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Bruno Negreiros 18/07/2020 20:50 com 6 participantes
    Monte Roraima | Parte I – Dias 1 - 4/8

    Monte Roraima | Parte I – Dias 1 - 4/8

    Primeira parte do relato da expedição ao Monte Roraima, entre a Venezuela, o Brasil e a Guiana. Logística + Paraitepuy x Cume (Maverick).

    Montanhismo Trekking

    Monte Roraima | Parte I – Dias 1 a 4/8 – Logística + Paraitepuy x Cume (Maverick).

    Tipo de Aventura: Expedição entre a Venezuela, o Brasil e a Guiana.

    Ponto Base: Aldeia de Paraitepuy - https://goo.gl/maps/1CAQAJJV9jEkey4k9

    DICAS:

    • A contratação de guias e carregadores locais é obrigatória. Mesmo que você esteja contratando uma empresa brasileira para fazer todo o processo, procure se informar sobre quais serão os verdadeiros guias.
    • Antes de seguirmos para a expedição, nos hospedamos via Booking no Hostel Roraima. https://www.booking.com/hotel/br/hostel-roraima.pt-br.html
    • Guia contratado: Leopoldo – Roraima Destiny = +58 424-9115872
    • Tenha total conhecimento do roteiro a ser seguido. Isso vai te ajudar a conversar e argumentar com os guias frente às adversidades que possam aparecer.
    • Monte a logística de saída de Boa vista para a Venezuela de forma que você saia o mais cedo possível. A viagem é longa e problemas no caminho podem atrapalhar o seu roteiro, visto que o início do trekking só é permitido até às 13:30.
    • Pergunte ao seu guia quais os melhores taxistas para contratar. Ele vai te recomendar as melhores opções.
    • Os quatro primeiros dias representam a subida e o início da exploração do cume. Esteja fisicamente preparado.
    • Em caso de excesso de cansaço ou de problemas físicos, a melhor opção é contratar ou pedir ajuda para algum carregador. Ninguém precisa provar nada pra ninguém e a ajuda deles será essencial para que todos possam viver uma grande experiência.

    RELATO

    O Monte Roraima é um sonho antigo. Uma montanha/expedição que sempre me encantou por tudo que está envolvido: sua logística fora do país, apesar de bem próxima de nossas fronteiras, as tradições envolvidas, sua beleza cênica e todos os inúmeros desafios que já me peguei imaginando sobre.

    Lembro bem de me ver pesquisando sobre ela ainda em 2018, quando por circunstâncias da vida, ainda me parecia bem distante. Não estava, por um incrível alinhamento de desejos, lá estava eu preparando tudo para passar o carnaval de 2019 caminhando sobre o seu arenito. O que infelizmente não foi possível. Apesar de estar com a viagem paga, com a mochila pronta e com a passagem comprada, uma semana antes, por problemas políticos, a fronteira entre o Brasil e a Venezuela foi fechada por tempo indeterminado, impossibilitando assim o trânsito entre os países vizinhos e a realização do trekking. Foi uma tristeza que carreguei por alguns meses...

    Até que, em julho de 2020, enquanto atravessava a Serra Fina (relato disponível em: https://aventurebox.com/bruno-negreiros/travessia-da-serra-fina-em-2-dias-mg-sp-e-rj/report) fiz amizade com um Angolano/Paulista muito gente boa: o Alex. Durante as intensas andanças pela Mantiqueira, eis que o mesmo puxa o assunto: “Amigo, achei muito legal o seu grupo e quero muito ir para o Monte Roraima no próximo carnaval, vamos?”. Lembro bem daquilo me rasgando por dentro. Era uma mistura muito doida de medo por tudo que havia acontecido cedo naquele ano e de animação. Sim, quem me conhece sabe o quanto eu fico animado com esse tipo de desafio. A princípio, externalizei as dificuldades e disse que seria muito difícil. Afirmei que tinha muito medo de me responsabilizar por uma expedição que poderia, por muitos motivos que fugiam ao meu controle, não acontecer. Ah, como eu tenho essa mania de mentir para mim mesmo. No fundo, a admiração pelo Monte já palpitava dentro de mim.

