/abcdn.aventurebox.com/production/uf/5643b783afe44/adventure/6261b13109566/6262b8856b91a-2.jpg)
O Coelhinho da Páscoa na Toca do Lobo
Páscoa no refúgio Toca do Lobo, recanto muito selvagem da Chapada Diamantina, com amigos. Imagens iradas de drone da Encantada bombando.
Canyon Waterfall HikingSaímos de Salvador na sexta, feriado de Páscoa. Três da manhã porque o caminho até Itaetê é longo. Eu e Lúcia buscamos Cris e Fábio e, em seguida, Dani.
Em Feira de Santana, 110 km adiante, encontramos Samuel (Samuca) e Lucinha. Dani passou para o carro deles para dividirmos os passageiros.
Estradas vazias, viagem tranquila. Chegamos ao povoado do Rumo (município de Itaetê) cerca de 10 horas.
Pegava TIM e avisei via zap a Alcione, da Toca do Lobo, que já subiríamos para a Chapadinha.
Passamos para o carro de Samuca, uma Pajero Dakar de 7 lugares com tração 4X4. As mochilas foram colocadas no rack bagageiro.
A estrada para a Chapadinha é realmente um desafio mesmo para carros com tração nas 4 rodas. Samuca habilmente passou pela lama e pedras. Em alguns momentos tínhamos que saltar do carro para aliviar o peso em alguns lamaçais.
Chegamos no refúgio Toca do lobo as 11:30. Marcão e Alcione nos receberam com um sorriso. Eles são possivelmente os proprietários do refúgio mais selvagem e remoto da Chapada Diamantina, senão do Brasil. As câmeras trap do Marcão já filmaram caititus, veados, jacus, pacas e sussuaranas, entre outros, no terreno deles. A terra do refúgio vai até o rio Samina, divisa Sudoeste do Parque Nacional. Na outra margem deste rio já começa o parque. Perto fica a belíssima cachoeira da Encantada, 230 metros de queda e de pura beleza.
O almoço já estava esperando. Alcione é uma excelente cozinheira e é tudo feito no fogão a lenha. Não tem eletricidade. A energia elétrica é provida por painéis solares e o banho quente por aquecedores a gás.
Após vários pratos repetidos bateu leseira e fomos para os quartos descansar, afinal desde 3 da madrugada estavamos acordados.
Com o sol mais baixo pegamos uma trilha curta e fomos para um banho no rio Samina a 5/10 minutos de caminhada. Água deliciosa e quentinha, porque estava raso e escorria pelas lajes de pedra do fundo do rio num dia de sol. Eu, Dani e Cris trouxemos câmera e tiramos fotos.
Rio Samina, calminho, com pouca água.
Banho delicioso.
Belo anoitecer.
De noite começou a relampejar e trovejar. Falei que adoraria ver uma tempestade num lugar assim selvagem. Oh boca! Não é que ela veio?
Mas ainda fizemos uma fogueira comunal é só na hora de dormir que começou a pingar. Na Chapada, muitas vezes, a chuva é anunciada com boa antecedência, ao longe, pelos raios e trovões.
Nos quartos ouvimos o cacau caindo. Muita chuva mesmo!
SÁBADO
Ao amanhecer consultei curioso o medidor de índice pluviométrico do Marcão e a escala graduada indicava 144 mm. Estava seco ao final da tarde de ontem! Numa só noite 144 mm. E a previsão metereológica para Itaetê só previa 30 mm de chuva.
Samuca lançou o drone e filmou o rio até a cachoeira Encantada. Mas a queda não estava visível porque um tapete de nuvens formava um teto no cânion (ver vídeo nº 1).
Após o bom café da manhã fomos novamente para o Samina. Ele estava irreconhecível, furioso, caudaloso, impossível atravessá-lo.
Samina furioso. Mesmo local da foto do dia anterior. Reparem na diferença.
No way.
Decidimos seguir para um mirante a direita do rio (margem verdadeira) e para a Pedra do Caboclo, porque seria impossível ir para o mirante principal da Encantada que fica do outro lado do rio.
Também descartamos descer pela Fenda da Encantada para a parte baixa do cânion, para alcançar o poção inferior da cachoeira. Com este volume de água seria impossível chegar ao pé da queda d’água. Além disto a descida tem trecho empedrado e íngreme, que estaria bem molhado.
No mirante da margem direita o Samuca colocou o drone novamente para funcionar. Imagens sensacionais. A cachoeira estava bombando! Nunca vi pessoalmente ou em vídeo uma cachoeira com aquele volume de água na Chapada. Uma nuvem de spray era lançada para cima no choque da água com o poção inferior. O vídeo nº 2 mostra toda a majestade da Encantada. O rio lá embaixo estava esbranquiçado. O cânion da Encantada já é um espetáculo à parte. Considero a Encantada a mais bela cachoeira da Chapada Diamantina.
A cachoeira esta escondida na curva atrás do paredão que avança. Só o spray do poção é visível.
