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Peter Tofte 04/06/2025 15:46
    A trip dos cogumelos: Travessia Itaitu-Jacobina

    A trip dos cogumelos: Travessia Itaitu-Jacobina

    Trekking por uma das mais belas trilhas da Bahia. Com os amigos Frank, André e Alexandra.

    Montañismo Trekking Acampada

    Frank, um amigo que trilhou comigo o cânion do Guariba, me disse que queria fazer a travessia Jacobina- Itaitu (ver relato "Travessia Jacobina-Itaitu via Topo de Mundo" de 2023). Perguntou se queria ir. Macaco quer banana? Apenas propus que fossemos no sentido inverso.

    Colocamos o convite no grupo do Bushcraft BA e o casal André/Alê toparam. Com eles já tinha feito o rolê do Barbado em 2018.

    Partimos de Salvador na sexta 30/05, depois das 10 horas com rápida parada em Feira de Santana para almoço.

    Cerca de 16:30 chegamos na casa de Marinalva e Jucival em Itaitu. Jucival já nos esperava e pudemos guardar o carro no jardim. Depois ofereceu um cafezinho e melancias (não adiantou dizer que só queríamos um lugar para estacionar o carro. A hospitalidade deste povo é arraigada e inabalável)! A trilha começa justamente atrás da casa deles.

    Partimos meio que tarde pois já iria escurecer. Mas o planejado era acampar apenas a 25 minutos de caminhada, perto de um riacho, no meio de um belo bosque.

    Montamos as tendas com a última luz do dia e fizemos a janta no escuro, a beira do riacho. Luz vermelha nas headlamp para os insetos não cairem na comida e virarem suplemento proteico. Depois o banho no riacho.

    Começou a chover durante a noite. O único que dormiu o sono dos inocentes foi o Frank na sua tenda Mongar 2. Eu, na Lanshan Pro 1, sentia, volta e meia, um respingo de água no rosto. Quando uma gota grossa caía das árvores e batia no teto da tenda de tecido único fazia a condensação no interior da tenda respingar em mim.

    André e Alê estavam numa Falcon 2 da NTK. Além de suarem horrores a tenda também descolou a fita que impermeabiliza as costuras e entrou água. Noite de cão. Confirmaram a péssima imagem que eu tenho desta tenda/marca.

    Pela manhã levantamos as 6 horas e após o café partimos (8 horas).

    Acampamento perto do riacho.

    Começamos uma ascenção em meio a mata. Ainda chuviscava um pouco. Sugeri não vestirmos o anorak pois a subida seria íngreme e, por mais respirável que fosse o tecido, iriamos suar muito. Realmente não compensava vestí-los.

    Árvore com parte do tronco oca.

    Saímos da mata e avistamos parte de Itaitu. Começava uma vegetação arbustiva até uma crista.

    Nesta crista, já de campo rupestre, avistamos do lado esquerdo um belíssimo desfiladeiro estreito com cânions laterais. No chão destes uma mata intocada. Frank disse que no Sul da Bahia o pessoal chama isto de boqueirão. Belo cenário.

    Boqueirão.

    Prosseguimos pela crista até descermos num pequeno vale para subir nova crista. Nesta subida um lindo bosque de mata nebular decidófila. Se caracteriza por árvores pequenas cheias de musgo e línquen e chão atapetado por bromélias.

    A cadeia de montanhas de Jacobina é formada por uma série de serras em paralelo entremeadas por pequenos vales florestados. Alguns chamam de Chapada Diamantina Norte. Apenas estratégia de marketing. Geologicamente e do ponto de vista de ecossistemas são bem distintas.

    Chegamos num ponto da encosta na floresta onde o Wiki mandava deixar a trilha batida principal e pegar uma trilha mais tênue à direita. Nesta bifurcação Alê viu um bonito cogumelo azul devidamente fotografado pelo Frank.

    A derivação seguia uma curva de nível pela encosta com vista para outro desfiladeiro de paredes íngremes. Beleza aqui não falta!

    A trilha que puxamos no Wikiloc tinha o que chamamos de "derivação da Bruma". Bruma é a cachorrinha que acompanhou o cara que fez um ótimo vídeo desta travessia postado no You.Tube (ver "010- Trilha de Travessia: 6 dias de Trekking na Serra entre Jacobina e Itaitu BA com Chuva"). Esta derivação tem a única fonte de água num bom trecho da travessia. Achamos o córrego e reabastecemos. Logo em seguida o sendero estava fechado por mato e árvores tombadas. Porém o Wikiloc mostrava que a trilha era por ali. Parece que fazia tempo que não passava gente. Não tinhamos facão e decidimos voltar para a bifurcação e tomar o caminho que usamos em 2023. Nesta ida e volta perdemos 50 minutos. Ou melhor, ganhamos, por descobrir outro trecho bonito.

