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Priscila Matias 18/09/2019 16:53
    Planejando o Tour du Mont Blanc (TMB)

    Planejando o Tour du Mont Blanc (TMB)

    Impressões, dicas e notas sobre o planejamento do Tour du Mont Blanc

    Trekking Montanhismo

    Esse não pretende ser um relato aprofundado sobre as etapas do Tour de Mont Blanc, visto que o Wilson Iwazawa (aqui no AventureBox) e o Paulo Miranda em seu blog (https://www.paulomiranda.com/tour-du-mont-blanc/projeto/) já fizeram isso com excelência, no nosso idioma. O propósito aqui é compartilhar dicas, impressões e minha (pequena) experiência sobre o planejamento desse projeto, e quem sabe ajudar quem está planejando fazer o seu TMB. Este post é complementado pelo relato sobre o dia a dia do trekking aqui: https://aventurebox.com/priscila-matias/trilhando-o-tour-du-mont-blanc-tmb-2019/report

    Minha intenção, quando decidi fazer o Tour de Mont Blanc três anos atrás, era ir sozinha e por conta própria, já que a navegação, segundo dezenas de relatos na internet, não era complicada. Porém, tive que mudar todos os meus planos quando minha mãe - que é corredora amadora e ocasionalmente tbm sobe montanhas - ficou louca pelas fotos dos Alpes e decidiu que queria ir junto. Minha mãe tem um problema, que é mais psicológico do que realmente físico, com carregar mochila "pesada", então eu vi que não poderia fazer o TMB de forma independente, porque não seria possível para ela carregar sua própria cargueira (mesmo que leve pela ausência dos grandes pesos - barraca, saco de dormir e comida). Também considerei que dez dias de trilha seriam muito pesados para ela, que tem pouca experiência em travessias de vários dias, então tive que dar adeus ao plano de fazer o tour todo, os 360 graus ao redor do Mont Blanc, para minha tristeza.... Essa primeira parte do planejamento foi muito complicada, porque essas eram condicionantes importantes pra viagem, as quais não tinha previsto antes dela se juntar ao projeto. Mas fico feliz por ter cedido em aspectos que considerava muito importantes pra mim para que minha mãe pudesse participar tbm, já que essa acabou sendo uma experiência de grande superação para ela, que finalizou o projeto com muito orgulho de si mesma e ciente de que muitos limites pessoais são auto impostos.

    Antes de decidir que teria que contratar uma agência e fazer o Tour de forma guiada - seria mais prático e confortável para minha mãe - ainda tentei ver se conseguiria um carregamento de mochila como serviço extra independente. Para quem está pensando nessa possibilidade, existem três empresas conhecidas que realizam o serviço: a Taxi Montblanc (https://www.taxi-montblanc.com/), Montblanc Bags (https://www.montblancbags.com/) e a Chamonix Valley Transfers (https://www.chamonix-valley-transfers.co.uk/). Essas empresas pegam sua bagagem na sua hospedagem pela manhã e a transportam para a sua próxima hospedagem, que estará disponivel quando vc chegar lá no final da tarde - logo, é necessário já estar com todo o roteiro pronto e com as hospedagens definidas quando entrar em contato com a empresa. Ambas devem ser agendadas com antecedência, porque esse tipo de serviço é bem requisitado por lá. Acabei desistindo dessa possibilidade porque, devido à problemas de logística, a grande maioria dos refúgios de montanha não pode ser acessado por carro e, portanto, não estão disponíveis para o transporte de bagagem. Paralelo a isso, também vacilei em começar a procurar por reserva de refúgios com menos de dois meses de antecedência, pensando que estaria tudo ok por setembro não ser tão cheio quanto nos meses de pico - julho e agosto, e acabei dando com os burros n'água; os refúgios de montanha famosos como o Bonatti e o Elena já estavam cheios (culpa das agências), e nem respondiam mais aos emails. Então a primeira dica do dia é: se decidir fazer o TMB de forma independente, POR FAVOR RESERVE LOGO OS REFÚGIOS, porque de outra forma você poderá ser obrigado a mudar seus planos totalmente. Tem gente que arrisca, não reserva nada, e vai com a cara e a coragem - pode dar certo (na maioria das vezes), ou vc pode ser obrigado a caminhar, já em estado de queria estar morto, por vários quilômetros adicionais até o próximo refúgio; se torna pior o fato de que existem etapas em que praticamente não existe alternativa de hospedagem próxima, de forma que se aquele refúgio estiver cheio, você realmente estará com problema. Nos meses mais movimentados do TMB, que são julho e agosto, é altamente recomendado que você tenha tudo reservado antes de começar o trekking.