Após as filmagens e fotos fomos para o Caboclo. A pedra fica a cerca de 20 a 30 minutos de caminhada do mirante e tem pinturas rupestres. A avistamos da trilha, mas cadê o caminho até ela? Ficamos nos batendo até desistirmos. Deixaríamos para o dia seguinte. Fica à esquerda da trilha dos canos, nosentido da descida da serra da Chapadinha (uma alternativa para quem deseja subir ou descer a Chapadinha a pé. São 3 a 4 horas a pé a partir do povoado do Rumo).
Uma rã pimenta na trilha dos canos.
Voltamos cansados para a Toca e Samuca mostrou as imagens do drone para Marcão e Alcione. Samuel ainda possuía um drone de corrida cuja imagem era projetada para óculos fpv, o que permitia fazer rasantes e piruetas ao redor da Toca do Lobo. Pegamos no pé da Lucinha dizendo que se Samuel tivesse que escolher entre levar ela ou o drone para a Toca escolheria o drone.
Novamente armamos a fogueira após a janta para tomar um vinho. Dani preparou também uma caipirinha. Fui dormir mais cedo porque estava cansado.
Durante a noite Lucia pediu para iluminar o caminho para o banheiro com receio da onça. Vi dois olhinhos brilhando na escuridão. Um coelho perto da horta. A horta e a plantação de Alcione e Marcão sofrem com a incursão noturna de coelhos, veados e tatus.
Mas achei bem a propósito um coelho na Páscoa, destemido, pois estava na Toca do Lobo.
DOMINGO
Partimos após o café, determinados a desta vez chegar na Pedra do Caboclo que nos enganou no dia anterior. Após uma busca mais racional o Fábio descobriu a trilha para o local, que não era evidente. Ela fica a esquerda, já no início da descida da fenda da Encantada.
Pedra bonita, fica em balanço, num equilíbrio improvável. Não é à toa que os antigos habitantes escolheram o local para as pinturas. Deviam ver algo de sagrado numa pedra tão diferente. Notei que há uma rachadura horizontal na base, ou seja, não é uma rocha única. A parte superior está claramente separada da base. Ela se mantém em pé apenas porque está em balanço. Vejam este detalhe no vídeo nº 3.
Chegando na Pedra do Caboclo.
Formato inusitado.
As pinturas rupestres são poucas. Talvez parte das rochas tenham se desprendido levando consigo as pinturas. Também dizem que uma pessoa teria destruído parte das pinturas para não revelar o lugar da Cidade Perdida do Manuscrito 512 (datado de 1754) da Biblioteca Nacional. Estupidez e vandalismo andam de mãos dadas.
Caiu uma chuva e nos abrigamos debaixo da rocha e lanchamos. Quando o tempo melhorou Samuel lançou o drone fazendo belas tomadas da Pedra (ver vídeo nº 3).
Na volta tomamos banho num remanso do rio Samina, no mesmo local do primeiro dia. Ficamos no meio da espuma criada pela matéria orgânica no rio. Criava uma barba branca nos banhistas, desnecessária no meu caso.
Fomos então para o refúgio onde o almoço-janta nos esperava.
Mesma rotina: fizemos a fogueira e nos sentamos em volta, em bancos ou cadeiras, proseando e bebendo.
Eu e Lúcia dormimos numa tenda (Lanshan 2) montada debaixo do redário. Um casal chegou com mototáxis e por falha de comunicação deu overbooking no refúgio (tradicionalmente na Páscoa ficam de quinta a domingo e ficamos de sexta a segunda). Sem problema, adoramos dormir na barraca.
SEGUNDA FEIRA
Hoje o dia de aventura seria mais curto. Retornaríamos para Salvador após o almoço. Depois do café eu, Fábio, Cris e Lucinha decidimos ir ao mirante da margem esquerda (verdadeira) da Encantada, o que não conseguimos no sábado. É o melhor mirante, ficando quase em cima da queda principal.
Descemos para o rio, cruzamos o braço seco do rio Samina (no vídeo nº1 percebemos que o rio se bifurca pouco antes da queda, mas o braço direito normalmente é seco). Tentamos atravessar o braço esquerdo (sempre com água), entretanto não vimos ponto de passagem. O rio ainda estava caudaloso e não tínhamos corda.
Correnteza forte, passar só nadando.
Resolvemos subir pela margem procurando um local para atravessar. Achamos um ponto bom (largo e de pouca profundidade) e o cruzamos facilmente. Do outro lado suspeitei de uma abertura na mata ciliar e fui checar. Era o começo de uma trilha. Seguimos. Sendero batido, provavelmente levaria para o mirante.
Mais adiante uma bifurcação a direita. Se fossemos em frente nos afastaríamos do rio, assim viramos à direita. Ia exatamente na direção desejada, da grande queda da Encantada. Soubemos depois que o caminho em frente vai até a casa do Astrogildo, lendário ermitão da Chapadinha.
