Fumaça e muita água!
Trilha e acampamento com meu filho na serra da Fumaça em Pindobaçu, Bahia, lugar belíssimo e pouco divulgado.
Trekking Montañismo AcampadaA Serra da Fumaça, em Pindobaçu, é um dos mais belos recantos da Bahia. Situado ao norte do estado, fica na região das serras de Jacobina. Poucos soteropolitanos conhecem. Quem frequenta é mais o povo da região, especialmente de Juazeiro, Petrolina e Senhor do Bonfim. Depois que conheci esta joia em dezembro de 2022 (ver relato "Pindobaçu - Cachoeiras e Esmeraldas") se tornou um dos meus locais favoritos. Retornei em fevereiro de 2023 com um grupo especial de amigos (ver "Poço das Estrelas via Lutanda").
Agora decidi ir com Theo, meu filho. Por várias razões. Comemorar o fato dele ter passado em Direito tanto na UFBA como na USP. Tirar ele da frente dos games (tarefa hercúlea dos pais, atualmente) e, especialmente, compartilhar da companhia dele em meio a natureza.
SEXTA
Chegamos por volta de meio-dia em Lutanda, distrito de Pindobaçu, depois de 5 horas de viagem desde Salvador. Após a últimas arrumações da mochila começamos a caminhar as 13 horas. Logo de cara começou a chover (frente fria chegando). Botei meu poncho e Theo, o abrigo. Apenas para tirá-los 300 metros depois, quando a chuvarada passou.
Para meu espanto, ao chegarmos ao rio da Fumaça ele estava seco! Atravessamos a pé sem tocar em água. Era o resultado de uma seca prolongada na região. Só agora, justo agora, começava a chover.
Seguimos por uma mata com sinais de modificação antrópica (jaqueiras e mangueiras). Havia gado na sombra das mangueiras, não sei se devido à chuva ou esperando mangas caírem (época delas).
Meu filho ficou com receio do gado e resolvi botar em prática algo que aprendi num grupo UL (embora achasse que não havia problema): agitei o bastão de trekking acima da cabeça girando-o com a dragonera. Não é que funcionou! O gado rapidamente se afastou. Mas geralmente o gado é dócil. Se vem em nossa direção é porque pensa que trazemos sal.
Acabou a parte plana e iniciamos a subida. Meu filho com uma mochila de 30 litros e eu com uma de 80 litros. Ele ia na frente boa parte do tempo, não só pela diferença de peso carregado como pela idade (uma diferença de 42 anos...).
No trecho inicial a subida é por uma bonita mata. Logo depois começa uma área de vegetação mais baixa. Passamos por um pé de mangaba a beira da trilha e tive a sorte de ainda achar um delicioso fruto (a época da mangaba é dezembro).
O Theo me perguntou se era fumaça nas montanhas, apontando para a névoa. Expliquei a ele que era a razão do povo chamar o lugar de Serra da Fumaça. Dá realmente a impressão de ser fumaça.
Chegamos num riacho numa pequena vereda justo antes da subida final. Aí começou a chover pesado e aguardamos, após vestirmos o poncho e o abrigo. Sou cada vez mais fã do poncho. Abrigou a mim e a minha mochila que estava aos meus pés. Colocando a mão dentro do poncho abri o tampo superior da mochila e tirei um lanche, sem molhar nada da mochila.
O riacho, num lajeado de pedra, estava com água parada. Com a forte chuva, começou a correr água.
Esperamos a chuva passar porque ali, logo adiante, começava a carrasqueira, uma subida íngreme com muita pedra solta, o crux da caminhada.
Partimos e subimos com cuidado. Bem cansativo.
Theo subindo, quase no topo.
No topo alcançamos o platô onde fica a capelinha e a cruz. Fazia cerca de um ano que estive ali. Parece que irão finalmente consertar os estragos do tempo na pequena construção. Retiraram o telhado e devem colocar novos caibros e telhas. É um ponto de peregrinação na região. Diria que é mais um local de penitência porque a carrasqueira não é brincadeira. A capelinha é linda na sua simplicidade, isolada no topo naquele promontório, ao lado de uma cruz de madeira, muitas vezes envolta nas nuvens.
Theo e a cruz.
Tiramos fotos e rapidamente recomeçamos a caminhada. Estimei em 40 minutos para chegar na Cachoeira da Fumaça/Poço das Estrelas.
Vista em direção aonde iríamos.
Passamos por uma bela mata estacional decidual de altitude (estávamos a quase 1.000 metros), com o chão forrado de folhas secas. Ali no platô há uma alternância de campos rupestres com conjuntos de matas.
Chegamos na cachoeira as 17:10, cerca de 4 horas desde Lutanda. Devido a seca apenas um filete de água escorria nela. A chuva até o momento não foi suficiente para reviver a cachoeira em todo seu esplendor (a terra seca absorve toda a água das primeiras chuvas).
Meste momento apenas filetes de água desciam. Com mais água o Theo não conseguiria ficar onde ficou na foto.
Pelo adiantado da hora rapidamente armamos a tenda no camarote da diretoria, um pequeno platô 4 a 5 metros acima do poção de águas escuras da cachoeira. O poção ainda estava cheio. O platô fica ao lado do paredão de rocha de onde cai a cachoeira. Quando recomeçou a chuva, maravilha, descobrimos que não molhava ali. A negativa da rocha protegia da água. O chão de areia permanecia seco. Poderíamos armar a tenda só com a inner tent (tela mosquiteiro), sem sobreteto, se quiséssemos.
O local da cachoeira fica ao fundo atrás das pequenas árvores.