    Já depois da Serra Fina, em casa e extremamente abalado por tudo que tinha dito, pensei: “cara, tô afim de arriscar”. E foi assim que tudo começou. Liguei para o Alex e já pedi o telefone do guia que ele pretendia contratar, conversei com muitos amigos na esperança que me desanimassem, o que não fizeram e, por fim, telefonei para o guia. Orçamentos feitos, logísticas em idealizações prévias na minha cabeça. Pensei: “pior que acho que dá pra fazer algo lindo”. Esse algo significava montar uma expedição a preço de custo pelo grupo que administro, o Clube Outdoor. E assim foram meses de anúncios, demonstração de interesses, recolhimento de dinheiro, pagamentos aos guias, resolução de problemas e tudo que só quem organiza uma expedição sabe o que rola. Mas deu tudo certo. Foi então que em fevereiro de 2020, partimos 16 pessoas extremamente animadas rumo à essa maluca e muito feliz ideia de ir ao Monte Roraima.

    Lá estava eu, rumando para o norte do país...

    Esse relato se configura como sendo a primeira parte da descrição dessa grande aventura realizada com o Clube Outdoor, referentes aos quatro primeiros dias de trekking, de um total de oito. Para saber mais sobre esta aventura do ponto de vista de outros participantes e para conhecer mais sobre o grupo, visite os relatos abaixo indicados.

    Logística

    Cheguei em Boa Vista na madrugada no dia 21/02, um dia antes do dia marcado para a expedição. A minha ideia era descansar um pouco antes de seguir para a intensa caminhada e, aproveitando o tempo que tinha, passear um pouco para conhecer Boa Vista. Depois de algumas horas de sono, levantei, tomei café e parti para uma caminhada pela cidade. A cidade é pequena e não precisei de muito tempo para conhecer os pontos mais legais, com destaque para a Praça das Águas e a Orla Taumanan. Retornando para o hostel, descansei um pouco e, na parte da tarde e da noite, aproveitei para me encontrar com mais alguns outros amigos da expedição que também já haviam chegado na cidade para mais uma volta para comermos alguma coisa. Voltando em definitivo para o hostel, agora a ideia era descansar pois toda a logística começaria no dia seguinte.

    Acordei por volta das 4:20 da madrugada e comecei a fazer ligações para os amigos que estavam em outras hospedagens, os que tinham acabado de chegar no aeroporto e para confirmar todos os táxis agendados. Alguns sustos aqui, umas pequenas resoluções ali e, depois de preparar a mochila e me despedir do hostel, os táxis pegaram todos os parcitipantes por volta das 5:00. Todos juntos, seguimos rumo à Venezuela. Foi uma viagem tranquila apesar dos inúmeros buracos na estrada, chegando na fronteira por volta das 11:00.

    No lado brasileiro da fronteira os veículos estacionam, os turistas descem, procedem com os ritos diplomático, recebem o carimbo e retornam aos táxis para um pequeno transfer até a fronteira venezuelana. Lá se encerra a primeira parte de toda a logística. Mais um carimbo no passaporte. Lá, encontramos com o guia Leopoldo, trocamos os táxis por veículos 4x4 disponibilizados, empacotamos as mochilas no teto e retomamos a nossa viagem. Não tivemos nenhuma dificuldade em passar pela fronteira. Tudo aconteceu bem rápido à medida que comunicávamos que o nosso destino turístico era o Monte Roraima e que éramos um grupo de amigos.

    A viagem agora seguiu para a pequena cidade de Santa Helena de Uairén. Lá, compramos algumas últimas coisas nos mercadinhos locais, recebemos toda a explanação sobre o nosso roteiro e desafios dos próximos dias com um grande mapa de todo o Monte aberto sobre a mesa. Dava pra ver o olhar de excitação, medo e curiosidade de todos os que alí escutavam atenciosamente todas as palavras do guia. Claro, aproveitando um dos nossos últimos contatos com o pouco conforto da simpática cidade, compramos algumas cervejas para celebrar que tudo ia começar. Voltamos então para os 4x4 e seguimos viagem para Paraitepuy, aldeia indígena de onde começa a caminhada e também uma das responsáveis pelo controle de visitantes.

