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BAHIA 1995
Boteco com Jimmy Page, carro destruído por um jegue, arrastão em Salvador e Pink Floyd na praia em Morro de São Paulo
Cascada Road Trip HikingNo início de 1995, em meio à vida universitária intensa e cheia de atividades no interior de São Paulo, decidimos conhecer a Chapada Diamantina e o litoral da Bahia. Partimos de São Carlos, SP alguns dias antes do carnaval, passando por Belo Horizonte, MG, com pernoite em Teófilo Otoni, MG, onde quase destruímos o quarto do hotel em uma guerra de chinelos e travesseiros. Chegamos em Lençóis, BA no final do dia e nos instalamos em um camping com estrutura bastante precária. Lembro que a área de banho ficava permanentemente inundada, com alguns tijolos espalhados sob o chuveiro. Realmente uma péssima escolha.
No dia seguinte (17/02/95) decidimos explorar alguns atrativos pela região. Inicialmente caminhamos até a o Salão das Areias Coloridas, uma região com formações rupestres areníticas, onde as diferentes tonalidades e cores da areia erodida davam nome ao local. De lá continuamos subindo o leito do rio Lençóis. Sem maiores referências e nenhuma sinalização no local, decidimos adotar uma estratégia para não perder muito tempo procurando os atrativos da região. Avistamos um grupo com cerca de 10 pessoas e passamos a segui-lo a distância. Foi assim que chegamos na cachoeira Primavera.
Aos poucos fomos nos entrosando com os integrantes daquele grupo e descobrimos que apenas duas pessoas ali presentes haviam contratado o guia. Os demais estavam fazendo exatamente o mesmo que nós: seguindo alguém para chegar aos atrativos.
No retorno para a cidade de Lençóis, nossos novos colegas nos contaram que estavam hospedados em pousadas e que os preços eram bem convidativos. De imediato juntamos nossas tralhas e saímos daquele camping pavoroso, indo nos hospedar, confortavelmente, em um quarto coletivo de uma charmosa pousada, que acabou sendo ocupado apenas por nós. Também passamos a fazer as refeições juntos, em um restaurante com comida caseira e um delicioso suco de manga, feito com “água da Muritiba”, segundo o nosso garçom mirim.
No dia seguinte fomos todos juntos conhecer a cachoeira do Sossego, diversas piscinas naturais ao longo do ribeirão do Meio e o Tobogã, formado por uma extensa laje de pedra onde era possível escorregar até um grande poço. Foi assim que teve início a turma formada por mim, Gina, Gustavo, Alexandre, Beto, Josué, Luli e Alessandra, que permaneceria unida por quase toda a viagem pela Bahia.
À noite, ficamos sabendo de um bar chamado Lajeado, local frequentado por muitos turistas estrangeiros naquela época, com mesas de pedra e música ao vivo. Chegamos no início da noite ao local e ocupamos uma grande mesa de canto, ocasião em que iniciamos a degustação de batidas feitas com frutas típicas e cerveja. Com o bar cheio e já um tanto embriagado, exercitei meu alemão enferrujado com alguns turistas austríacos e alemães. Foi quando o Gustavo (irmão da Gina) me encontrou e disse ter conversado com o Jimmy Page. Como também já haviam me dito que o Raul Seixas estava pela cidade, apesar de ter falecido em 1989, não dei muita atenção de imediato.
Em um determinado momento as luzes diminuíram e um cara se levantou de uma das mesas, indo até o palquinho ao nosso lado, onde começou a dedilhar uma guitarra. O dono do bar, um cabeludo barbudo assumiu os atabaques e teve início um som instrumental. Para nossa surpresa, era mesmo o Jimmy Page tocando bem a nossa frente! Na época ele estava noivo de uma Argentina radicada no Brasil e havia comprado uma casa em Lençóis. Foi sem dúvida um dos momentos mais insólitos da minha vida!
