AventureBox
Create your account Login Explore Home
Marcelo Lemos 10/31/2021 09:54
    Pico do Cabugi - O vulcão brasileiro mais representativo.

    Pico do Cabugi - O vulcão brasileiro mais representativo.

    Breve relato para estimular o aventureiro a conhecer uma montanha única no Brasil.

    Trekking Mountaineering

    Observação: Tive a oportunidade de subir o Pico do Cabugi em duas ocasiões, a primeira em 23/01/2011 e outra em 28/01/2018. Sendo assim, não descrevo em detalhes cada ocasião, mas forneço uma descrição genérica.

    Cresci ouvindo que no Brasil não havia vulcões. Não tenho recordação de citação sobre o assunto nos meus livros de Geografia na infância e adolescência. Como era a disciplina de que mais gostava, acredito que eu poderia ter guardado na lembrança alguma informação. A situação não mudou muito até que passei a visitar o Rio Grande do Norte enquanto em férias universitárias, quando aproveitava para passar uns dias na casa de meu tio. Lá, no início dos anos 2000, ouvi falar de um vulcão no interior daquele estado.

    Seu nome: Cabugi. Em tupi-guarani significa “peito de moça”, possui 590 metros de altitude, está à beira da BR-304 e a cerca de 125 km de Natal, na principal rota de ligação com o Ceará. A rigor, a montanha está inserida no Parque Ecológico Pico do Cabugi, administrado pelo governo do estado do Rio Grande do Norte. Entretanto, até 2018, não havia estrutura de apoio ao visitante (*). Acredito que a sua peculiaridade poderia ser melhor explorada turisticamente. Não havia cobrança de ingresso, mas é válido deixar uma “caixinha” ao morador, que permite deixar o carro em sua propriedade e acessar a trilha pela mesma.

    O Cabugi passa a ser visto da BR-304 (sentido Natal - Cabugi) com vários quilômetros de antecedência à chegada em virtude da grande planície na região (foto: 2011).

    Aparentemente, há certa rivalidade entre os municípios de Lajes e Angicos pela correta localização do vulcão. Meu guia em ambas as situações, o Canindé, afirmou categoricamente que o Cabugi pertencia a Lajes. Cheguei a comprar uma camisa com o estampa do vulcão em 2011 com a inscrição de Lajes. Entretanto, as referências na internet afirmam em quase sua totalidade como pertencente a Angicos.

    Buscando mais informações, descobri que o Pico do Cabugi também está envolvido em uma teoria do descobrimento do Brasil distinta da tradicional (1). Segundo esta teoria, o Cabugi seria o verdadeiro Monte Pascoal. O pico teria sido avistado do oceano em janeiro de 1500. Em ambas as ocasiões em que estive no cume da montanha, não pude avistar o oceano. Honestamente, creio que o Cabugi está muito no interior para ter suas linhas nitidamente avistáveis do oceano, mas... teorias servem para serem comprovadas.

    É interessante considerar no planejamento começar o dia bem cedo, pois o calor aperta muito depois de dez da manhã. Para quem está em Natal, como no meu caso em ambas as ocasiões, a viagem dura cerca de três horas até um sítio à beira da estrada e onde é possível deixar o veículo para subir o pico. Cerca de quarenta minutos antes da chegada, já se avista a montanha da estrada.

    A trilha se inicia com uma subida suave, não diferindo das trilhas para outras montanhas. A vegetação é típica da caatinga, espinhosa e de porte arbustivo. Entretanto, à medida que se sobe, vamos avistando rochas basálticas com aspecto cada vez mais peculiar e isto torna o Pico do Cabugi diferenciado. Nitidamente, observa-se que a montanha teve uma formação diferenciada.

    Desde o início da trilha, o pico é completamente visível (foto: 2018).

    A trilha termina repentinamente em um incrível amontoado de rochas soltas, o que pode tornar a subida perigosa para quedas e rolamento de rochas sobre pessoas que vem atrás daquelas que eventualmente desalojam rochas ao pisar. Por isso, o ideal nunca é subir atacando a encosta, mas subindo com o grupo em fila indiana e mantendo uma inclinação com a encosta. Deste trecho até o cume não há um caminho bem definido e, na prática, a subida é feita espiralando a montanha para que eventuais rochas ao rolarem não atinjam ninguém. Já houve caso de morte por desmoronamento no local. Na minha primeira vez, uma pessoa do meu grupo resolveu descer de forma mais acelerada, errou uma passada e rolou alguns metros, resultando em vários cortes na perna e braços.

    Início da trilha. As primeiras rochas vulcânicas começam a aparecer (foto: 2011).

    A densidade de rochas aumenta à medida que se sobre (foto: 2011).

    Detalhe de uma rocha. Parece um cérebro? (foto: 2011).

    A subida é rápida, feita em cerca de uma hora e meia. O cume tem uma parte plana e comporta várias pessoas. A altura discreta do vulcão ainda assim faz com que o campo visual se amplie enormemente, pois o entorno é muito plano. Se você estiver com sorte, pode ver cortinas de chuva no horizonte como tive o privilégio na primeira ocasião.

    Caminhando em um mundo de rochas soltas (foto: 2011).

    Visão da subida. É impressionante a quantidade de rochas soltas que vamos deixando para trás, ou melhor, para baixo! (foto: 2018).

    Visão do cume com destaque para a BR-304 e a infinita planícia que cerca o pico (foto: 2011).