    Então, sabendo que refúgios-chave do meu roteiro já estavam cheios, e o serviço independente de transporte de bagagem não abrange 100% do trekking como eu precisava para a minha mãe, tive que dar o braço a torcer e ir atrás de agências de guia para TMB, coisa que eu não queria fazer de jeito nenhum. Existem duas formas de fazer o TMB por empresa: auto-guiada (bem mais barato) e a guiada. Na guiada - a que escolhi - geralmente o serviço de carregamento de bagagem já está incluso no preço, porém é bom você prestar atenção pois cada empresa tem uma política, e em muitas delas existe pelo menos um dia do tour em que não será possivel o transporte da bagagem por motivo de logística. É sempre bom ler a descrição dos serviços com atenção e, na dúvida, mande e-mails (fiz muito isso). Após muita pesquisa, acabei reduzindo as opções de agência para as duas que poderia pagar: a Cairn (www.cairntrekking.co.uk) e a Altitude Monblanc (altitude-montblanc.com). Da Cairn eu tinha referência de brasileiros que já tinham feito o TMB com eles e recomendaram; já a Altitude Monblanc era uma completa icógnita, não tinha referência praticamente nenhuma (fora uma avaliação negativa no TripAdvidor). Entrei em contato com as duas, fiz muitas perguntas, analisei bem o roteiro e a prestação de serviços e, mesmo com o coração na mão devido à falta de referência, decidi fechar com a Altitude Montblanc devido à rapidez nas respostas aos meus emails, clareza nas respostas e site bastante organizado e informativo, que me deu mais confiança. Escolhi o roteiro de sete dias, que é feito no sentido horário - a grande maioria das pessoas que fazem o TMB escolhem o sentido anti-horário, de longe o mais popular, então estaríamos no contrafluxo das massas (se bem que em setembro nem tem multidão, achei bem tranquilo). Esse roteiro possui carregamento de mochila em todas as etapas, que era condição absoluta e necessária para a minha mãe poder participar. Infelizmente somente dormiríamos em um refúgio de montanha roots nesse roteiro, que foi o Refúgio Mottets, o único que, apesar de estar no meio do nada, é acessível por carro (e, portanto, não constitui impecilho logístico para o transporte das bagagens). Se você quizer fazer o TMB por agência, mas faz questão de dormir na maior quantidade de refúgios de montanha tradicionais, então é melhor você fechar com a Cairn, pois ela possui um diferencial que nenhuma outra agência possui (pelo o que eu saiba): as mochilas em determinados trechos são carregadas por mulas - inclusive cheguei a ver no primeiro dia a mulinha da Cairn levando as bagagens da galera lá no Col de Balme -, então eles conseguem entregar a bagagem em refúgios de montanha que não são acessíveis por carro. Os valores para o trekking guiado de 7 dias são praticamente os mesmos nas duas empresas, e são MUITO mais em conta do que todas as outras empresas que consultei. Ambas são agências francesas, com guias franceses e clientes falantes de francês, e eu explico um pouco melhor sobre o impacto disso no meu trekking na parte do relato do TMB propriamente dito, que farei em um post separado. Para se comunicar nos refúgios, basta o inglês, o básico todo mundo sabe.

    Ainda sobre o tema bagagem - estou me extendendo bem nesse assunto porque sei que muita gente, principalmente mais velha, tem problemas de coluna e não conseguiria fazer um trekking de montanha sem essa ajuda - é importante levar o minimo possível, porque o desnivel do terreno é brutal e fica completamente inviável para a grande maioria de nós fazer o TMB com mais de 10 quilos nas costas. Para quem for fazer o TMB de forma independente e levando sua propria bagagem, aconselho FORTEMENTE reservar o mesmo hotel/albergue para o começo e final da trilha, assim você pode deixar no hotel para pegar depois (eles são acostumados com isso) a parte da sua bagagem que você não irá precisar usar na trilha - exemplo: roupa suja, outras roupas e artigos de higiene/beleza (especialmente se vc pretende aproveitar a ida para a Europa para fazer outros rolês na região, então vai precisar levar mais roupa social). Se por algum acaso de Deus você não conseguir reservar o mesmo hotel, existem duas opções - pagas - de depósito de babagem na cidade de Chamonix, uma no hotel Gite de Chamoniard (https://www.chamonet.com/hotels/gite-le-chamoniard-main-town-702037), que é um pouco afastado do centro e cobra entre 4 e 6 euros/dia/bagagem, e a Tabacaria Absolut Cafe, do lado da estação de trem, que cobra 40 euros/bagagem para 10 dias. Não utilizei esses serviços, são informações que pequei na internet antes de decidir pela contratação de agência, e portanto não posso dizer se estão atualizadas. Não existe guarda volume nas estações de ônibus e trem de Chamonix.

