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Divanei Goes de Paula 12/04/2016 11:39
    FUNICULAR: A Machu Pichu Ferroviária Brasileira

    FUNICULAR: A Machu Pichu Ferroviária Brasileira

    Uma travessia histórica pela FERROVIA FUNICULAR de Paranapiacaba-SP.

    Trekking

    caminho azul, subindo a funicular. FUNICULAR: A MACHU PICCHU FEROVIÁRIA DO BRASIL

    D. Pedro ll governava soberano e o Brasil ainda se engalfinhava em uma guerra estúpida contra o Paraguai, quando a Ferrovia Funicular foi inaugurada em 1867. O sistema vencia um desnível de quase 800 metros entre o litoral e o planalto paulista e servia primordialmente para dar vazão ao café, produzido principalmente no interior do estado. Era um sistema movido por cabos e máquinas à vapor e no total foram construídos 16 túneis e 13 pontos, em uma obra sem precedentes na história do Brasil.

    Pois bem, o Eduardo já havia passado algumas vezes pela Funicular e há muito tempo vinha insistindo para que a gente fosse com ele, mas nunca tínhamos tido oportunidade para isso. Agora havia chegado a hora. Decidimos então que o nosso caminho de volta seria pela histórica Ferrovia Funicular. Fomos descendo pelo raso Rio Mogi e logo que chegamos ao início dos containers à nossa direita, já começamos a procurar uma trilha que sai à esquerda e abandona o rio de vez. E realmente a encontramos uns 100 ou 200 metros à baixo. Tomamos a trilha e logo chegamos a uma casa, onde sai uma pequena estradinha junto a um rio. Cruzamos a ponte e em poucos minutos tropeçamos na linha de trem.

    Não é a Funicular e sim a do sistema CREMALHEIRA. Cremalheira é uma peça mecânica que consiste numa barra ou trilho dentado que em conjunto com uma engrenagem a ele ajustada, converte movimento retilíneo em rotacional e vice-versa. Esse é o sistema usado hoje para subir e descer a Serra do Mar, já que a Funicular foi totalmente desativada na década de 80. Mais alguns metros à frente já estávamos estacionados na Estação Raízes da Serra, hoje abandonada e logo mais à frente à estação de manutenção que é usada pela MRS, que é a empresa que opera agora todo sistema. Tiramos umas fotos e seguimos em frente, agora caminhando por uma estrada de terra paralela aos trilhos. Passamos pela portaria sem que ninguém nos incomodasse e mais à frente, junto a uma grande Jaqueira e bem em frente a uma casa que está do outro lado da linha, onde uma mangueira enche um reservatório de água, deixamos de vez a estrada e entramos em uma singela trilha.



    Passava das 18h00min quando entramos na trilha. Estávamos realmente quebrados e cada passo dado era como se nos dirigíssemos para forca. O caminho segue pela mata e alguns riachinhos são cruzados até que a trilha intercepta um rio e começa a segui-lo por dentro, onde parte de uma das pontes da ferrovia vieram parar, depois que ela desabou. O Eduardo seguiu à frente, nos guiando e o Lindolfo seguiu atrás e quando o Eduardo disse que havia perdido o caminho e teríamos que nos guiar pelo pedestal da ponte em ruínas, tendo assim que subir pelo barranco mesmo, o cara “fez beicinho” e se recusou a arredar o pé dali. O Lindolfo estava acabado, parecia não ter mais força para dar mais um passo. Ele havia sucumbido ao esforço físico e mental que o vale da morte havia nos enfiado na cara. Não, ele não iria mais a lugar algum, iria acampar ali mesmo. Bom, eu não estava melhor que ele e a possibilidade de ter que trepar em outro barranco também não me agradava, mas como o Eduardo havia nos dito que acamparíamos em um lugar abrigado, e por achar que o limite do ser humano só acaba quando ele perde a consciência, persuadi o meu primo a continuar caminhando. Miramos para a direita, na direção do pé da ponte destruída e abandonando o rio de vez, fomos seguindo naquela direção e logo subimos o barranco e tocamos o nosso alvo. Ao lado da ponte sobe uma escada de concreto que intercepta a trilha principal.