Vista da tenda para o poção.
Esquentei e comemos a comida. Em seguida caimos na água do poção. Dizem que este poço tem 9 metros de profundidade! Depois do banho subimos ao acampamento com ajuda das headlamps pois já estava escuro.
Fomos dormir cedo porque havíamos acordado de madrugada.
SÁBADO
Dia preguiçoso, levantamo-nos pouco depois das 8 horas. Choveu bastante durante a noite. A cachoeira agora tinha bem mais água.
Café da manhã e um passeio para a área de acampamento na floresta, que ficava a 20 minutos dali, numa bifurcação do acesso a cachoeira.
Café com vista.
Mirante no caminho. Lutanda fica lá embaixo, escondida pela cabeça do Theo.
Grandes grupos ficam na floresta porque tem muita área para armar tenda (diria que 50 a 100 tendas). Lugar lindo, gramado e com árvores altas.
A caminho da área de acampamento.
Acima, uma das áreas. São várias destas. Abaixo, Orelha de pau.
Notei em relação a visitas anteriores que havia muito pouco lixo maculando a terra, ali e na área da cachoeira onde estávamos acampados. A prefeitura de Pindobaçu colocou cartazes alertando que era uma APA (Área de Proteção Ambiental) e que é crime jogar lixo/cortar madeira/fazer queimadas. Acho que além da concientização andaram fazendo uma coleta de lixo no local. Parabéns Prefeitura de Pindobaçu!
Passeamos por cerca de 40 minutos. Decidimos voltar quando recomeçou a chuva. No acampamento ficamos lendo ou apreciando a vista. Fiz o almoço. Jogamos uma partida de xadrez esperando a chuva passar. Levei um xeque-mate. Tudo isto no seco, sob proteção do paredão em negativo.
Quando estiou fomos nadar no poção. Descobri sem querer uma toca de pato-mergulhão nas margens. Quando me aproximei, ele saiu assustado, mergulhou e desapareceu de vista.
Quando retornamos ao acampamento uma turma de 10 jovens apareceu para tomar banho. Pessoal de Petrolina (2,5 horas de carro), simpáticos, exceto por uma caixa de som que levavam. Qual a necessidade de som alto num lugar destes?
Felizmente não acamparam ali (não havia espaço para as barracas de todos). Deviam estar acampados na área grande que visitamos pela manhã. Ficaram pouco tempo, se despediram e foram embora.
Mais tarde ainda apareceram mais 4 rapazes (outro grupo) para um banho rápido e sairam. O platô onde estávamos mal cabiam duas tendas.
No final da tarde um grande bando de pássaros da família das andorinhas voou ao redor da cachoeira, fazendo estrepolias. Theo observou que volta e meia alguns entravam voando debaixo da queda d’água para uma ducha rápida. Bonito espetáculo.
Depois do jantar ainda tomei outro banho. Ao escurecer entramos na tenda para ver vídeos na Netflix e ler. Mas não dormimos tarde. Combinamos acordar pela manhã as 06 horas para tentar sair as 8 horas, para retornar a Lutanda e daí para Salvador.
DOMINGO
Levantamo-nos pouco antes das 6 horas. Dividimos tarefas e as 7:30 já estávamos prontos e partimos.
Nevoa ao amanhecer. Vista da porta da tenda.
Uma ligeira garoa caiu e as nuvens chegaram na cota que percorríamos. Ao chegar na capelinha ela estava cercada por névoa. Bom cenário para filme de assombração.
Foto da Cruz. Repare na diferença em relação ao primeiro dia, na chegada.
Tiramos mais algumas fotos e descemos. Se na subida a carrasqueira exige do aeróbico, na descida exige cuidado.
No riacho paramos novamente para descansar.
Na mata a chuva caiu com vontade. Theo escorregou numa ladeira cheia de barro molhado e quebrou uma seção de um dos bastões (nota: o bastão Trail Lite da Nature Hike é péssimo. Terceiro que vejo quebrar. Meu Makalu da Leki está anos comigo e inteiro!). Felizmente queda sem machucado. Apenas a sujeira de barro nos fundilhos e o bastão quebrado.
O rio da Fumaça ainda estava sem água no ponto da travessia. A chuva na serra ainda não tinha sido suficiente para encher o rio.
Chegarmos no lugar de estacionamento as 11 horas, após 3,5 horas de caminhada. Trocamos de roupa para viajar secos para Salvador. Um senhor, que guardou nosso carro, disse que a guarda municipal de Pindobaçu agora está impedinto ônibus de excursão desembarcar passageiros em Lutanda, o que impede vandalismo e lixo na serra, e um número de visitantes excessivo, muito além do que a área poderia receber sem danos. Fiquei feliz com esta novidade.
Teve muita água (chuva) neste final de semana. Mas é aí que se revela a razão do nome da Serra, Fumaça.
Fiquei também muito orgulhoso de meu filho. Muito bem na trilha e no acampamento. Tranquilo e com boa aptidão física, embora tenha feito a última trilha há um bom tempo, na Páscoa do ano passado.
Recomendo sempre visitar esta área fora dos finais de semana e evitar feriados. Em todo caso, chegar cedo ou dia de semana para pegar o camarote da diretoria, lugar privilegiadíssimo na Cachoeira da Fumaça/Poço das Estrelas. Isto praticamente garante que ficará sozinho na área da cachoeira.
Dois vídeos anexos.
Relato dedicado ao filhão.
Excelente relato Peter. Parabéns pela aprovação do filhão no vestibular! 👏🏻
este cogumelo e comestivel (chickens of the woods)