    Para a galera que é muito guerreira, tem músculos/coluna de aço e tá com pouco dinheiro, existe a opção de fazer o TMB acampando, conheço esse site (que consultei para obter outras info) que possui um guia para download sobre o assunto: https://tmbtent.com/guide-camping-tour-mont-blanc/ . Como não tinha intenção nenhuma de levar comida, barraca, isolante termico, saco de dormir pra frio e cozinha no lombo para caminhar em desniveis diarios de quase 1000m (isso só de subida) por uma semana, essa foi uma opção que nunca cruzou a minha cabeça, mas para quem tem condições físicas é a única forma "baratinha" de fazer o TMB - e acampar é sempre muito massa. Durante o trekking, somente notei campistas em duas ocasiões: no primeiro dia, me aproximando de Trient (vindo de Le Tour), e na saída do Refúgio Mottets. Com relação à comida, dá para ir abastecendo nas principais cidades do TMB, como Courmayeur e Champex, não precisa carregar comida para muitos dias de uma só vez.

    Para chegar a Chamonix, existem três opções de aeroportos internacionais: Genebra (Suiça), Paris (França) e Milão (Itália). O mais perto é o aeroporto de Genebra, a viagem entre as cidades leva cerca de 2h00 de Chamonix, e existem transfers que saem direto do aeroporto para a cidade, sendo então mais conveniente também (ver no final o UPDATE sobre custos para mais informações) - foi a minha opção. Só vale a pena chegar pelos aeroportos de Milão ou Paris se o valor da passagem aérea compensar muito financeiramente, porque o transfer entre as cidades não é direto, e leva mais que o dobro do tempo. De Milão para Chamonix, dá pra ir de ônibus pela http://www.savda.it/, comprando passagem para Courmayeur, e de lá pegar um ônibus para Chamonix na rodoviária local (o Wilson fez isso). Já a partir Paris, o percurso é mais longo e complicado, e envolve várias mudanças de trem, parece ser muito cansativo. Ainda sobre passagem aérea, essa só deve ser comprada quando você terminar de reservar todos os refúgios/hospedagem do trekking (no caso de ir de forma independente) e no caso de ir por agência, quando comprar o pacote com as datas certinho; se comprar a passagem primeiro, existe o perigo de não conseguir vaga em um ou mais refúgios durante aquele período que você tinha planejado inicialmente (ou no caso de agência, que a turma tenha fechado, ou não se confirmado), o que pode inviabilizar toda a viagem (quase que isso aconteceu comigo, então não vacilem).

    Aproveitando que estamos falando de Chamonix, para quem precisar comprar chip Sim Card para funcionar durante todo o TMB, isto é, em três países diferentes, escolha o chip da Orange, que você pode comprar em uma Tabacaria em frente ao Teleférico Aiguille du Midi - a funcionária fala inglês e é muito prestativa, me ajudou a ativar o chip (as instruções faladas são em francês). Você também pode comprar qualquer equipamento que eventualmente faltar para o trekking no centro de Chamonix, que tem um milhão de lojas esportivas, algumas delas marcas proprias (tipo Salomon) e outras multimarcas, como a Intersport e a Decathlon. Mesmo pagando em euro, tem coisa que fica mais barata do que pagar pelo preço do produto sem promoção no Brasil, fora a variedade de produtos, que é monstruosa. Já no final do trekking (ainda bem), a botinha véia de guerra Timberland da minha mãe abriu o bico e como ficamos mais dois dias em Chamonix ao final do TMB, acabamos comprando pra ela uma bota nova do cacete da Salomon, em promoção pelo preço de uma bota nacional, valeu a pena demais.

