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Peter Tofte 08/09/2024 20:16
    Medo de onça - Herculano/Herculaninho

    Medo de onça - Herculano/Herculaninho

    Três dias em área bem remota e selvagem do PNCD, onde impera a onça, com cinco grandes amigos.

    Trekking Waterfall Canyon

    Um grande amigo, Alberto Alpire, veio nos visitar na Bahia. Ele mora e trabalha na Alemanha e, a cada 2 anos, vem com a família rever os demais familiares e amigos. Fazia 7 anos sem visitar sua adorada Chapada Diamantina.

    Lucas (Planeta Outdoor) sugeriu que ele visitasse as cachoeiras Herculano e Herculaninho, Sudeste da Chapada Diamantina, município de Itaeté, uma das áreas mais remotas do PNCD.

    Ele esteve no mesmo lugar com os outros dois amigos (Ernani e Dantas), duas semanas antes.

    SÁBADO 03/08

    Eu e Beto partimos de Salvador as 09 horas de busão, chegando em Itatim as 13:30. Ernani nos esperava. No dia seguinte iríamos nos encontrar com outros 3 amigos de Feira de Santana, e partiríamos cedo para as cachoeiras.

    Ernani fez as honras da casa e nos levou para um churrasco no bonito sítio dele, com vista total para os inselbergs da região (itatim é a Meca baiana da escalada em rocha).

    Visual do sítio. Beto e Ernani diante da fogueira esperando a brasa para iniciar o churrasco.

    Lucas, que não podia sair cedo de Salvador, veio de carro e se juntou a nós por volta de 18 horas, trazendo mais cerveja e uma panceta para botar na brasa. Conversa muito agradável. Na resenha demos muita risada contando os causos engraçados envolvendo membros do Bushcraft Bahia. Causos de quem não estava presente para contestar nossa versão dos fatos (para quem não sabe, mesmo os fatos tem mais de uma versão).

    Lucas e Ernani passaram uns bizus do roteiro para mim e Beto. Ernani não poderia ir conosco porque ainda estava se recuperando de uma pequena queda na escalada.

    Muita cerveja e carne depois, uma pequena chuva nos expulsou do sítio e fomos para a casa de Ernani na cidade de Itatim.

    DOMINGO

    Acordamos 06 horas. Samuca, Lucinha e Igor chegaram pontualmente as 7:30. Carregamos nossas mochilas no carro deles e rumamos para Itaetê, 175 km distante. Chegamos lá pouco depois das 09 horas.

    Pegamos então estrada de barro. O Wikiloc foi acionado pois lá tem um pequeno labirinto de estradas que confunde um pouco. Chegamos numa fazendinha, onde estacionamos o carro. Havia mais dois carros de visitantes no local.

    Arrumação final e partimos por volta de 10 horas. O seu Milton, dono do pedaço, prometeu tomar conta do carro.
    Esquerda para a direita: Igor Botas Secas, Lucas, Samuel e Lucinha Morcegona. Agachado, Beto.

    Em cerca de 20 minutos chegamos numa bifurcação e tomamos a direita. Esta levaria para a parte superior da cachoeira do Herculano. Comecei a subida arfando. Creio que eu era o menos preparado do grupo. Samuca é vice-campeão baiano de corrida de aventura, Lucinha não fica atrás e Igor também tem bom preparo. Lucas faz cross fit e Beto vai de bike todo dia para o trabalho, na Alemanha. Meu pilates pouco conta nesta preparação aeróbica.

    A trilha começa fácil, bem demarcada. Mas depois entra num lajeado e empedrado que torna a navegação mais difícil, com algum trepa pedra. Graças ao relógio Polar Grit x2 Pro com GPS (excelente, que Lucas e Samuel usavam) pudemos saber por onde seguir. Este relógio bota os Garmin no bolso.

    Num dos trecho de mata o Lucas me mostrou uma árvore com buracos no tronco onde escorria uma seiva. Explicou que micos e/ou macacos mordiam aquele tronco e galhos para fazer o buraco e chupar a seiva dela! Mas não recordo do nome da árvore.

    Passamos por 3 mirantes, primeiro com vista para a entrada do cânion, outro para a magnífica cachoeira do Herculano e, logo depois, para a Herculaninho.

    Mirante para a entrada do cânion.

    A Herculano tem queda de cerca de 100 metros.

    Euzinho, feliz por estar num lugar bonito assim.

    A Herculaninho é uma cachoeira de 15 metros logo a montante da Herculano, num pequeno cânion. Lindona, apesar do diminutivo.

    Avistamos do mirante da Herculano umas 10 pessoas lá embaixo, provavelmente dos 2 carros que vimos no estacionamento. Estavam voltando. Era um bate e volta.

    Paramos para lanchar perto do mirante da Herculaninho as 13 horas.

    Decidimos não descer para a Herculaninho porque queríamos avançar mais rio acima para achar um bom lugar para acampar. Esta descida para o poção da cachoeira é íngreme e tem pequeno trecho com exposição.