    Na trilha viramos para a esquerda e caminhamos até onde ela acaba junto a uma cachoeira, onde uma água escorre por uma pedra lisa. Já era noite e fomos obrigados a acender nossas lanternas. Pegamos água, atravessamos o riacho e seguimos pela trilha novamente e tivemos que parar logo à frente porque o Eduardo resolveu cair em mais um buraco. Resgatamos o Eduardo e em mais um minuto de caminhada saímos da trilha à esquerda, junto a uma grande árvore. Chegamos a um grande hotel luxuoso, abrigado do vento, seco, limpo, com dois quartos confortáveis e com lareira. Na verdade, era mesmo um casebre abandonado junto à linha férrea, perdido no meio da floresta e foi ali naquele local ermo que a gente terminou mais um dia de caminhada, um dia para não ser esquecido.



    O Lindolfo montou sua rede em dois buracos na parede e não quis saber de mais nada e eu quase ia seguindo pelo mesmo caminho, quando o Eduardo voltou de uma moita e disse que era uma pena que os mamões que ele havia encontrado estavam verdes. Opa! Mamão verde? Isso é uma iguaria meu amigo, respondi. O Eduardo então resolveu usar o óleo diesel que ele havia carregado por dois dias para fazer uma fogueira com a madeira seca que havia sido deixado ali estrategicamente. Descasquei o mamão, piquei e juntando- o com alho e cebola pus tudo para cozinhar e depois acrescentei pimenta e um molho para estrogonofe com champion. Até o Lindolfo que já estava desfalecido, ressuscitou para o jantar de gala. Eu e o Eduardo aproveitamos a fogueira para secar parte das nossas coisas e quando o fogo se extinguiu, peguei meu saco de dormir e o isolante do Eduardo e fui “morrer” em um dos cômodos do nosso castelo.

    Beba! (Beba!) Pois a água viva ainda tá na fonte (Tente outra vez!) Você tem dois pés para cruzar a ponte .Nada acabou !Não! Não! Não!...........................................(.Rau Seixas)



    Um clássico dos anos 80, vindo do celular do Lindolfo, nos despertava para mais um dia de caminhada e a música parece mesmo que havia sido feita para aquela ocasião. Arrumamos as mochilas e partimos, subindo pela mesma trilha que havíamos chegado na noite anterior. Por incrível que pareça a trilha estava um pouco fechada, o que indica que a Funicular não estava sendo tão usada como pensávamos, talvez a fiscalização em Paranapiacaba tenha aumentado ou talvez as pessoas estejam indo mesmo somente até uma parte da ferrovia, a parte onde as pontes estão em melhor condição para serem atravessada. Sempre pensei que a caminhada da Funicular era feita sobre os trilhos, mas vejo que me enganei.

    Os dormentes praticamente não existem mais e os trilhos passam ao lado de uma trilha, o que torna o caminho muito legal para caminhar. Mas essa não é uma caminhada turística, é uma caminhada ariscada, onde pontes de quase uma centena de altura terão que ser cruzadas, e são pontes totalmente destruídas e carcomidas pelo tempo, onde um descuido pode levar a um tombo fatal no abismo. Passamos por alguns túneis, que não sei se é verdade, dizem que foi escavado a mão. São obras realmente inacreditáveis, já que foram feitas há quase 150 anos atrás, o que nos faz acreditar que muita mão de obra escrava foi usada por aqui.

    E eis que de repente surge em nosso caminho a primeira ponte a ser cruzada. MAIS QUE DESGRAÇA É ISSO? Era uma ponte que mal se segurava em pé, com os dormentes que já havia se dissolvido pelo tempo. São dois pares de trilho e no início fomos caminhando com um pé em cada trilho, afastados uns 30 centímetros um do outro. Eu fui em pé, prendendo a respiração e andando o mais ereto possível para que a minha mochila não desequilibrasse e me jogasse no vazio. O Lindolfo não se fez de rogado, ajoelhou nos trilhos e foi implorando a deus que o sofrimento acabasse logo (rsrsrsrs). Até a metade da ponte, onde era possível manter os dois pés paralelos aos trilhos, eu fui bem, mas depois, quando os trilhos de transformam em apenas um eu fui obrigado a passar para o lado de fora da linha férrea ,ou seja, andar à beira do abismo. Pra piorar começou a chover bem no meio da travessia, o que deixava os trilhos escorregadios. Concentração, respiração presa, olhos fixos nos trilhos, mochila equilibrada, MAS QUE DIABOS MESMO EU ESTOU FAZENDO AQUI?