    Sobre qual sentido do TMB escolher - bom, não tive poder de escolha quanto a isso, porque a opção de trekking de sete dias oferecida pelas agências é sempre no sentido horário, mas se pudesse teria escolhido a anti-horário mesmo, considerando que escolhi setembro, que é um mês mais tranquilo de se trilhar o TMB, então não teria problema com excesso de pessoas na trilha. Ao fazer o sentido horário, você segue no contrafluxo, o que pode ser BEM interessante nos meses de pico - final de julho e agosto, para evitar a multidão. A coisa "ruim" de se fazer o sentido horário é que praticamente todo o resto do pessoal estará fazendo o sentido contrário, então as pessoas que vc encontra pela trilha não serão mais encontradas pelo resto do trekking. Encontramos com brasileiros em duas situações durante o TMB: um carioca no começo do segundo dia, ainda no hotel em Trient, se preparando para sair; e gaúchos - parecia uma família, bem animados - descansando na Casermatta (quinto dia), ambos fazendo o sentido anti horário, portanto contrário ao nosso... Fazer o TMB no sentido horário é garantia de encontrar sempre pessoas diferentes todos os dias, isso pode ser bom ou ruim pra você. Quanto ao esforço físico e a beleza da paisagem, os livros-guia tendem a dizer que não existe diferença entre os sentidos; cheguei a ler em um blog que o sentido horário (o que fizemos) tem subidas mais "suaves" e descidas mais ingremes, e no sentido anti horário (o mais popular) seria o contrário. Posso confirmar essa versão de descidas mais ingremes no sentido horário - os ultimos dois dias (do Refugio Mottets até o final em Le Houches) destruiram os meus joelhos. Independente de que sentido você escolher, recomendo DEMAIS ao planejar sua rota tirar pelo menos um dia de descanso em Courmayeur, especialmente se tiver fazendo o sentido anti-horário, no qual os três primeiros dias são bem pesados em termos de subida. Em Courmayeur você vai poder descansar em uma cidade muito linda, rodeada por montanhas, de boa estrutura, com lavanderia self service (cheia de trilheiros hehe), e dará a pausa que seu corpo precisa e acredite, fará uma diferença gigantesca nos próximos dias.

    Fiz questão de fazer o TMB em setembro porque para mim seria a melhor combinação possível de clima e quantidade de gente na trilha. Setembro é considerado um mês mais seco, a temperatura é agradável - mais para frio que calor -, a possibilidade de ter grandes tempestades ou nevar é bem menor, e o fluxo de gente é tranquilo. Em Junho ainda existe muita neve na trilha, o que torna o terreno perigoso e a navegação mais tensa (ver o relato do Wilson aqui no Aventurebox); a primeira metade de Julho tbm é um bom custo benefício, desde que aquele ano não tenha nevado muito - do contrário, ainda haverá neve no percurso, coisa que queria evitar ao máximo. Final de Julho e todo o mês de Agosto é tenso, muito calor, com maior possibilidade de tempestades, muita gente na trilha, e refugios lotados. Uma coisa que não gosto e afeta profundamente minha performance em montanha é caminhar no calor, então minha prioridade era escolher uma época que fosse fresca para andar, mas sem neve - tinha que ser Setembro. Infelizmente, pegamos chuva (leve, nada de tempestade) em três dos sete dias de TMB, dois desses dias não afetaram muito porque o percurso era chato e sem atrativos mesmo, porém o trecho entre o Refúgio Mottets e Les Contamines foi um percurso que parecia ser belíssimo, mas foi feito todo sem visibilidade devido à pesada neblina, com um trecho particular de chuva mais chata (mas ainda leve), e logo na hora do almoço... foi a única perda real e sentida de visibilidade de percurso devido ao clima.

    Ainda sobre condições climáticas, ao fazer o TMB de forma independente, é ESSENCIAL ter todas as rotas opcionais de fuga em mãos em caso do dia prever tempo muito ruim com tempestade. Isso é algo que não pode ser negligenciado, especialmente se pretende fazer em Agosto, mês com maior possibilidade de tempestades. Se o tempo tiver muito ruim, é possível que você realmente tenha que abandonar a trilha ou parte da trilha e seguir por estrada/ pegar transporte publico, portanto esse tipo de informação tem que estar disponível com antecedência. Nas minhas primeiras pesquisas, achei um site MARAVILHOSO de uma mulher que fez parte do TMB - de Le Houches até Courmayeur - com a filha pequena e a mãe, ela copilou um monte de informações massa sobre esse roteiro, incluindo rotas por transporte local em caso de emergência/necessidade - até porque fazer um trekking de montanha com criança pequena requer um cuidado maior com planejamento. O link para o site está aqui: https://www.thefamilyfreestylers.com/self-guided-tour-du-mont-blanc-guide-with-kids/. Nas minhas pesquisas pela internet, tbm me deparei com um site que oferecia o serviço de planejar toda a rota em formato de tracklog para você, incluindo os possiveis desvios, lugares para pegar transporte publico, pontos de agua, etc, é algo bem interessante para quem quer fazer o TMB de forma independente mas pode não ter o tempo ou paciência e habilidade para planejar em minimos detalhes: https://www.tourdumontblanc.club/get-started