    Antes do fim da viagem rodoviária, paramos nas placas indicativas e informativas dos Parques que compõem toda a região protegida do Monte Roraima. O gerenciamento é feito em conjunto pelos institutos Inparques (venezuelano - Parque Nacional Canaima) e ICMBIO (brasileiro - Parque Nacional do Monte Roraima), estando localizado na Serra de Pacaraíma, no planalto das Guianas e coberto pela região denominada Gran Sabana. No Monte Roraima e em seu cume de aproximadamente 2.700 metros de altitude (médio), estão a fronteira entre a Venezuela, o Brasil e Guiana, sendo a primeira com a maior composição territorial e o caminho de acesso para o trekking, partindo da aldeia Paraitepuy.

    Instruções para visitantes.

    Eu realmente estava lá.

    Dia 1 – 22/02/2020 – Paraitepuy x Rio Tek.

    Chegamos na aldeia por volta das 13:40. Alí, nosso primeiro desafio já apareceu. Segundo os nossos guias, os responsáveis não queriam permitir o nosso acesso naquele dia, já que tínhamos passado do horário máximo permitido, que seria 13:30, conforme mencionado nas dicas deste relato. Tudo começou a ficar bem nervoso entre todos os participantes da expedição, já que isso não estava previsto no roteiro e significaria uma longa caminhada no dia seguinte. Com calma, conversamos com o responsável e expomos o nosso anseio e experiência em caminhadas longas. Argumentamos que não seria um problema andar todo aquele percurso no avançar das horas e que não temíamos chegar ao acampamento de noite. Queríamos muito ir. Por sorte fomos ajudados por um supergrupo que chegou quase junto com a gente. Se eles autorizassem um, tinham que autorizar o outro. Felizmente, ele liberou a nossa entrada. Comemos muito rapidamente o que foi preparado pelos nossos guias, escutamos as orientações dos responsáveis da aldeia e, por volta das 14:30, iniciamos a nossa caminhada de 8 dias no Monte Roraima.

    Paraitepuy

    A caminhada de aproximadamente 14 km decorreu em terreno sem muitas variações altimétricas atenuadas. Era uma trilha muito bem batida e sem nenhuma dificuldade de orientação. Na dúvida, era só mirar para o gigante que se erguia no horizonte e seguir em frente. Caminhávamos sempre avistando o Monte Roraima e o Monte Kukenán. Apesar de encobertos por nuvens, já começavam a dar todo o ar de imponência na paisagem. Lembro bem de como eu ficava encantado e surpreso a cada pequena oportunidade em que as nuvens davam uma trégua e era possível avistar um pedaço maior de todos os seus contornos. Mas toda essa contemplação durou pouco, já que faltando cerca de 5 km para o acampamento, fomos acertados pela chuva. Felizmente, não veio com muita força e não durou por mais de 30 minutos.

    A caminho do Rio Tek.

    A trilha estava bem movimentada. Era carnaval e a fronteira havia ficado muito tempo fechada em 2019, gerando um fluxo ainda maior de turistas. Por vezes me peguei pensando em toda essa situação. Não parecia certa a presença de outros grupos formados por mais de 48 pessoas. Porque autorizaram isso? Seria a real necessidade financeira? Pode ser que sim. Em muitos momentos da viagem o tema de conversas com os guias caminhava para as recentes dificuldades que vinham enfrentando com todo o caos político e econômico no qual estava imerso a Venezuela. Veja bem, não que o Brasil estivesse uma maravilha, não estava. Apesar de compreender sinceramente todas as questões sociais envolvidas e a real necessidade e problemas financeiros que assolou todos os envolvidos com o turismo na região nos últimos meses, não conseguia deixar de achar um absurdo tamanho desrespeito envolvido em autorizar grupos tão grandes em um curto período de tempo.

    E com esse pensamento e outros muitos, sempre envolvidos em puro senso crítico, continuei minha caminhada. Mantivemos um ritmo médio e chegamos por volta das 17:30 no Camping 1, próximo do Rio Tek. Alí felizes por termos chegado, descemos para tomar banho e retornamos. Tive que ajudar na resolução de mais alguns problemas na parte da noite, como o cálculo errado no número de barracas para os participantes que usariam os equipamentos do guia. Apesar de uns momentos de tensão, tudo se resolveu quando apareceram barracas extras para aqueles que estavam desabrigados. Com tudo (quase) certo, jantamos e fomos descansar. Não tinha sido um dia difícil de trekking, mas toda a logística que havia iniciado ainda às 4 horas da manhã no Brasil, as longas horas de estrada e todos os ritos burocráticos envolvidos me deixaram exaustos. Apaguei. Eu merecia dormir.

