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Siririca
O K2 paranaense se revelou uma trilha mais chata do que difícil de se fazer
Acampamento Montanhismo Trekking1705 metros é a altitude que está o Siririca. De longe, já havia avistado essa montanha do cume de várias outras de suas vizinhas. Imponente! Apesar de ser a quarta mais alta do Paraná, a fama de K2 paranaense vem da maior dificuldade em acessar seu cume, que mesmo pelos somente 8-9 km da chamada via expressa apresenta oscilação de terreno, caminhos irregulares e vegetação densa.
Pico Siririca vista do Cerro Verde. Ainda parecia um desafio distante que um dia chegou.
O Siririca tem sua fama de difícil, mas o diabo não foi tão feio quanto se pinta. Apesar dos desafios, a trilha não tem uma navegação difícil, os trechos de subida não são tão acentuados (com a excessão de um deles na volta que, sim, você vai reconhecer facilmente quando encontrá-lo!), o trecho exposto com a corda é relativamente simples de ultrapassar e a abundância de pontos de águas nunca permitem que se ande muito com muito peso na cargueira.
Por outro lado os constantes sobe e desce no caminho inteiro fazem "ida" e "volta" ser um nome com mais sentido do que "subida" e "descida", a vegetação densa nos obriga a pular raizes e abaixar de troncos com uma frequência bem alta, e as caratuvas que praticamente fecham a trilha perto da região do cume colocam alguns desafios que, se não dificultam tanto assim, a deixam bem chatinha de superar, e por vezes um desafio à nossa paciência.
Já quase no fim da trilha, depois de ter passado por toda parte de floresta fechada. Uma alegria trilhar em pedras e espaço aberto.
Era o apagar das luzes de uma temporada intensa de montanhas em 2023 quando fomos subir o Siririca. Começamos na fazenda do Bolinha um pouco depois das seis da manhã, e fizemos por volta de 1 hora de trilha pulando alguns cursos de água, pedras e subindo por caminhos escorregadios até chegar nas famosas placas que servem de bifurcação para a trilha que leva até Camapuã/Tucum ou ao Siririca.
As clássicas fotos nas placas. Faço questão delas todas as vezes que vou ao Ibitiraquire. Reparar na quantidade de lama. Aumentaria bastante com o passar da trilha
A partir dali começaria o caminho inédito para mim. E foi o início do teste de paciência fazer as descidas e subidas constantes tomando cuidado para não cair em meio a tanta lama e trechos bem escorregadios pelo caminho. Aquela constante lembrança que ainda estávamos a poucos metros do mar e alta umidade associado às chuvas fora de época que aconteceram nem 15 dias antes. Assim foi a primeira parte da trilha até uma subida que chegava a um ponto com terreno mais regular lá pelo km 4,5 para em seguida desandar em uma senhora descida bem íngreme, que apesar de não ter incomodado tanto na ida, foi responsável pela maior intensidade física de toda a trilha ao ser encarada durante a volta, levando praticamente 1 hora para subir seus quase 300 metros. Uma vez terminado de descer esse trecho, éramos presenteados com um mirante onde o Siririca dava as caras pela primeira vez em toda trilha.
Mirante com vista para o Siririca. Primeira vez que a montanha iria aparecer no caminho
Objetivo literalmente na nossa frente. Ainda faltavam 4 km para chegar lá. E como já percebemos, essa é uma trilha que os quilômetros insistem em não renderem. E as coisas não ficariam mais fáceis dali para frente. Primeiramente sofremos um ataque de abelhas furiosas que estavam no caminho. Esqueça cobras, aranhas e outros animais. Se tem um bicho que pode rapidamente decretar game over em uma trilha é a
abelha. Eu saí ileso, nem todos tiveram a mesma sorte. Felizmente ninguém com problemas de alergia foi picado, conseguimos meter marcha para uma subida constante até a base da montanha.