    Além do site acima, consultei os seguintes materiais para fazer o TMB: o livro do Elias Luiz (recomendo), o guia (em inglês) do Kev Reynolds, comprado em formato ePUB, e muitos, muitos blogs; para acessar a lista de refúgios e hospedagem consultei o site http://www.autourdumontblanc.com/en/ - mas ATENÇÃO! Tem muita hospedagem estilo B&B nas cidades que não está listada nesse site. Para navegação, baixei o aplicativo Gaia GPS, baixei os mapas offline da região (a camada Outdoors possui o caminho principal do TMB já marcado), e se você comprar a versão super premium do app poderá baixar ainda os mapas IGN Topo da França e da Suiça. Também baixei um tracklog do TMB que consegui em um blog: https://drive.google.com/file/d/12WM8prICL0sMix5R-7943_aMnFjGDEkS/view?usp=drivesdk

    Com relação à navegação, não posso dar muita contribuição com relação ao tema porque o meu grupo guiado frequentemente seguia por caminhos fora do caminho principal do TMB, o que garantia para a gente uma exclusividade de trilha e de cenário; falo mais sobre isso no breve relato que publicarei depois sobre o dia a dia no TMB. Mas nos dias em que seguimos o caminho principal, achei que seria meio dificil de se perder porque tem sempre gente na trilha; a exceção ficou no dia seis (entre Refugio Mottets e Les Contamines), em que choveu e baixou uma neblina pesada que dificultou demais a visibilidade de tudo (mas ainda sim dava para ver, com dificuldade, o caminho marcado na terra).

    Como tenho um porte fisico muito pequeno, sou adepta, por necessidade, do trekking light (ultralight é muito caro e não cabe no meu bolso :-( e mesmo tendo um serviço de transporte de bagagem incluido nos meus custos pela agência, quis manter a mesma filosofia de levar apenas e apenas o imprescendivel para o trekking, com adição das roupas e outros produtos que seriam necessários para a parte turistica da viagem - depois do TMB ainda fiquei mais sete dias viajando pela França e Suiça. Para a parte do trekking, levei exatamente as mesmas coisas que levaria se tivesse que carregar a minha própria mochila cargueira. Ao fazer o TMB dormindo em refúgios com meia pensão, você pode enxugar bastante o peso da sua mochila, essa é uma grande vantagem do tour, dá para fazer o percurso de forma leve. Para se ter uma idéia, usei a mesma camisa UV manga longa da Lupo (muito boa, recomendo) em todos os sete dias de trilha, e somente tive que lavá-la uma vez, no final do dia três - isso porque abriu um solzão bonito que queria aproveitar, se continuasse nublado como nos outros dias acho que nem teria lavado, ela ainda estava digna. O que levei para o TMB: duas camisetas UV manga longa (uma delas nem cheguei a usar), uma calça legging para trail run (a que usei nos sete dias de trilha), uma calça UV de compressão (como calça de trilha reserva, usei nos hoteis/refugios), duas camisas UV manga curta para usar nos refugios (somente usei uma), um conjunto segunda pele frio intenso (somente precisei usar no Refugio Mottets, que tava MUITO frio), um casaco fleece fino (usei bastante pela manha), uma jaqueta de pena de ganso (para usar nos refugios mais frios), uma calça impermeável super leve, uma jaqueta impermeável superleve (muito fina, não deu conta como corta vento em alguns trechos, acho que hj levaria um anoraque mais parrudo), três tops de ginástica, três meias de trekking, calcinhas descartáveis (otima decisão, já que praticamente não consegui lavar roupa devido às condições climáticas), gorro, luva (nota: preciso comprar luva impermeável, fez muita falta nos dias com chuva e frio), bandana tubular, meia grossa para frio (nao precisei usar), liner para saco de dormir, toalha ultralight, reservatorio para água, sandália leve da crocs, bota de trilha, óculos de sol, viseira, produtos de higiene (em embalagens plasticas pequenas), kit de primeiros socorros, kit de emergencia (um pouco de silver tape, cobertor de emergencia, barbante, pregador de roupa, linha e agulha, bussola, canivete pequeno, SpotGen3), eletronicos (lanterna de cabeça, powerbank, celular, carregador de celular), carteira + passaporte, sacos estanque, capa de mochila, repositor hídrico efervescente, Clorin, barras de proteinas e géis de carboidrato, conjunto de prato, talher e copo plasticos para comer o lanche de trilha.... Não senti falta de nada, exceto da luva impermeavel.