    Pouco depois do mirante acaba a trilha e entramos no leito do rio. Chegamos na piscina dos urubu-rei. É um poção do rio onde se pode surpreender 30 urubus-rei bebendo água e tomando banho. São raríssimos atualmente, e ali é um santuário para eles. Mas vimos apenas um bando voando e três pousados num grande rochedo perto, um casal com filhote.

    Rumamos para este empedrado porque ali havia pinturas rupestres. Os 3 urubus saíram voando.

    Pinturas bonitas e bem conservadas. Tiramos boas fotos. Várias representações de animais e figuras geométricas.

    Pouco depois da piscina dos urubus-rei o leito do rio (com pouca água), deixava de ser lajeado e virava um empedrado, exigindo pula pedra. E mais adiante o crux: grandes pedras atravessadas no rio exigiam um pequeno malabarismo para passar entre elas. Realmente aquilo não era coisa para turista guiado, sem boa prática de trilha.

    Chegamos no local onde Lucas, Ernani e Dantas haviam acampado duas semanas antes. Um lajeado e areal, com um poço. Neste tramo o rio estava engrunado, não havia água corrente.

    Ali, na ocasião, eles encontraram rastros da lombo preto, leão baio, puma ou suçuarana. Bichona de respeito, a julgar pelo tamanho das pegadas.

    Foto tomada duas semanas antes pelo trio.

    Então o Ernani, mateiro muito experiente, tratou de pegar bastante lenha. Combinaram revezar os três: durante a noite toda, a cada hora, um iria alimentar o fogo com grossas toras. No meio do lajeado não havia como o fogo propagar. Ernani decidiu dormir de botas, acaso fosse acordado pelo felino. Ali era o ponto em que o gatinho descia ao rio para beber. Literalmente a razão da velha expressão: “a hora da onça beber água”.

    Local do acampamento deles. Observe no centro do lajeado os restos da fogueira.

    Felizmente a fogueira ardeu bem e não houve problemas. Aquela região é a mais selvagem da Chapada. Basta olhar no Google Maps satélite para ver quanta mata há ao redor.

    Ainda era cedo, por volta de 15:30, e queríamos um lugar melhor. Estávamos cansados de subir pulando pedra pelo leito do rio, mas não gostávamos da ideia de também acampar no bebedouro da onça.

    Num trecho, Lucas, nosso guia, adiantou e descobriu uma toca maravilhosa com um pouco de água corrente na frente. Como o rio tinha pouca água, havia lajeados no leito onde se podia montar tendas autoportantes. Eu, com uma Lanshan 1 (não autoportante), optei por bivacar dentro da toca (possuía um saco de bivaque) sem usar a tenda.

    Boa toca. Muito provavelmente usada por caçadores que infelizmente ainda atuam na região.

    Armadas as barracas, jantamos. Eu usei meu fogareiro de gravetos para fazer um risoto pré-pronto (fervura + 12 minutos).

    Tomamos banho ao escurecer, em poços rio acima.

    Vista das tendas no leito seco do rio. A toca está escondida pela vegetação a direita.

    Todos estavam alertas de que teriam de deixar as tendas acaso chovesse muito a noite. Mas a previsão era de chuva mínima.

    Prosa em volta da fogueira, tomando licor de jenipapo comprado em Itatim, delicioso. Ainda misturei com um whiskey que trazia na minha mochila.

    O Lucas, muito didático, demonstrou, a beira da fogueira, o que aprendeu num curso de guias: como se limpar após fazer o nº 2 usando os recursos naturais (sem papel higiênico). O homem é hilário. Devia fazer stand-up.

    Teve um momento que choveu e nos abrigamos na toca onde acendemos outra fogueira e continuamos a conversa. Falando mal de quem não veio (quem mandou não vir?).

    Muito besteirol depois fomos dormir quase 11 horas. Reforcei o fogo e rapidamente armei o bivaque para dormir enquanto os amigos se acomodavam nas tendas. Se dona onça aparecesse eu seria a primeira opção do cardápio dela, pela facilidade de agarrar a presa.

    A mistura whiskey com licor de jenipapo não caiu bem. Senti refluxo boa parte da noite. Mas o bivaque foi bom (bivy da Borah Gear). Precisei vestir uma balaclava de fleece e um corta vento para não sentir frio de madrugada. Deu algo em torno de 15 a 17ºC.

    SEGUNDA

    O pessoal acordou cedo, por volta de 06 horas. Me levantei quando notei que era o último deitado. Não houve condensação no saco de bivaque.

    Meu café foi feito na espiriteira de álcool. De manhã prefiro usá-la porque é mais prática e rápida do que queimar gravetos.

    Mochilas prontas saímos 9:30, descendo o rio (caminho do dia anterior, mas sentido inverso). Agora exigindo mais cuidado porque choveu um pouco logo cedo. As pedras onde pisávamos estavam escorregadias.

    Típica margem do rio.

    Descendo o rio.

    Ao final do percurso pelo leito do rio chegamos no ponto onde caía a Herculaninho. Na foto abaixo a beirada da queda. Lá embaixo, o poção.