As subidas constantes não são um problema para mim. No caso da trilha do Siririca tudo era bem demarcados por totens e fitas nas árvores e o ganho de altitude acontecia de forma leve. O que levou a trilha a se alongar mesmo era a forma que o terreno se apresentava irregular e o exercício de, ora desviar de troncos e raizes, ora agachar para ir por baixo, ora passar por cima, ora passar entre eles. E a equação complicava um pouco mais devido a mochila cargueira nas costas que me fazia perguntar se realmente não compensa mais ir com mochila de ataque no estilo bate e volta. Esses desafios, que na volta ainda apareciam mais aborrecidos, me fez dar o adjetivo de chata, e não difícil, para essa trilha.
Em algum momento, onde já se dava para avistar a montanha se aproximando, chegamos no ponto chamado "Última Chance". É na Última Chance que existe o último ponto de água da trilha. E o momento de encher de vez a cargueira com toda a água que vai precisar para o restante da subida, a noite no acampamento e a descida no dia seguinte. É depois da Última Chance que a trilha começa a sair de mata fechada e tomar proporções de subida típica de montanha mesmo: campo mais aberto, exposição ao sol, subida por pedras e uma vista de tirar o fôlego. É nessa subida que se apresenta o único trecho de cordas, que apesar de longo, não exige tanto de quem se aventura pela montanha. Basta ir direcionando o corpo para os lugares certos e voilá. Quase cume!
Trechos com corda: menos desafiador do que aparenta ser. A típica subida de montanhas no Brasil: exposição ao sol, trecho mais aberto, subida por pedras e uma paisagem sensacional
Quase?
Bom, foi o que tinha imaginado!
Mesmo colocando a quinta marcha e dando um gás total, a proximidade do cume foi uma ilusão. Ainda existe um bom trajeto até avistar as duas famosas placas instaladas na década de 60 como repetidoras de sinais de rádio e que hoje fazem parte de todo o folclore da montanha. Antes de chegar nela ainda é possível ter uma boa vista do famoso Pico Paraná (ponto culminante da região Sul do Brasil). Depois de chegar nelas se tem uma dimensão de grande parte do que é a Serra do Ibitiraquire e também, olhando para o Oeste, da cidade de Curitiba, que fica bem iluminada durante a noite.
As famosas placas gêmeas que fazem referência ao Siririca e a vista do alto da montanha
O cume é bem espaçoso, porém tomado de caratuvas que quando altas formavam pequenos labirintos e mesmo baixas limita bastante o espaço de acampamento. Tivemos que dispersar as barracas por onde encontramos terrenos "acampáveis". Como chegamos e montamos acampamento antes das 16 horas, sobrou bastante tempo para resenhar bastante lá no cume sobre os causos de toda a temporada de montanhas de 2023. Sobrou tempo para tirar bastante foto e tempo para tomar um, dois, três (no meu caso) xícaras de café. Mas, por mais que o fim de tarde foi agradável, o melhor do Siririca ainda estava por vir.
Porque a noite encheu o céu de estrelas. O tempo estava agradável. Não vou mentir: a ventania balançou a barraca, mas não foi nada comparado ao que havia atravessado na Pedra da Mina no mesmo ano, ou lá na vizinhança, pelos lados do Itapiroca, no ano anterior.
Hotel bilhões de estrelas. A noite favorece demais no alto da montanha
E por sua vez, a manhã trouxe o que a montanha tinha de melhor para oferecer. Um nascer do sol tão incrível, mas tão incrível, que fazia até esquecer toda a volta que tinha pela frente. A face leste certamente é a melhor vista do Siririca. Que fez valer a pena o acampamento em uma trilha que passei metade do percurso pensando se não era melhor fazer o bate e volta de ataque. Um nascer do sol que fez, enfim, encerrar a temporada de montanhas de 2023 com dignidade!
O típico nascer do sol na Serra do Ibitiraquire
Ou quase isso... não se espantem se depois de tudo ainda chegar na fazenda do Bolinha suado, cansado e com o corpo coberto de lama espalhada pelo caminho de volta.
Mais uma surpresa desse K2 paranaense!
PS: é possível tomar uma ducha na Fazenda do Bolinha, já eu preferi um bom banho de rio como faziam os antigos.