    Dia 2 – 23/02/2020 – Rio Tek x Camping Base.

    Acordamos às 6:00, arrumamos as coisas e tomamos o primeiro café da manhã da expedição. Particularmente, eu gostei muito. Segundo a Letícia Freitas em seu relato na página do Clube Outdoor, tomamos chá preto, café, ovos mexidos e três “pastéis” que pareciam feitos de massa de bolinho de chuva.

    Saímos do acampamento às 8:30 e caminhamos rumo ao rio Kukenán. Com um visual sempre do Monte que dava nome ao rio e do Roraima na nossa frente. Após uma hora de caminhada, estávamos no belíssimo rio repleto de rochas e água gelada. Na região, os montes, assim como outros próximos, são chamados de Tepuy. Segundo o povo indígena Pemón, a palavra significa montanha em sua língua tradicional. São grandes formações rochosas em formato de mesa com paredes bem verticais, compostos principalmente de quartzito e arenito, característicos da região da Gran Sabana e dotados de muitas lendas e significados pelos povos indígenas que habitam a região.

    Grupo reunido um pouco antes do rio Kukénan.

    Paramos, tomamos um merecido banho para relaxar, já que o dia seria de subida constante até o camping base do Monte. Alguns minutos depois, nos secamos e continuamos a pernada. O caminho seguia tocando para cima, sempre na direção do grande Tepuy. Aqui o grupo começou a dar mostras de como ia se dividir. Uma galera mais rápida ia na frente, seguindo a liderança da Josye Villela, enquanto eu fiquei cuidando das coisas mais para trás. Mais um pouco de subida e paramos para o almoço. Volto a usar a descrição bem completa da Letícia sobre a comida: uma salada de repolho, atum, milho, ervilha, tomate, pepino, tudo isso acompanhado de pão árabe. Para complementar, maionese e ketchup. Além de um suquinho de morango. Rolou também uma melancia de sobremesa.

    Tenho que reforçar e aplaudir toda a equipe que nos dava suporte na caminhada. Além dos nossos guias, tínhamos um time de carregadores que levavam a cozinha, o lixo, o banheiro e algumas barracas. Para você ter ideia, alguns deles chegam a carregar quase 50 kg em suportes de madeira montados artesanalmente. Algo cultural e impressionante.

    Rumo ao camping base.

    Mais um pouco de subida, agora um pouco mais íngreme e repleta de cascalho. Por volta das 15:00, depois de uma caminhada de cerca de 9 km, chegamos ao camping base do Monte Roraima. Um dos campings mais bonitos de toda a expedição. Após montarmos as barracas, tomamos banho, conversamos e jogamos cartas. As nuvens cobriam o Tepuy que agora já não parecia tão distante. Eu olhava e ficava imaginando como seria a subida do dia seguinte, já muito bem explicada e informada por um dos guias. Lá vinha uma mega rampa de pedra para superarmos. Minha emoção começava a saltar os olhos. Logo estaria encostando minhas mãos em suas gigantes paredes de aproximadamente 1.000 metros de desnível. O melhor ainda estaria por vir.

    Dia 3 – 24/02/2020 – Camping Base x Cume + Jacuzzis

    Tivemos uma noite chuvosa no acampamento base. Já de manhã, o tempo estava instável, mas não chovia. Apesar disso, uma paisagem deslumbrante nos encantava de manhã: uma nova e surpreendente cachoeira se formou no paredão do Monte Roraima provocada pelo enchimento das nascentes e canais de drenagem do topo. Era algo simplesmente fantástico.

    A Cachoeira matinal.

