águas cristalinas nos convida para um mergulho, mas ninguém se arisca ,pois ainda não passa das oito da manhã e a água está gelada. Seguimos nosso caminho e logo passamos por uma fábrica de queijos, onde aproveitamos e compramos um, para um lanche logo à frente. Passamos mais uma vez pela Estrada Real, que não passa de uma trilha mais larga e antes das nove horas da manhã, largamos nossas mochilas na Estação Coronel Fulgêncio. No tempo da revolução, essa estação tinha o nome de Estação do Túnel, depois da guerra, mudou de nome para homenagear o coronel abatido em combate. A estação marca o fim da ferrovia no lado mineiro e alguns metros à frente, cruzando por baixo de uma montanha, reina soberano o famoso TÚNEL DA MANTIQUEIRA.
Sentados ali naquela estaçãozinha, ficamos imaginando como seria se pudéssemos voltar no tempo e puder acompanhar os desdobramentos da batalha da Mantiqueira. Muito provavelmente aquele lugar era muito diferente do que é agora, um terreno hostil e perigoso. Muita gente perdeu a vida nesta batalha e apesar de São Paulo ter resistido bravamente por meses contra as tropas de Getúlio Vargas, a perca de outros territórios no estado, fez com que a tropa paulista fosse obrigada a se retirar do fronte. No fim acabaram capitulando e o sonho de muitos de tornar São Paulo um Estado independente acabou indo por água abaixo.
Depenamos um pé de mexerica e de laranjas lima, enchemos nossos cantis na fonte de água, acendemos uma lanterna e adentramos no grande Túnel da Mantiqueira. São 996 metros de comprimento, que foram cruzados rapidamente e logo, mesmo sem perceber, havíamos cruzado a fronteira de estado emergulhado no lado paulista da Mantiqueira. Tiramos uma foto em um obelisco que marca a chegada em um novo estado, onde também me parece um bom lugar para acampar e seguimos acompanhando a linha férrea, que a partir de agora está abandonada e desativada. A floresta tomou conta de tudo e às vezes é preciso ir procurando os trilhos por debaixo do mato. Às 10h30min passamos pelo primeiro túnel do lado paulista e logo à frente passamos por uma pequena ponte e depois mais um túnel foi cruzado. Mesmo tendo sido construído lá pelos idos de 1884, os túneis ainda se encontram bem conservados. Passamos por uma cachoeira, onde fizemos uma pequena pausa para um lanche e um gole de água. A partir da cachoeira o mato toma conta de tudo. É um capim gordura que vai grudando nas pernas, o que torna o avanço quase que impossível. Logo começamos a ver que dificilmente conseguiríamos chegar a Cruzeiro no mesmo dia. Em uma curva mais à frente, surge uma grande ponte, onde cruzamos com muito cuidado e mais 20 minutos de caminhada tivemos que cruzar ao lado da linha férrea porque a erosão levou o apoio do trilho, transformando-o em uma ponte sem apoio, onde o Dema e o Prince se ariscaram, mas eu e o Eduardo achamos que seria um risco desnecessário.
Mais um túnel é cruzado e logo em seguida, a linha férrea vai fazer uma curva gigantescacruzando por dentro de muito mato, onde tínhamos que abri-lo no peito. Cansados e com os pés destruídos, não víamos a hora de abandonarmos aquele caminho, que a muito tempo deixou de ser uma trilha. Depois de cruzarmos por um grande brejo e passarmos batidos pela Estação do Perequê, na verdade nem a vimos porque estava envolta em muito mato, chegamos a uma estradinha, junto a Capela do Perequê, pintada de amarela e abandonada. Não tivemos duvida, pegamos a estradinha para sudoeste e fomos descendo até encontrarmos um pequeno córrego, que corria junto a uma mata, onde paramos para tomar um banho, o primeiro depois de quase 4 dias e prepararmos nosso almoço. Depois passamos por uma porteira, junto a um mata-burro e por mais uma hora cruzamos outro rio, desta vez muito maior e desembocamos na rodovia principal, aondesem conseguir nenhuma carona, seguimos nos arrastando pelo asfalto, até que uns 5 km antes de Cruzeiro a tão almejada carona em uma Kombi veio bem a calhar e às 18h00min já estávamos na rodoviária contemplando ao longe toda a serra da Mantiqueira, de onde demos um último adeus antes de seguirmos para casa.
E foi assim que 13 anos depois da nossa primeira incursão por este fantástico pedaço da serra da Mantiqueira, nós concluímos mais uma vez esta linda travessia. Estamos mais velhose isso é um fato que não podemos negar. Talvez não tenhamos o mesmo vigor de outrora, mas é certo que aprendemos a superar isso, aprendemos a usar os atalhos do caminho. A experiência nos deu a maturidade que nos faltou quando éramos mais jovens e se a energia não é mais a mesma, nós superamos com garra, com determinação. Ainda somos os mesmos obstinados de sempre que tenta seguir enfrente e mesmo quando todos dizem que a gente não vai conseguir, a gente vai lá e tenta, só para provar para nós mesmo que somos capazes. Quanto ao Eduardo e ao Prince, acho que Eu e o Dema só temos a agradecer a companhia destes duas caras espetaculares e volto a repetir : Uma boa caminhada tem o poder de transformar grandes companheiros em grande irmãos. Valeu meus irmãos, pelo prazer das vossas companhias.
Divanei Goes de Paula – maio de 2014
completissimo relato…. sabe de alguem ou grupo q esteja afim de fazer essa travessia no fds do dia 16 e 17 de julho? sbracos
Zaney me procura no face, lá posso te jogar nos grupos que sempre estão combinando essas travessias. Divanei Goes de Paula
putz nao tenho….. rola grupo de wpp?