Trilha para a cachoeira do Sossego, em Lençois, BA.
No Bar do Lajeado, em Lençois, BA.
Jimmy Page, guitarrista do Led Zeppelin, batendo papo na mesa ao lado.
Em nosso terceiro dia em Lençóis, fomos ao Morro do Pai Inácio e, em seguida, à cachoeira da Fumaça, acessada pela trilha que tem início no Vale do Capão. Na volta da cachoeira, paramos em uma choupana onde comemos um delicioso pastel feito de palmito de jaca. Já no início da noite, fomos até um pequeno povoado na região, estilo “comunidade alternativa”, onde jantamos pizzas artesanais feitas com massa de trigo integral.
No quarto dia fomos conhecer a Lagoa da Pratinha, situada em uma região cárstica e com águas incrivelmente transparentes. Naquela época o local ainda não havia se transformado em um balneário, sendo ainda pouco frequentado. A lagoa ainda era tomada por vegetação aquática e repleta de peixes. Era possível nadar na gruta da Pratinha sem maiores restrições e todo o local estava bem preservado. Passamos o dia mergulhando naquele paraíso.
No retorno para Lençóis tentamos, sem sucesso, ver o pôr do sol do alto do morro do Pai Inácio. Inconformados, decidimos pernoitar no local, com uma passada antes em Lençóis para pegar o material necessário. O Josué levou uma garrafa de Whisky e um lençol com estampas do coelhinho da Playboy, o que lhe rendeu este apelido pelo restante da viagem.
Em 22/02/95, quinto dia da viagem, nos separamos dos nossos colegas para visitar as cavernas Lapa Doce I e II, uma vez que eles não tinham equipamento adequado para uma aventura espeleológica. O proprietário autorizou nossa entrada nas partes mais restritas e passamos o dia explorando a cavidade. No dia seguinte, novamente com a turma reunida, fomos conhecer o Poço do Diabo e a cachoeira homônima, acessados por uma trilha curta a partir da BR 242. À noite ainda fomos até a Gruta do Lapão, uma caverna quartzítica localizada cerca de 5 km do centro de Lençóis, com uma boca de 60m de altura e cerca de 1.000m de extensão.
No dia seguinte, após deixar Lençóis, ainda fomos conhecer o Poço Encantado, cerca de 40km de Igatu, com um lago incrivelmente azul dentro de uma gruta, onde é permitida apenas a contemplação, concluindo assim nossas atividades na Chapada Diamantina.
Nossos planos eram seguir diretamente para a Praia do Forte, para escapar do tumultuado carnaval em Salvador. No caminho, ainda em estrada de terra, encontramos um casal com dois pneus do carro furados. Prestamos o devido socorro providenciando os reparos necessários e retomamos o nosso caminho. Na estrada de asfalto, rumo a Feira de Santana, um jegue apareceu do nada e colidiu com o nosso carro, destruindo o para-brisa e a lateral da porta do motorista. Inexplicavelmente o animal sobreviveu ao impacto e sumiu em meio à caatinga.
No início da noite chegamos em um posto de gasolina pouco antes de Feira de Santana onde reencontramos com o casal que havíamos auxiliado horas antes. Devido à ocorrência frequente de assaltos no entorno de Feira de Santana, só era permitido seguir pela estrada em comboio escoltado pela polícia. Lembro que tive que dirigir com a máscara de mergulho, para aguentar o vento no veículo sem para-brisa. Seguir para a Praia do Forte estava fora de questão por conta do acidente e do avançado da hora. Por sorte, o casal nos convidou para ficar em um apartamento em Salvador, que estava vago devido à desistência do locatário.
Assim, contrariando nossos planos, passamos os três dias seguintes de carnaval em Salvador, confortavelmente acomodados em um apartamento de luxo. O difícil foi acompanhar o casal que, embora extremamente solícito e simpático, insistia em nos levar em restaurantes e passeios caros, incompatíveis com o nosso padrão financeiro universitário.