    Para finalizar, escolhi como seguro viagem a World Nomads, devido à natureza da viagem - ela cobre trekkings em montanha desde que abaixo de 6000m. Infelizmente nenhuma seguradora no Brasil cobre os custos de busca e salvamento em montanha, e inclusive está explicito no contrato da World Nomads. Logo, se por um grande azar, você precisar ser resgatado de helicóptero devido a algum acidente sério, os custos do resgate - que são altissimos, podendo chegar a 10 mil euros ou mais - deverão ser bancados por você, a menos que contrate uma outra solução para isso. A Altitude Montblanc, agência que contratei para organizar o trekking, possui um seguro opcional que vc pode adquirir ao comprar o pacote de serviços, e cobre até quase 4 mil euros em custos de resgate. Se você fizer o TMB por conta propria e quer se proteger contra eventual custo de busca e resgate, praticamente só existem duas opções: a Global Rescue, que é bem cara, ou se você tiver um plano SpotGen ativo (meu caso) pode contratar o GEOS resgate por um valor bem camarada - para mim e minha mãe ficou 36 dólares total o plano anual, que cobre até 100 mil dólares cada uma em custos de salvamento. Sei que a maioria está cagando e andando para esse tipo de coisa, mas acredito que acidentes podem acontecer com qualquer um, independente da idade e condicionamento físico, e não gosto de contar com a sorte.

    UPDATE: Faltou um tópico sobre a parte do condicionamente físico. Não se engane com relatos que dizem que o TMB é um trekking "moderado" - é verdade que não é um trekking técnico, mas o desgate físico pode ser desafiador, mesmo se tendo um bom condicionamento físico e força muscular. A verdade verdadeira é que só se treina para a montanha subindo montanha; o problema é que muitos de nós não mora perto de lugares bons para treino (eu aqui), então para esses casos específicos você vai ter que investir em um treino diferenciado que envolva muita subida (lembre-se: serão dez dias com subidas diárias de 1000m em média) e, na parte final, treinar também levando a sua mochila (obrigatório se for fazer de modo autônomo). Nesse site tem uma sugestão de programa geral de treinamento de seis meses, que achei bem bom e com certeza será o meu treino para o próximo trekking nos Alpes: https://tmbtent.com/get-shape-tour-mont-blanc/

    UPDATE 2 - CUSTOS

    O valor da guiada depende do que você vai contratar. Você pode consultar no site da Altitude Montblanc e da Cairn, os preços variam muito de acordo com o nivel de comodidade que se deseja: auto-guiada ou com guia, com ou sem carregamento de mochila, dormida em alojamento ou em quarto privado, se vai fazer o tour todo ou parte dele, etc. Se for por conta própria sai mais barato, em torno de 60 euros meia pensão (dormida em alojamento + café da manha muito simples + jantar), e o lanche de trilha você pode comprar em mercadinhos, ou nos próprios refúgios se vende um lunch box por 10 euros. Hospedagem em Chamonix (antes e depois do tour) é bem caro, você pode escolher ficar em cidades vizinhas, eu fiquei em Argentiere antes do tour e em La Houches quando finalizei, recomendo muito o hotel que fiquei em La Houches (chama-se RockyPop Hotel), é excelente e bem pertinho de um supermercado, a diária se não me engano ficou em 50 dólares para quarto duplo, em promoção (preço normal é 75 dólares).

    Passagem pra Genebra foi o que mais me deu dor de cabeça, perdi uma promoção da TAP por relapso (trecho Recife-Genebra por 2650 reais sem bagagem) e por causa disso eu quase fiquei sem poder ir, o preço aumentou horrores, quase 7 mil reais.... tive que fazer muito malabarismo com datas e comprar os trechos de forma independente, mas no final consegui comprar por 3400 reais. Recomendo usar Google Flights e pesquisar todo dia (usar guia no modo anônimo, muito importante), não vacile quando ver promoção, compre na mesma hora. De Genebra pra Chamonix eu usei o transfer da Swisstours (https://stts.tripbooker.ch/EN), que sai direto do aeroporto, custou na época 10 euros, era o mais barato, e foi pontual. Para voltar, precisei de um horário diferenciado bem cedo, aí eu tive que contratar a Alpy Bus (https://alpybus.com), era mais cara - 28 euros, mas eles te pegam no hotel e tem vários horários, também muito pontual. Como pode-se ver, é uma viagem cara, só dá para baratear se você acampar.

    APÊNDICE

    PARA QUEM QUER FAZER O TMB POR CONTA PRÓPRIA:

    Se você quiser fazer o TMB por conta própria, eu tenho algumas dicas que eu acho bem importantes. Era o que eu deveria ter feito desde o começo:

    1) O ideal é começar a fazer as reservas no começo do ano (janeiro ou fevereiro); alguns refúgios muito concorridos (exemplo: refúgio Elisabetta; refúgios da cidade de Les Chapieux) esgotam em poucos dias após abertas as reservas. As vezes esses refúgios são a única opção em muitos quilômetros de percurso, então se você não conseguir reserva, vai ter que re-arrumar todo seu planejamento. Está avisado.