    Na bifurcação pegamos a trilha bem mais batida, que subia a encosta.

    Como André estava gravando no GPS desde o início do dia descobrimos que a "derivação da Bruma" convergia e chegava na trilha atual. E a diferença era de apenas 100 metros do ponto até onde fomos, antes de fechar o caminho, e onde agora estávamos.

    Avançamos e chegamos numa clareira em meio ao bosque, uma encruzilhada com uma trilha que cruzava a serra transversalmente. Meio apagada e que não nos interessava.

    Subimos outro cocoruto da serra e baixamos num pequeno descampado onde havia um casebre cujas paredes eram de lona. Espiei para dentro e havia uma cama feita de paus e um colchão de espuma maltratado. Mas alguém frequentava o lugar. Se tivéssemos chegado bem mais cedo ontem em Itaitu minha idéia era subir até este ponto para armar acampamento no gramado em frente ao casebre. A desvantagem é que teríamos que subir com toda a água (não havia ali). Soubemos depois que não seria uma boa pernoitar no local...Brrrrrr.

    Paramos para lanchar. Passava de meio dia. Frank fez um Tang de cajá. Delícia nutritiva! Kkkkkk

    Depois de 25 minutos partimos.

    Outro caminho na crista por campo rupestre cheio de candeias com bela vista a direita. Daí baixamos para novo vale onde um grande remanescente de mata atlântica ocupava a baixada por alguns quilômetros. Algumas árvores eram bem parrudas. Muito babaçu (Attalea speciosa). Na Chapada Diamantina não se vê esta palmácea. Um córrego corria no meio da mata.

    Bonita árvore marca a descida para o vale da mata.

    Frank volta e meia parava para fotografar cogumelos. Está fazendo trabalho voluntário para uma pesquisa de Micologia da UFBA. No anexo de fotografias tem mais fotos de cogumelos.

    Subimos para nova crista onde podíamos ver os dois lados da serra, leste e oeste.

    Andando na crista.

    Nesta crista chegamos a uma estrada de terra aberta na época da mineração de ouro. Seguiríamos dali até Jacobina. Atualmente raras motos a transitavam devido ao seu estado de conservação, com pontos bem difíceis de passar.

    A estrada de terra seguia em meio a floresta. O André pisava diferente. Ambas as botas tinham soltado o solado e ele prendeu as solas com cordoletes. Ficamos revoltados quando soubemos que o homi gastava três mil reais num canote de bicicleta mas não comprava uma bota nova depois de 7 anos de uso! Alê bem que o avisou que acreditava que aquela bota não aguentaria o tranco. "Eu disse...eu disse!"

    Estado das botas (foto tirada ao final da trilha).

    Após uma hora andando na estrada chegamos numa pequena fazenda onde encontramos um rapaz, Ramon, cuidando de um burro. Puxamos conversa. Era o neto do dono da fazenda, que chegaria com a esposa neste mesmo dia.

    Nos despedimos. Após um bosque de mata nebular começava uma grande ladeira descendente.

    Encontramos o dono da fazenda nesta descida, numa moto. Seu Antonio Carlos, aparentando ter entre 60 e 70 anos, estava acompanhado por Dona Maria e iriam passar a noite na fazenda. Paramos para prosear. Ele era também o dono do casebre onde paramos para lanchar horas antes. Disse que as vezes dormia lá. Mas que, em certas ocasiões, uma onça lombo preto aparecia rondando a habitação e ele tinha que botar o rádio a todo volume para espantar a bicha (será que a música era Arrocha ou Sertanejo?). Imaginei a gente acampando lá conforme meu planejamento inicial (se tivessemos chegado bem mais cedo na tarde anterior). Ele já havia perdido um bezerro para a onça...

    O casal iria preparar um café da manhã com cuscuz para um grupo de 9 trilheiros que subiria na manhã seguinte, vindo de Jacobina.

    Outra despedida e cada qual seguiu em sentidos opostos.

    Para hoje minha expectativa era pernoitar no Topo do Mundo, já com vista para a cidade de Jacobina. Mas Alê estava exausta e André também demonstrava cansaço. Eu achava que André seria o cara mais bem preparado fisicamente para esta trilha pois pedala quase diariamente 50 km. Ele me esclareceu que são grupos musculares diferentes.