Chegamos na margem perto da queda principal. Uma trilha seguia bordeando o cânion que se abriu imenso a nossa direita. Um precipício de mais de 200 metros. No mirante uma pedra se projetava acima do abismo. Muita água caindo na cachoeira. Tiramos fotos e filmamos.
Início da queda principal.
Chegando devagarinho na borda para fotos.
Lucinha olhando o cânion e a cachoeira.
Alguém lembrou que no passado um bando inteiro de caititus (porcos do mato) foi encontrado morto, espatifado embaixo da cachoeira. Os guias da região acharam que foi um cabeço d’água que surpreendeu o bando andando no leito do rio e empurrou-os cachoeira abaixo. Provavelmente.
Não demoramos muito porque ainda teríamos que almoçar na Toca do Lobo. Regressamos felizes. Quando estive aqui na Páscoa de 2018, vindo de Cascavel (vide o relato “Gerais do Machambongo e as três mais belas”) não achamos o caminho para o mirante.
Acabamos de arrumar as coisas, mais uma excelente refeição e um banho para embarcar na Pajero do Samuel. Havia certa expectativa. Será que conseguiríamos voltar para o Rumo depois da chuvarada torrencial de sábado? Porém isto significaria apenas ter que pernoitar mais um dia ou dias neste lindo lugar. Os compromissos de trabalho, entretanto, deixavam alguns apreensivos. A Capitã Caveira poderia ficar presa um dia no quartel por falta não justificada.
Tiramos fotos de despedida junto com os queridos Marcão e Alcione. Em pé, da esquerda para direita, Cris, Fábio, eu, Lúcia, Lucinha, Samuel, Alcione e Marcão. A frente, agachada, Dani, nossa serpentóloga.
Saímos antes das 13 horas. A descida não foi difícil. Eu e Fábio fazíamos o papel do Zequinha (como chamam no off road quem salta do carro para ver o melhor ponto para passar). Como eu e ele usávamos camisas cor abóbora o pessoal no carro nos apelidou de cones da Transalvador (Companhia de Trânsito de Salvador). Eu e Fábio ouvíamos gargalhadas dentro do carro.
Os Zequinhas no batente. Trecho fácil da estrada.
Um sinhozinho de moto que voltava do seu sítio na Chapadinha guiou Samuel nos piores trechos. Perdemos o emprego de Zequinha.
Chegamos bem no Rumo onde redistribuímos bagagens e passageiros entre os dois carros. Eu, Lúcia, Cris e Fábio voltamos num carro e Samuel, Lucinha e Dani na Pajero. Em Feira, destino de Samuca & Lucinha, Dani voltou para o carro de Lúcia.
Chegamos em Salvador pela noite. Soubemos que choveu muito na capital baiana, com inundação de ruas e desabamentos. Normalmente pego chuva na Chapada nesta época, talvez pela mudança de lua, para lua Cheia.
Relato dedicado a Marcão e Alcione, pelo cuidado e carinho para conosco na Toca do Lobo. Mais que um refúgio é um projeto para ajudar a conservar aquela parte linda da Chapada (a Chapadinha) tão selvagem e, felizmente, pouco conhecida. Recomendo muito a Toca do Lobo. Dos refúgios que conheço no Brasil, este é o mais legal e selvagem.
Marcos e Alcione na lida culinária.
DICAS
Não há transporte público para Rumo. Creio que há para Itaetê, cidade mais próxima. De Itaetê para Rumo possivelmente há van ou mototáxi.
Do Rumo temos 3 opções para chegar na Toca do Lobo: com carro próprio (4X4), de mototáxi (R$ 100 cada perna) ou subindo de mochila pela trilha dos Canos (4 horas a partir do Rumo). Há também um caminhão, para grupos maiores. Porém não sobe com estrada ruim.
Quem não tiver carro 4X4 tem onde deixar tranquilo o veículo no Rumo antes de começar a andar ou pegar o mototáxi/caminhão.
Se quiser ver as cachoeiras bombando a melhor época é de novembro a abril. Mas pode ter dificuldade para subir até a Chapadinha. O melhor tempo é no inverno (sem chuvas) com um friozinho gostoso de noite, lá em cima.
Fazer a reserva com antecedência na Toca do Lobo, especialmente nos feriados. Acho a melhor opção aquela que inclui café e janta no pacote. Alcione cozinha divinamente.
Toca do Lobo: zap (71) 99955-0301 e (71) 98193-7124
e-mail: contato@serradachapadinha.com.br
Procurem no Instagram por @serradachapadinha porque tem muitos vídeos das câmeras trap mostrando a bicharada no entorno da Toca.
A Toca fica a 40 minutos da Encantada. Com um dia de caminhada há outras excelentes cachoeiras. A Herculano e a Penedo estão entre elas. Todas belíssimas.
A área é bem selvagem. Cuidado nas trilhas. Se não tiver experiência contrate um guia.
Sensacional o relato, Peter!!!!! Para uma viagem ser maravilhosa, o primeiro requisito é fazê-la com pessoas maravilhosas!
Galera sensacional! Ja estamos com saudades!!