    Visão do cume com destaque para a cortina de chuva. O calor é intenso e a chuva é bem-vinda! (foto: 2011)

    Quando estiver no Rio Grande do Norte para conhecer as belas praias do estado, não se esqueça de que no interior também há grandes atrativos, inclusive o vulcão brasileiro mais representativo.

    Apenas para ilustrar, obviamente o escrito neste parágrafo carece de comprovação científica. É apenas uma observação, curioso que sou por Geografia e Geologia. Na época da Gondwana (o supercontinente que se originou da Pangeia) a parte do Rio Grande do Norte estava muito próxima da porção africana ocidental que contém um discreto cinturão de vulcões, sendo o principal, o Monte Camarões (4.095 metros de altitude). É aquele famoso encaixe entre América do Sul e África mostrado nos mapas que abordam as teorias da deriva continental e placas tectônicas. De acordo com a Enciclopédia Britannica (2), a separação entre ambos os continentes começou a ocorrer há 140 milhões de anos. Em um artigo da Universidade de Houston (3), é afirmado que o Monte Camarões começou a ser formado há 65 milhões, enquanto o Cabugi teria algo em torno de 25 milhões (4). Em termos do tempo geológico, as diferenças de tempo não são tão absurdas. Então, teriam sido o Cabugi e o Camarões irmãos de uma mesma geração, separados pelas forças da deriva continental, cada qual seguindo seu destino? Para completar, o próprio Cabugi não está tão isolado de primos vulcões se lembrarmos que, não muito longe dali, o Atol das Rocas, um conjunto de recifes no litoral do Rio Grande do Norte é, na verdade, o topo de um grande vulcão submarino. Os leitores que conhecem mais a respeito, sintam-se à vontade para rebater e trazer mais curiosidades ao assunto nos comentários. Se algo escrito for realmente refutável, eu edito. É uma oportunidade para troca de informações e curiosidades.

    Visão da descida, quando se percorre um pequeno trecho de trilha (foto: 2018).

    Visão da descida (foto: 2018).

    Já quase no fim da descida, avistei este tatu-peba (foto: 2018).

    No Brasil, ainda há vestígios de atividade vulcânica no Rio de Janeiro (Nova Iguaçu), na região sul, no sul de Minas Gerais e na Amazônia, este último, apontado como sendo possivelmente um dos mais antigos do planeta.

    Para finalizar, expresso aqui a indignação em ver pintadas nas rochas do Cabugi as iniciais (JA) do nome de um conhecido político do estado que, durante campanha eleitoral, permitiu tal poluição visual, sendo possível de ser vista por vários quilômetros da BR-304. Cada letra deve ter mais de 20 metros de comprimento. Nos sete anos de intervalo entre uma e outra ascensão, observei que a intensidade da pintura diminuiu, felizmente. Mas ainda é bem perceptível.

    Lamentavelmente, as letras são bem visíveis, como pode ser observado na foto em sua parte superior direita (foto: 2011).

    (*) Ao elaborar este relato, observei manchetes na internet em 2018 de que o Instituto de Desenvolvimento Sustentável e Meio Ambiente (IDEMA), o órgão ambiental estadual do Rio Grande do Norte, estaria procurando instalar um ecoposto para melhor a estrutura ao visitante. Mas desconheço se o assunto evoluiu.

    Referências (todos os acessos foram feitos em 30/10/2021):

    1 - https://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/efe/2018/05/13/cabuji-o-vulcao-extinto-que-pode-ter-sido-o-ponto-de-descoberta-do-brasil.htm

    2 - https://www.britannica.com/place/Gondwana-supercontinent

    3 - https://www.jstor.org/stable/10.1086/319977

    4 - http://geoturismobrasil.com/artigos/Geoturismo%20no%20Pico%20Cabugi.pdf

    Marcelo Lemos
    Marcelo Lemos

    Published on 10/31/2021 09:54

    Performed from 01/23/2011 to 01/28/2018

    Views

    2000

    14 Comments
    Marcelo Lemos 10/31/2021 18:43

    Amigaço, obrigado. Uma pena eu morar tão distante. Seria frequentador assíduo do local.

    Aline de Castro Santos 11/02/2021 22:39

    Marcelo... Espetáculo de relato. Obrigada por nos passar tantos conhecimentos. Amei!

    Marcelo Lemos 11/02/2021 23:32

    Oi Aline. Obrigado por seu comentário sempre motivador. Já estou ficando mal acostumado!!! Rsrs

    Aline de Castro Santos 11/03/2021 14:03

    Eu que agradeço! Que Deus lhe abençoe infinitamente!

    Marcelo Lemos 11/03/2021 14:06

    A todos nós. Abração.

    Márcia Silva 11/23/2021 15:32

    Uau, não conheço o lugar. Bem completo seu relato, obrigada! Vou me programar pra ir.

    Marcelo Lemos 11/23/2021 18:33

    Tenho certeza de que você vai gostar. Márcia. O local é diferenciado. Boas aventuras e obrigado pelo comentário!

    André Deberdt 10/14/2022 18:27

    Muito bom o relato, Marcelo! Aguçou minha curiosidade. Não conhecia nada a respeito deste vulcão.

    1
    Marcelo Lemos 10/15/2022 09:45

    Muito obrigado pelo comentário, André. Alcancei o objetivo quando escrevi no subtítulo que o relato era para despertar a curiosidade do aventureiro. Quando tiver oportunidade, apareça por lá. E aqui em Petrópolis/RJ para uma trilha também!!! Um abraço.

    1
    Marcelo Lemos

    Marcelo Lemos

    Petrópolis-RJ

    Rox
    663
    Adventures Map