    Decidimos acampar no final da extensa descida, numa baixada, onde um pequeno córrego cruzava a estrada e havia um bom trecho plano arenoso. Sabíamos que moto alguma ainda passaria ali, naquele horário.

    Banho de caneco e janta. Frank estava com um Fettuccini a carbonara comprada no Sam's Club para dois e ofereceu compartilhar a comida. Não pensei duas vezes. Ele ainda tinha carne de sol pré fritada e misturou ao final. Uma das melhores refeições de trilha que comi em anos!

    Conversa e brincadeiras. Cada um tentava arranjar um apelido de trilha para o outro. Pelo fato de ter esquecido o sabonete em casa, tomando banho só com água, o meu passou de Gandalf para "mandioca pubada" (quem é nordestino entenderá). O de André ficou "ovos mentolados" e o de Alê "eu disse". Frank escapou.

    Fez frio de noite para o padrão baiano. Dentro da minha tenda 21ºC. Externamente André mediu 17°C. Vez por outra rajadas fortes, apesar de estarmos numa baixada entre duas ladeiras com encosta de um lado e mata na outra.

    Dia seguinte, por volta de 8 horas, enquanto preparávamos o café, o grupo de 9 trilheiros, incluindo o guia, passou por nós. Era o pessoal que tomaria o café na fazenda do seu Antonio, lá em cima. Estavam indo para Itaitu.

    Nossa caminhada começou com uma subida bem íngreme. Mesmo um carro 4X4 teria dificuldade se o motorista não fosse habilidoso. Alguns trechos estavam cimentados para facilitar a passagem.

    A trupe no topo da ladeira. Esquerda-direita: Frank, Mandioca Fubada, Eu Disse e Ovos Mentolados.

    Nesta subida experimentei a mochila do Frank, a excelente Alto Estilo 35+11. Leve e confortável. Produto nacional com ótimo custo-benefício.

    Chegamos no Topo do mundo. Aproximadamente 1.000 de altitude. O pessoal de Jacobina ao batizá-lo foi bem humilde. Suspirei. Ainda bem que não acampamos ali. Chão muito pedregoso. Seria difícil enfiar um espeque naquele solo. E muito exposto aos ventos. Teríamos tido uma noite de perrengue acaso tivessemos acampado ali.

    Topo do Mundo. Ao fundo Jacobina.

    Na descida restante uma pequena chuva nos alcançou. Apenas uma "apaga pó", chuvisco no jargão do interior. Frank nos contava suas histórias de vida. A picada de escorpião que levou ("pense numa dor redonda"), no tiro acidental que o atingiu na escola técnica. O cara é Highlander.

    Alcançamos o Cruzeiro por volta de meio-dia. Tiramos fotos.

    Descemos então a escadaria para o centro da cidade. Ali foi a pior trecho de todo o trekking!! O melhor uso que dei aos bastões em toda esta jornada! Degraus altos, mal feitos, irregulares. O pedreiro devia estar bebum ao construi-la. Aquela escadaria para o Cruzeiro era uma penitência para quem cometeu todos os 7 pecados capitais. Haja joelho.

    Já na avenida principal fomos para o melhor restaurante a quilo da cidade, o Rancho Catarinense. Entramos garbosos com mochilas nas costas. O povo do restaurante parou de comer e conversar para olhar aqueles seres alienígenas cheirosos e limpinhos. Para não espantar a freguesia fomos comer numa mesa isolada no 1° andar.

    Pegamos um taxi recomendado por Marinalva para voltar a Itaitu (25 km) onde o casal nos esperava com um café e deliciosos paezinhos de queijo.

    O recente asfalto valorizou muito as terras na região de Itaitu. Especulação imobiliária neste lugar lindo com vista espetacular para as escarpas de serra de Jacobina e cheio de cachoeiras.

    Trilha belíssima na companhia de bons amigos e com o suporte e gentileza do casal Marinalva e Jucival. Bom demais!

    Peter Tofte
    Peter Tofte

    Publicado en 04/06/2025 15:46

    Realizado desde 30/05/2025 al 01/06/2025

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    1 Comentarios
    André Clemente Correia 07/06/2025 08:09

    Arretado. Dá para rever todo passo a passo de como foi e rir novamente das resenhas 👏🏽👏🏽👏🏽

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    Peter Tofte

    Peter Tofte

    Salvador, Bahia

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    Carioca, baiano de criação, gosto de atividades ao ar livre, montanhismo e mergulho. A Chapada Diamantina, a Patagônia e o mar da Bahia são os meus destinos mais frequentes.

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