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Trilhas Perdidas 23/10/2016 22:35
    Vale do Calango

    Vale do Calango

    Caminhando sobre o chão quente do Espigão Mestre, em busca dos primeiros registros fotográficos da imensa Cascata do Calango.

    Praticamente desligou o telefone na minha cara. Tive que insistir para que o sujeito ouvisse minhas razões. Me esforçei, disse a verdade, maquiei com mentiras e lustrei com as histórias mais bonitas. Mas não adiantou. Com arrogância, fomos proibidos de entrar naquelas terras que eram a porta de entrada do Vale do Calango.

    Visto do alto, o Vale do Calango tem seu nome justificado: uma formação encrustrada no Espigão Mestre assemelha-se razoavelmente ao corpo de um calango. E na pata direita desse calango, duas altas cachoeiras, uma em cada dedo: a Cachoeira do Calango e da Calanga. A primeira tinha um fluxo mais constante e cheio; a segunda parecia mais uma queda de chuva. Ambas ficavam no máximo 12km da fazenda mais próxima, com um bom trecho de leito nos quilômetros finais.

    Com a esperança um pouco abalada, e o sangue fervendo após a conversa por telefone, saímos da fazenda com a intenção de achar outros acessos. Na prática, ainda teríamos que adentrar aquelas terras proibidas, já que elas cobríam praticamente todo o vale. Decidimos que andaríamos sorrateiramente por lá, mas parando os carros numa fazenda anterior. Fomos bem recebidos e instruídos. Detalhe: a dona da fazenda nem suspeitava da existência da cachoeira; o caseiro da primeira fazenda sabia, mas nunca tinha visto de perto.

    Nossa trilha exploratória teria uma acréscimento de 2 ou 3km. Entraríamos cedo nas águas do rio Tabocas, que em fevereiro estava todo amarronzado e morno. As primeiras horas de caminhada foram mais tensas, já que não poderíamos chamar a atenção dos caseiros. As passadas tinham que ser silenciosas. A confiança de que estávamos suficientemente longe do perigo só veio depois de passar por vários pastos e cercas.

    O caminho desde a fazenda base até o córrego tributário que leva às cachoeiras é quente, muito quente. Principalmente porque o cerrado é esparso e existem muitos trechos cobertos por pasto. E naquela época, o volume do rio Tabocas não estava ideal e a sua temperatura atrapalhava mais que ajudava na hora de se refrescar.

    Um emaranhado de trilhas batidas e apagadas vez ou outra nos botavam num caminho levemente diferente. Mas todos levavam à Roma. Chegamos no ponto de acampamento por voltas das 17h. Acampamos numa pedreira bem perto da entrada do tributário que no dia seguinte percorreríamos. Estava tudo tão quente que as pedras passaram toda a madrugada ainda mornas. Que noite horrível aquela!

    No dia seguinte partimos para o trecho final. Pegamos o leito do tributário. Aos poucos o vale ía se fechando. Trilhas um tanto apagadas na mata ciliar ajudaram no começo, mas logo o leito tornou-se a única via possível. Algum tempo depois chegamos na bifurcação que levaria à Cachoeira do Calango ou à Cachoeira da Calanga. Naquela altura as águas já estavam mais frias e transparentes.

    Pegamos o caminho à esquerda. Dali em diante o trajeto seria mais complicado, com pedras maiores. Nos deparamos com formações interessantes, como uma cachoeira pequena dentro de uma "gruta" e a cachoeira do calanguinho (somos muito originais nessa arte de nomeação). Sobe pedra, desce pedra. Paredões muito bonitos nos cercavam a toda hora. Enventualmete chegamos na ante-sala da Cachoeira do Calango. Já dava pra ver aquela queda alta, num ambiente tão bem preservado. Para nossa surpresa, tratava-se de uma cascata.

    É interessante: a cascata vai caindo numa escadaria e lá embaixo ela se depara com um paredão. Só que o espaço entre o final da queda e o paredão é pequeno. Forma-se, então, um "corredor de chuva" bem legal e fotogênico (foto da capa). O poço do Calango é pequeno e, dependendo da época, torturantemente frio.

    A volta para os carros foi no esquema da ida: silenciosa e sob um sol escaldante. Foram quase 30km em dois dias.

    Tivemos uma segunda expedição em junho de 2016. Serviu para assentar alguns conhecimentos e explorar a Cachoeira da Calanga. Acampamos num lugar bem melhor, já no leito do tributário principal, que conta com muitas pedras planas e secas. Verificamos que existe um lugar logo antes da Cachoeira do Calango que oferece condições perfeitas para camping (com uma paisagem lindíssima). Mas a estrela da noite era a Cachoeira da Calanga: estava com pouquíssima água, mas o pouco que caía lambia com gosto um enorme paredão. Lá embaixo, um poço calmo, de temperatura congelante.

    É... um dos locais mais sensacionais desse Centro-Oeste que não acaba. O Vale do Calango é frio e quente, longe e perto. Tudo ao mesmo. Mas sempre, sempre bonito.

    (Quase todas as fotos são de autoria do Fred Garcez, Alex Rocha e/ou Rennaly Sousa)

    Trilhas Perdidas
    Trilhas Perdidas

    Publicado em 23/10/2016 22:35

    Realizada de 20/02/2016 até 05/07/2016

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