    Bom, seguimos o ritual mais uma vez: tomamos café, arrumamos as coisas e desarmamos as barracas. O guia nos apontou a subida e avistamos a rampa de mata por onde seria a ascensão. "una rampita" - disse ele. A ansiedade só aumentou. Por volta das 8:15, colocamos as mochilas nas costas e seguimos rumo ao nosso maior objetivo: o topo do Monte Roraima. O início da subida se deu em um espaço bem íngreme e exposto, com coloração branca bem característica do arenito. Dava pra ver de longe. Subimos e adentramos em uma rampa que seguiria até a parede da montanha. Essa rampa tinha uma mata bem úmida e fechada, de enorme beleza cênica. Mais uma vez, o grupo foi se dividindo, mas com as lideranças também divididas, tanto internamente no Clube Outdoor, como dos guias contratados, tudo estava dentro do controle. Os nossos rádios ajudaram muito.

    Subindo a rampita.

    Seguimos por mais algum tempo até, por volta das 10:20, encontrarmos o paredão do Roraima. Aí foi cada um com o seu ritual. Uns encostaram levemente, outros abraçaram ou deram um tapinha de obrigado naquela imensa montanha que se erguia sobre mim. Aquela que seria a nossa maior companheira pelos próximos dias. Aqui foi a primeira vez que eu me emocionei na viagem. Por alguns segundos eu acariciei o paredão e pensava: “É, eu tô aqui”. Ao mesmo tempo, olhava para cima com uma angulação vertical e só pensava no que sentiria quando chegasse ao cume.

    Curva à esquerda e voltamos para a subida. Nas palavras do Bruno Lacerda: “o relógio batia 12:00 quando, livres da maior parte do tráfego da rota, adentramos a quase indescritível área do Paso de Las Lagrimas, cujo nome autoexplicativo fez ainda mais sentido porque uma intensa corredeira havia se formado com a chuva recente. Foram 20 minutos subindo os degraus naturais da passagem, com a água despencando sobre nós, vinda do precipício acima de nossas cabeças e do chão à nossa frente.”

    Em uma das muitas conversas que tive com os guias no Monte Roraima, um deles me disse que a forte chuva que pegamos no nosso terceiro dia de caminhada foi fruto do desequilíbrio energético provocado na montanha pelo excesso de pessoas no carnaval. Me peguei mais uma vez muito triste de ver grupos gigantes muito mal organizados durante a subida. Por conta disso, o Monte liberou toda sua força em forma de chuva, trazendo mais um desafio para todos que subiam. O ponto positivo foi ver o Paso de Las Lagrimas, uma cachoeira que fica bem na subida para o cume e que tem o seu volume de água diretamente afetado pela ocorrência ou não de chuvas bem rescentes, em todo seu potencial.

    El Paso de Las Lagrimas.

    Por volta das 13:00 cheguei ao topo. Eu despenquei de duas formas. Na primeira, extremamente cansado psicologicamente com a subida, torcendo para que tudo desce certo e que todos conseguissem chegar ao topo. A segunda, emocionalmente. Comecei a chorar igual criança. Não sabia o que fazer. Hora queria comemorar e sair gritando por aqueles labirintos que se formavam a minha frente. Hora queria apenas ficar em silêncio olhando para qualquer canto daqueles, curtindo a felicidade da conquista. Na minha bela imaginação rolou tudo isso ao mesmo tempo.

    Pouco antes das 13:00, os últimos integrantes do grupo colocaram os pés no topo depois da subida de 7 km. Também nas palavras do Bruno Lacerda: “nos trechos finais, havíamos sido conduzidos pelo guia Geraldo, que nos contou um pouco de sua vida e dos costumes locais. Guardei com especial carinho as palavras dele sobre a luta do povo indígena local para sobreviver, às vezes do turismo, às vezes de caça, pesca ou agricultura. Ainda a palavra "waküperö" ("olá" em taurepan, a língua usada pelos guias e carregadores indígenas para conversar entre si).”

    Tivemos ainda mais 20 minutos de caminhada até o nosso camping. Montamos as barracas em um areal no meio do Monte. De lá, seguimos para as Jacuzzis, piscinas naturais em formados de banheira, com águas cristalinas e geladas que refletem as rochas do entorno. Depois do banho, voltamos para o acampamento.

    As belas Jacuzzis.

    Já lá pelas 19 horas, enquanto todos conversavam, começou a chover novamente. Dessa vez a chuva foi intensa e duradoura, indo até 5:00 do dia seguinte. Seria uma noite muito difícil para nós, já que algumas barracas estavam com problemas no sobreteto. Ninguém nem jantou, por exemplo, já que não havia coragem em sair das barracas enquanto a chuva torrencial nos acertava de jeito.