    2) Primeiro, você deve planejar como vai dividir as etapas do trekking. Tudo deve começar a partir disso: definir o sentido (anti-horário ou horário) e o número de dias (geralmente leva de 9 a 13 dias a volta completa), em média quantos km e/ou horas você acha confortável andar. Claro que para fazer isso, se deve ter uma boa noção de como é o percurso em si, e para isso tem os guias do Elias e do Kev Reynolds, que devem ser lidos antes de tudo. Esse planejamento inicial é extremamente importante, especialmente no início do percurso (no caso do sentido anti-horário, que é o mais popular) no qual existem algumas opções alternativas que a pessoa pode tomar, como exemplo: pular a primeira etapa e começar o TMB em Les Contamines (eu soube que algumas pessoas fazem isso, porque esse primeiro dia é muito exaustivo e não tem muitos atrativos); decidir entre dividir a segunda etapa, que é a mais puxada fisicamente, em duas, pernoitando no Refuge de La Croix du Bonhomme, ou seguir direto de Les Contamines para Les Chapieux... enfim, quem vai traçar a rota é você, baseado no tempo que tem disponível para completar o TMB e qual é o nível de dificuldade que está disposto a aguentar; se quiser fazer etapas mais curtas, consequentemente vai levar mais dias para finalizar o trekking e precisará reservar mais hospedagem. Além dos livros citados acima, uma opção que eu achei que vale mais a pena é pagar pelo planejamento da rota no site https://www.tourdumontblanc.club/get-started

    3) Com esse primeiro planejamento em mente, acesse o site http://www.autourdumontblanc.com/en/ e verifique em quais localidades existem refúgios/hospedagem que podem ser reservados online – nesse caso, dá para ver em tempo real quais hospedagens tem vaga disponível nos dias mostrados. Ainda não faça reserva (para a qual se paga antecipadamente um depósito), apenas verifique se existe vaga para os dias que vc precisará. Existem alguns refúgios de montanha que estão listados como acomodação, mas não estão nesse sistema online, inclusive os mais concorridos estão nessa situação... para esses, vc vai precisar mandar um e-mail para fazer a reserva. Se eles não retornarem em até três dias, envie outro e-mail. Se não obter resposta, é provável que já estejam cheios, e nem se dêem ao trabalho de responder mais aos e-mails.... se demorar muito, pode ser que aqueles refúgios com reserva online, com vaga disponível, lotem de um dia para outro, e você fique sem conseguir reserva com eles também... está entendendo porque eu disse que não era para reservar os outros refúgios online que tem vaga antes de verificar isso? O gargalo da história são esses refúgios de montanha que não possuem sistema de reserva online, no qual você vai ter que mandar e-mail para saber se terá hospedagem ou não. No caso de não conseguir, terá que refazer todo o seu planejamento de dias e etapas percorridos, porque em alguns casos aquele refúgio é a única hospedagem disponível em muitos km.... olha, não é fácil. Não é à toa que a maioria está optando por contratar as agências para fazer pelo menos o auto-guiado, no qual você não terá nenhuma dessas preocupações porque a agência reserva tudo para você (e também são responsáveis por reservar as vagas dos refúgios com meses de antecedência, o que meio que obriga a pessoa a contratar seus serviços). A crescente popularidade do TMB faz com que a hospedagem seja um tópico muito chato e estressante. Se vc realmente não quer ter que passar por todo esse stress e ainda sim ir por conta própria, recomendo que faça como o Wilson e comece o tour na última semana de junho, quando ainda tem neve no percurso (dificultando a navegação e o percurso em si, não recomendado para pouco experientes em montanhismo, esteja avisado) mas em contrapartida dá para ir sem fazer reserva com antecedência, porque não tem tanta gente (ainda) fazendo o trekking (ATENÇÃO: verificar quais hospedagens estão em funcionamento antes de tudo, algumas só abrem em julho). Não sei até quando isso vai se manter, porém...

    4) Tudo o que estou escrevendo no item 3 aconteceu comigo, com uma antecedência de dois meses da data que pretendia fazer o TMB. Então, tive que recorrer à agencia de guia porque em vários refúgios as datas já estavam lotadas.

    5) O melhor site disparado para consultar se for por conta própria é o: https://www.thefamilyfreestylers.com/self-guided-tour-du-mont-blanc-guide-with-kids/#guide_self_guided . Muitas dicas importantes.