    Cruzamos a ponte, cada um como pode e como se sentiu seguro, uns em pé, outros de quatro, outros de joelhos. Chegar vivo do outro lado é o troféu. Seguimos de novo pela trilha e mais um túnel aparece pela frente, talvez o maior de todos, onde tivemos que usar uma lanterna. Os túneis estão bem preservados e é possível acampar dentro de quase todos. As pontes vão se seguindo e cruzamos por cima de algumas, mas praticamente em todas é possível desviar por trilhas e foi isso que fizemos em pelo menos metade delas, porque acabava sendo mais rápido do que ficar se arrastando nas pontes em ruínas. A cada patamar que íamos cruzando, as ruínas das máquinas, caldeiras, e todo tipo de instalações nos fazia acreditar que estávamos diante de uma das mais espetaculares obras que esse país já teve. Uma verdadeira Machu Picchu ferroviária perdida e abandonada. Ás 14h30min paramos junto a uma bica para prepararmos nosso almoço.

    A chuva ia e voltava e às 15h30min chegamos à ponte da Grota Funda, a maior e mais impressionante de todas, onde estão as grandes caldeiras e todo tipo de maquinário impressionante. Da grota funda para frente às pontes estão em melhores condições, onde acaba sendo um pouco menos perigoso cruza-las. Cruzadas as outras pontes e outros túneis, finalmente às 17h00min, cruzamos pela placa que indica o início da Funicular. Passamos bem quietos pela placa e logo à frente junto a umas instalações da MRS, onde tem um grande reservatório de água, entramos para a direita depois de cruzar um pequeno riacho, que fomos acompanhando e ganhando um pouco de altura até chegar a uma pequena barragem, onde aproveitamos para nos lavar e colocarmos roupas limpas. Retrocedemos um pouco depois do banho e subimos por uma trilhinha à direita, que nos levou ao quintal de uma casa sem muros e logo nos desovou em uma rua de terra, onde bastou seguir para esquerda e assim adentramos na vila inglesa de Paranapiacaba, onde cruzamos a ponte sobre os trilhos, mas não sem antes tirarmos aquela foto clássica com a réplica do Big Bem. E foi assim que naquela noite fria de segunda-feira, com uma vila totalmente vazia, que abandonamos as bordas do planalto e voltamos para Rio Grande da Serra e depois cada um seguiu seu caminho e foi curar suas feridas em casa.

    6 Comentários
    Zaney Mattos 12/07/2016 00:17

    blz? qdo sera o proximo trekking?

    Divanei Goes de Paula 12/07/2016 09:00

    Opa ! Sempre nas trilhas e travessias Zaney, rsrsrsrsrsrsr

    Zaney Mattos 14/07/2016 00:01

    me da um toque po…. quero acompanhar vcs

    Divanei Goes de Paula 14/10/2016 15:20

    Fala Zaney, será sempre um prazer !

    Lucas Santana 16/10/2020 22:37

    A funicular é talvez a única trilha que eu não faria uma segunda vez. Fui para conhecer e marcar da minha lista mental do que fazer na vida antes de morrer kkkk. Mas realmente o perigo é real, e ela há muito tempo virou lugar de gente sem noção que nem sabe onde enfiou o pé. Aquelas pontes ali um dia vão cair de vez e olha, provavelmente com alguém em cima. Agora, quando vi que vocês subiram ela voltando do vale da morte... Soltei um pqp dos grandes kkkk

    Divanei Goes de Paula 16/10/2020 22:45

    Só fiz uma vez, CLARO que me assustei por ser a primeira vez numas pontes podres, mas na segunda ponte eu JÁ estava a vontade. Fui pela história, pela AVENTURA da primeira vez, ainda mais tendo cruzado o Vale da Morte quanto não existia caminho NENHUM.

    Divanei Goes de Paula

    Divanei Goes de Paula

    Sumaré - SP

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    Quase 30 anos me dedicando às grandes trilhas e travessias pelo Brasil e por alguns países da América do Sul .

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