    Dia 4 – 25/02/2020 – Mirante do Abismo + La Ventana + Maverick

    O amanhecer do quarto dia foi de muito nervosismo. Quando acordamos, descobrimos que tinha entrado bastante água durante a noite em algumas das barracas emprestadas pelo guia. A noite foi de muita chuva e pequenos defeitos nas mesmas foram as causas do problema. o frio e a sensação de insegurança se manteve por toda a noite para essas pessoas. Vale lembrar que ninguém que levou a barraca própria teve algum tipo de problema. A época era propícia para o trekking. O clima na região é tropical, com temperaturas médias de 21ºC. Já no cume, o tempo muda rapidamente entre dias ensolarados e quentes até temperaturas próximas de zero na madrugada, com nuvens que provocam repentinas pancadas de chuva. Segundo os dados meteorológicos da região, os meses de janeiro e fevereiro são pouco chuvosos. Apesar disso, nada nos salvou da chuva da madrugada.

    Bom, apesar de tudo, o dia amanheceu lindo. Tivemos uma grande reunião entre todos, nos acalmamos e pedimos para que o problema fosse resolvido para as noites seguintes. Foi um debate um pouco tenso, mas aliviado ao perceber que os guias também tiveram os mesmos problemas.

    Passado isso, veio a sugestão de adaptar o roteiro e visitar dois pontos de interesse logo pela manhã. Foi quando nosso grupo foi para o Abismo e La Ventana. Uma caminhada de cerca de 20 minutos por cima do Roraima, pulando pedras e pisando em areia. Se ao fechar os olhos, hoje tentando pensar nas imagens mais marcantes dessa expedição, sem dúvida lembro desses pontos com um enorme sorriso no rosto. Era o primeiro dia de céu limpo e a grandiosidade daquilo tudo, agora visto de cima, com a impressionante vista das regiões mais baixas e do Monte Kukénan, causava um grande impacto. Não sei se consigo expressar isso tudo com palavras. Tento isso com as fotos a seguir.

    Mirante do Abismo.

    La Ventana.

    La Ventana de outro ângulo.

    De volta ao acampamento, tomamos café, arrumamos as coisas e fizemos uma outra reunião para planejar o restante da expedição. Foi quando decidimos permanecer nas proximidades de onde estávamos pelo resto do dia, só que nos abrigando em uma caverna.

    Segundo os guias, nessa nossa primeira noite de cume, nós não conseguimos ficar nas regiões normalmente usadas para acampamento denominadas “hóteis” (pequenas grutas e cavernas protegidas da chuva) naquela noite exatamente por conta da superlotação. O Monte Roraima estava com mais gente do que a sua capacidade. Por isso, alguns problemas de organização de campings ocorreram, com alguns grupos pegando o lugar de outros ou até mesmo ocupando um espaço excessivo nas tradicionais cavernas do topo. Foi quando descobrimos que nosso planejamento inicial não era de acampar na praia, evitando todo o perrengue da noite anterior.

    Mas apesar dos problemas, resolvemos levantar o ânimo e seguir com a animação. fizemos então a transferência para a caverna disponível. O local era bem pequeno, o que fez com que todos montassem suas barracas muito próximas uma das outras. Como o acordo era pra descansar, foi isso que fizemos. Passamos uma boa parte da tarde conversando, brincando e sorrindo. Nesses momentos, foi muito legal ver a capacidade das pessoas de superarem os problemas e seguirem em frente. Aproveitando a descontração, tenho que falar como era o nosso banheiro. Usamos por durante os oito dias, uma barrava vertical que continha um banco plástico furado. Nele, colocávamos um saco plástico e fazíamos o que tinha que ser feito. Com tudo já limpo e embalado, inclusive com o papél higiênico, era aplicado um pouco de cal e depositado nas proximidades, até que um carregador recolhesse.

    Nosso banheiro.