    6) Apesar de dar muito mais trabalho e exigir planejamento quase espartano, se eu pudesse fazer o TMB de novo, eu faria por conta própria sim, só que do jeito certo, reservando os refúgios logo no começo do ano. Então se vc achou isso tudo muito complicado, não desista logo de cara, a liberdade de planejar a sua rota, no seu tempo, do jeito que vc quer, paga no final.

    É isso pessoal, espero que algo aqui possa servir como ajuda ou guia para quem pretende fazer esse trekking tão maravilhoso e sofrido..

    Priscila Matias
    Priscila Matias

    Publicado em 18/09/2019 16:53

    Realizada de 01/09/2019 até 07/09/2019

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    10 Comentários

    Sensacional esse texto Priscila!! Muito obrigado por tanto empenho nas dicas e por tantos detalhes importantes!! Pretendo fazer em junho deste ano! Vai dar certo!

    Priscila Matias 29/01/2020 19:25

    De nada Henrique! Se precisar de alguma ajuda, entra em contato. Eu vi que vc perguntou sobre agência para tour autoguiado no tópico do Wilson, as duas agências que menciono aqui - a Cairn e a Altitude Montblanc - ambas tbm possuem o tour autoguiado (com ou sem carregamento de mochila), e são equivalentes em preço e qualidade. Estou a disposição, se precisar é só chamar. E capricha nos treinos pra não sofrer tanto rs!

    Luis Henrique Migot 07/02/2020 12:03

    Gostei muito do seu relato também, estou me preparando para fazer esta viagem... Poderia me passar informações sobre valores? Não sei se pode ser tratado este assunto financeiro por aqui... De qualquer forma, show um rolê frenético e fiquei com mais vontade de faze-lo após ver fotos e ler suas experiências. Aguardo sua resposta, obrigado!

    Priscila Matias 07/02/2020 15:27

    Oi Luis, o valor da guiada depende do que vc vai contratar. Vc pode consultar no site da Altitude Montblanc, os preços variam muito de acordo com o nivel de comodidade que vc quer: com ou sem carregamento de mochila, dormida em alojamento ou em quarto privado, se vai fazer o tour todo ou parte dele, etc. Se vc for por conta propria sai mais barato, em torno de 60 euros meia pensao (dormida em alojamento + cafe da manha muito simples + jantar), e o lanche de trilha vc pode comprar em mercadinhos, ou nos proprios refugios se vende um lunch box por 10 euros. Hospedagem em Chamonix (antes e depois do tour) é bem caro, vc pode escolher ficar em cidades vizinhas, eu fiquei em Argentiere antes do tour e em La Houches quando finalizei, recomendo muito o hotel que fiquei em La Houches (chama-se RockyPop Hotel), é excelente e bem pertinho de um supermercado, a diaria se nao me engano ficou em 50 dolares para quarto duplo, em promocao (preço normal é 75 dolares).

    Priscila Matias 07/02/2020 15:36

    Passagem pra Genebra foi o que mais me deu dor de cabeça, perdi uma promoção da TAP por relapso (trecho Recife-Genebra por 2650 reais sem bagagem) e por causa disso eu quase fiquei sem poder ir, o preço aumentou horrores, quase 7 mil reais.... tive que fazer muito malabarismo com datas e comprar os trechos de forma independente, mas no final consegui comprar por 3400 reais. Recomendo usar Google Flights e pesquisar todo dia (usar guia no modo anonimo, muito importante), nao vacile quando ver promoçao, compre na mesma hora. De Genebra pra Chamonix eu usei o transfer da Swisstours, custou 10 euros, é o mais barato, e foi pontual. Pra voltar precisei de um horario diferenciado bem cedo, ai eu tive que contratar a Alpy Bus, é mais cara - 28 euros, mas eles te pegam no hotel e tem varios horários, tbm muito pontual. Como vc vê é uma viagem cara, só dá pra baratear se vc acampar.

    Priscila Matias 07/02/2020 15:38

    Foi atualizar depois esse post com a parte financeira, foi uma excelente sugestão sua.

    Luis Henrique Migot 11/02/2020 18:54

    Já entrei nos sites: https://www.altitude-montblanc.com/gb/ tem um roteiro que deseja fazer... vou explorar um pouco mais... mas já "deu um norte". Fiz uma pesquisa rapida também no booking.com sobre o Les Houches e vi o preço para 2 noites (R$600). Agora vou planilhando tudo que disse acima e calculando... Valeu por compartilhar estas informações Priscila!

    Jose Antonio Seng 25/07/2021 10:45

    Primoroso relato. Parabéns !

    Priscila Matias

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