No sábado de carnaval decidimos ir até o Farol da Barra, ver os trios elétricos. Corria tudo bem até a passagem da banda Chiclete com Banana, seguida por um arrastão que nos pegou desprevenidos na “pipoca”. Depois de virar saco de pancadas e ter tudo nos bolsos surrupiado, passei o restante da noite percorrendo os ambulantes e postos de polícia ao longo da avenida, até recuperar todos os documentos. Carnaval em Salvador, nunca mais!
Turma na Cachoeira da Fumaça.
Parte alta da Cachoeira da Fumaça.
Mergulho na Lagoa da Pratinha, em uma época em que o local era pouco frequentado e ainda bastante preservado.
Caverna Lapa Doce, em Iraquara, BA.
Depois de três dias em Salvador, com uma passagem rápida pela Praia do Forte, visitas ao Projeto Tamar e às ruínas da Casa da Torre de Garcia d'Ávila, seguimos viagem com o carro devidamente reparado. O Alexandre havia ficado em Lençóis e nossas colegas Luli e Alessandra retornaram de avião para São Paulo, fazendo com que nosso grupo ficasse reduzido a cinco pessoas. Tomamos um Ferry Boat até a ilha de Itaparica e de lá, pela estrada de asfalto até Valença, onde pegamos o barco que nos levou até Morro de São Paulo, localizado a noroeste da ilha de Tinharé, naquela época ainda um pacato povoado que começava a despontar para o turismo.
Alugamos um quarto num sobrado, onde ficamos todos amontoados, mas com conforto suficiente para boas noites de sono. Com praias paradisíacas cercadas de coqueiros e um mar transparente, além de botecos que à noite só tocavam Pink Floyd em pleno carnaval, foi impossível não nos encantamos pelo local, onde permanecemos por três dias inesquecíveis.
No dia 02/03/95 deixamos a ilha de Tinharé rumo a Trancoso, onde nos hospedamos em casas de moradores no “Quadrado”. Foram mais três dias de Sol, praia e diversão. No retorno para São Carlos, nos despedimos de nossos colegas Josué e Beto na alça de acesso para Vitória. Ainda os encontraríamos no meu casamento e depois disso, nunca mais tivemos contato. Ficaram as lembranças dos ótimos momentos que passamos juntos ao longo desta incrível viagem.
Ruínas da Casa da Torre de Garcia d'Ávila, próximo à Praia do Forte.
Morro de São Paulo, BA.
Fonte Grande, construída em 1746 no povoado de Morro de São Paulo, BA
Praia na maré baixa em Morro de São Paulo, BA
Três dias em meio à praias paradisíacas.
Relaxando em Trancoso, BA.
Disseram que era areia medicinal. Pela cara do grupo, mal não fez.
Boas lembranças de uma viagem a uma Bahia que já não existe mais. Muita coisa mudou desde lá. Parabéns pelo relato. Muitos perrengues, típicos de universitários kkkkkk.
Muito Bom! Mesmo eu, que à época tinha menos de 10 anos de idade, fiquei nostálgico com este relato! Como diz o poeta, "saudade do que não vivi" rs! Bela aventura! Abraços
Muito legal mesmo, André. Resgatar as aventuras lá do fundo do baú sempre nos traz saudosismo. A passagem da área de banho do camping me remeteu ao banheiro do camping do extinto hotel Alsene, na parte alta de Itatiaia, não muito depois de sua aventura. Acampado neste local, dar descarga no vaso sanitário fazia com que parte do esgoto retornasse pelo ralo do box do chuveiro. Só descobri isso tomando banho, pisando sobre umas madeiras (então entendi a função das madeiras). Ainda bem que aquilo não existe mais e o hotel cobrava uma fortuna para quem era hóspede. E sempre há pessoas nos acompanhando nestas roubadas que se perdem e não as vemos mais. É estranho... Um abraço e parabéns pelo relato!