    Já no fim da tarde, um dos nossos maiores objetivos seria alcançado. Por volta das 17:00 rumamos para o ponto mais alto do Monte Roraima: O Maverick. Esse nome foi dado por conta da semelhança física com o carro de mesmo nome, visto de um certo ângulo. Após 20 minutos em uma trilha que mesclava o tradicional pula pedra do Roraima, mais uma subida não muito difícil, chegamos lá em cima dos seus 2.810 metros de altitude. A visão era 360º, parte para o imenso cume e outra para as partes mais baixas da Gran Sabana. De longe, ao mesmo tempo, víamos os campings dos dias anteriores e o quanto já havíamos percorrido, e a grandiosidade do que ainda teríamos para explorar. A reflexão foi instantânea. Eu já havia me emocionado em estar na Venezuela, em ver aquilo tudo, em tocar. Nem preciso dizer a emoção que foi chegar em seu topo...

    Todos reunidos no Maverick.

    O Monte Roraima visto do Maverick.

    Antes de descer, fizemos mais algumas reuniões internas para resolver pequenos problemas pendentes e conversamos com o guia sobre o roteiro do próximo dia. O combinado entre todos os representantes dos subgrupos (sim, aqui vale explicar que éramos nós, um grupo de cinco paulistas, dois mineiros e duas alemães, formando 4 subgrupos. Todos guiados pela mesma equipe de guias. O acordado foi de que, na manhã seguinte, andaríamos todos para alguma gruta perto do Quati, transferindo o acampamento e que, de tarde, quem estivesse interessado, faria o ataque até o Lago Gladys e o Mirante da Proa.

    Alguns desceram antes e outros depois. Mais 20 minutos e estávamos de volta ao acampamento, já prontos para jantar, arrumar as últimas coisas e dormir, já que o próximo dia seria intenso. Parte do nosso roteiro tinha sido cumprido. Estávamos no topo do Monte Roraima depois de uma subida bem emocionante. Agora tinhámos muito mais o que explorar antes de retornar. Que venha a parte II.

    Bruno Negreiros
    Bruno Negreiros

    Publicado em 18/07/2020 20:50

    Realizada de 22/02/2020 até 25/02/2020

    6 Participantes

    Henrique Protázio Clube Outdoor Adhemar Paulo Roberto Junior André Leopoldino (Dino) Bruno Lacerda

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    8 Comentários
    Danielle Hepner 18/07/2020 21:13

    Que relato! Escorreu uma lagriminha a partir de "eu realmente estava lá"... A mesma virou uma corredeira na foto do Mirante do Abismo. Cara... Eu ia dizer "fantástico", "incrível", mas tenho a impressão que só um palavrão muito bem falado consegue expressar as impressões e sensações de tudo que tá escrito aqui!

    Bruno Negreiros 18/07/2020 21:33

    Caramba, Dani. Obrigado real pelo carinho. Eu tava aqui nesse instante corrigindo uns errinhos no texto (sempre fico ansioso pra publicar) e confesso que me emocionei com o que você escreveu.

    Rafael Damiati 19/07/2020 14:40

    Maneiro, Bruno! Me fazendo lembrar dos bons momentos que vivi por lá, também no carnaval, mas de 2013.

    Bruno Negreiros 19/07/2020 15:08

    Damiati, você é minha inspiração. Quando eu crescer, quero ser igual você!!

    Fernando Salatiel 19/07/2020 17:07

    Parabéns pelo relato! O Monte Roraima está no topo da minha lista, quem sabe próximo carnaval!!

    Bruno Negreiros 19/07/2020 17:09

    Obrigado, Fernando. Se tiver alguma dúvida, pode entrar em contato!

    Fernanda Ladeira 25/08/2020 16:42

    Realmente, BEM foda!!! ❤

    Bruno Negreiros 01/09/2020 08:58

    Valeu, Fernanda. Depois dá uma olhada na Parte II. Acho que você vai curtir bastante...

    Bruno Negreiros

    Bruno Negreiros

    Rio de Janeiro

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    3751

    Engenheiro ambiental e montanhista com o sonho de contribuir para a disseminação dos esportes ao ar livre e de aumentar a conscientização ambiental e social no mundo outdoor.

    Mapa de Aventuras
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    Mínimo Impacto
    Manifesto
    Rox

    Dri @Drilify, Peter Tofte e mais 442 pessoas apoiam o manifesto.