    Pegamos então uma trilha na margem direita verdadeira e fomos para o mirante da Herculaninho onde pegamos um lanche e deixamos as mochilas. A descida para o fundo do cânion é melhor sem mochilas, tem uma passagem com exposição que exige algum cuidado.

    No fundo fomos ver a boca da queda da Herculano. Vista fantástica, mas não me aproximei muito da borda. Ali estávamos a um passo da eternidade, bastava um escorregão. Ela tem 100 metros de altura, uma das maiores da Chapada. Tem negativas no enorme paredão.

    Na beirada havia argolas para fixação de cordas para rapel. Dali a uma semana teria uma corrida de aventura que incluía este rapel. Samuel iria participar.

    Aproveitamos para lanchar e tirar fotos. Visitei o poço da Herculaninho. Muito bonito o lugar.

    A subida até onde deixamos as mochilas (mirante) foi bem mais fácil que a descida, como sempre.

    Após cerca de hora e meia chegamos a uma fenda que descia até o fundo do cânion da Herculano. Fenda fácil. Chegamos no leito do rio e num trecho seguimos pela margem direita verdadeira para logo ter que pular pedra. Já perto do poção da Herculano nos abrigamos debaixo de uma árvore devido a uma chuva grossa. Puxamos das mochilas os sobretetos das tendas para nos proteger.

    Quando a chuva passou bateu um desânimo. Eu e Lucas já conhecíamos o poção. Apenas Beto e Samuel estavam com disposição para prosseguir até o fundo do cânion, ao pé da cachoeira. Lucinha resolver acompanhar o marido. Eu, Lucas e Igor ficamos descansando e tomando um café. As pedras estavam bem escorregadias devido à chuva. Eu considero leito de rio empedrado (pula pedra) o pior terreno para trilhar. Para ter um acidente é fácil, além de forçar bem o joelho e ser muito cansativo.

    Voltaram após uma hora. Samuel escorregou numa pedra e caiu num poço do rio, se molhando todo. Ao menos não se feriu.

    Descemos o rio e, depois de uma hora, chegamos no ponto em que o rio era intransponível, um cânion estreito, em queda. Pegamos uma trilha na margem direita verdadeira, que havia passado 8 anos antes (ver relato Itaetê – O lado B da Chapada Diamantina – 2ª parte).

    Descemos até o local onde havia acampado naquela ocasião e no qual o trio Lucas, Ernani e Dantas também escolheram duas semanas antes. Lugar bonito debaixo de uma árvore frondosa. Pescadores costumam usar o local. O rio, já fora do cânion, fica largo.

    Ali, sem toca, armei minha Lanshan 1. Havia espaço para ao menos 8 barracas.

    Banho de rio, jantar e conversa a beira da fogueira. Moderei hoje na bebida. Dormida legal.

    TERÇA

    Fez 17°C na madrugada, mas não passei frio.

    Café tranquilo, sem pressa. Estávamos a apenas 30-40 minutos do carro.

    Prontos para partir.

    A volta foi sossegada. Encontramos seu Milton na roça. Conversamos um pouco e demos uma gorjeta para ele.

    Em Itatim chegamos 14 horas onde almoçamos com Ernani e pegamos o que deixamos na casa dele. Ao anoitecer eu, Beto e Lucas estávamos em Salvador.

    Lucas, além de grande companhia e experiente trilheiro, foi um excelente guia.

    Foi uma trilha divertidíssima. A cada 5 minutos caíamos na risada. Juntar Igor e Lucas na mesma trip é diversão certa!

    Aquela área superior da Herculano merece mais dias. Porém cuidado porque faz parte de zona muito selvagem do PNCD. Um grupo do Bushcraft BA que tentava chegar na Pantomia (onde a onça mia, o filho chora e a mãe não ouve) foi atacado por um grande enxame de abelhas. O ataque, me descreveram, parecia filme de terror. Um deles levou 161 picadas. Havia um médico no grupo com medicamentos, que evitou o pior.

    A parte de baixo das cachoeiras (Encantada, Herculano e Bom Jardim) costuma ser visitada. A parte superior, aonde fomos, raramente.

    Grande Beto. Vai deixar saudades ao voltar para a Alemanha.

    Peter Tofte
    Peter Tofte

    Published on 08/09/2024 20:16

    Performed from 08/03/2024 to 08/06/2024

    Views

    817

    3 Comments
    Ernani 08/09/2024 20:31

    Bom demais essa trip!   Eu e Dani fizemos a travessia da Encantada para Herculano a uns anos atrás, guiados por Astrogildo. Podíamos combinar de refazer essa trilha.  Vamos?

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    Peter Tofte 08/10/2024 15:27

    Com certeza, grande mestre mateiro!

    Diana Sanches 08/10/2024 09:11

    Linda Cachoeira! Essa região de Itaetê é muito especial!

    1
    Peter Tofte

    Peter Tofte

    Salvador, Bahia

    Rox
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    Carioca, baiano de criação, gosto de atividades ao ar livre, montanhismo e mergulho. A Chapada Diamantina, a Patagônia e o mar da Bahia são os meus destinos mais frequentes.

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