AventureBox
Crie sua conta Entrar Explorar Principal
Peter Tofte 06/04/2025 09:07
    Valle das Águas Calientes

    Valle das Águas Calientes

    Paraíso!

    Montanhismo Trekking Acampamento

    Depois de alguns dias com frio e chuva no Sul decidimos dar uma de pássaro migratório, fugindo para o Norte (ver relato "Parque Nacional Hornopirén"). Ano passado eu e Lucia visitamos o Valle das Águas Calientes (ver "Andanças pelo Chile 4") e queria mostrar para Cris e Fábio este lugar que considero especial.

    Pegamos um ônibus 21:30 em Puerto Montt na mesma noite que chegamos de Hornopirén. Saltamos em Chillán cerca de 05 da madruga. O ônibus prosseguiu para Santiago e Lucia permaneceu nele. Queria descansar uns dias em Santiago e conhecer melhor a capital do Chile. Depois do vale nós três seguiríamos para Santiago, encontrando Lúcia, pois nosso voo para o Brasil era 25/03.

    Demos um tempo na rodoviária de Chillán porque o terminal rural ainda não estava aberto (de lá partem os buses para Termas de Chillán). Pegamos um taxi e chegamos no terminal para descobrir que até as Termas o ônibus só saia as 8 horas.

    No ônibus notamos que a maioria dos passageiros saltou em Las Trancas, vilarejo 8 km abaixo das Termas. Apenas 5 passageiros prosseguiram no micro, eu, Fabio, Cris e um casal de chilenos.

    Vinte minutos depois saltamos no ponto final e andamos pelo acostamento mais 1 km até o estacionamento do hotel onde iniciava a trilha.

    A poeira acumulada no sendero indicava que não chovia há bom tempo. Em alguns pontos três dedos de altura de pó fino. Trilha íngreme no seu começo, através de um bosque de lengas.

    Meia hora depois saimos da linha de árvores e chegamos nas fumarolas, onde água termal é captada para a piscina dos hoteis. Cris e Fábio tiraram fotos e fizeram vídeos, improvisando malabares com as pedras, para divulgar o trabalho do Taturana Circus.

    Chegamos no 1º passo onde escolhemos o caminho da esquerda, que considerei muito melhor ano passado. Ele segue uma curva de nível.

    Depois o sendero empina e segue em zigzag até o passo Pirigallo onde um gendarme (agulha) bem visível marca o ponto.

    Ao longe, ao Sul, mostrei o vulcão Antuco e a Sierra Velluda onde eu e Lúcia fizemos o circuito (ver relato "Andanças pelo Chile 3 - O caminho dos mortos").

    Passo Pirigallo. O vulcão Antuco e a Sierra Velluda estão bem ao fundo, juntinhos ao boné da Cris.

    Depois de algumas fotos começamos a descer para o Valle das Águas Calientes.

    Mostrando o vale para o qual desceríamos.

    Descida para o Vale.

    Ao alcançarmos o chão do vale abastecemos de água nossos cantis. Neste trecho apenas o primeiro riacho, com água fria, é potável. A água termal, quente, tem muitos sais minerais dissolvidos e provoca problemas digestivos. Para saber se podemos beber uma água basta colocar a mão e sentir se é termal ou não.

    Prosseguimos para o fundo do vale, que fica atrás de uma aresta que o divide em dois. Em 2024 eu e Lucia, pelo adiantado da hora, ficamos neste primeiro trecho.

    Tivemos que tirar os calçados para atravessar um riacho quente. Fui o primeiro e gritei quase ao chegar na outra margem. Pisei numa água extremamente quente que estava cozinhando meu pé. Um pequeno córrego com água quase fervendo saia neste ponto para se unir ao riacho que acabara de atravessar. Corri para cima das pedras.

    Devemos sempre testar a água antes de pisar.

    Passamos por algumas ondulações do terreno, contornamos a aresta e dobramos para a esquerda rumo ao fundo do vale.

    Um rebanho de bois da raça angus pastava tranquilamente.

    Embora o primeiro trecho seja também legal para acampar, no fundo do vale (que ainda não conhecia) dizem ser melhor.

    Lá fomos nós. Divisamos nosso destino com 30 minutos.

    Nosso destino no fundo do vale, na área sombreada por nuvens.

    Um macete que aprendemos: deveríamos ter seguido para o local sempre andando junto a encosta das montanhas a esquerda, chão bem mais seco. O centro do vale, por onde seguimos, tinha diversos charcos.

    Com cerca de uma hora chegamos lá com os calçados molhados. Havia duas tendas já armadas no lugar.

    A cachoeira que caia em três piscinas termais, em sequência, brotava da terra e soltava vapor. Após montarmos as barracas caimos na piscina do meio, maior e mais gostosa. Tiramos nossos relógios e mergulhamos na água e eles indicaram 37ºC em média. Delícia.

    Foto da Cris.

    Vista de cima das piscinas, com a visão de onde viemos.

    Nossas barracas pertinho do rio. A fumarola de onde brota a água quente é visível.

    Os moradores das outras duas barracas apareceram. O Adrian, franco-japonês, que estava numa Lanshan 1 Pro, que percorria a GPT (Greater Patagonian Trail - este vale faz parte da Seção 8 da GPT). Ele mostrou fotos de trechos interessantes da GPT na Tierra del Fuego. E o outro vizinho, Roni, escalador chileno, estava numa barraca Doite.

    O Fábio trouxe uma garrafa PET com vinho e copos para dentro do rio onde estávamos sentados ou deitados. Coisa chique!

    Vida boa depois do frio e da chuva de Hornopirén! Fotos da Cris.

    Depois de algum tempo fui o primeiro a sair d'água. Queria repousar um pouco na barraca. A noite anterior no ônibus foi mal dormida.

    Levantei a tempo para filmar e fotografar as montanhas alaranjadas a leste do vale, iluminadas pelo sol que desaparecia a oeste.

    Fizemos nossa refeição com fogareiros ao abrigo de pedras. O pisco caiu bem como aperitivo. Dava vontade de voltar ao rio novamente.

    Ao entardecer, como de praxe, o vento mudou de direção, passando a soprar do fundo do vale (norte) em direção ao sul, descendo das montanhas.

    ...

    Durante a manhã, ainda escuro, Cris e fábio ouviram Adrian e Roni partirem. Eles iriam subir ao cume do vulcão Chillán Viejo. Nós estavamos cansados, não quisemos participar desta empreitada de 8 horas.

    No fundo deste vale não dava para enxergar o Chillán Viejo. Onde acampamos em 2024 era possível vê-lo.

    Ontem a noite, após dormirmos, chegaram dois chilenos que montaram a tenda mais abaixo.

    Durante o dia, para nosso espanto, vimos praticantes de motocross descerem para o vale através de ladeiras com declive acentuado. Via a hora de um capotar na descida. Não aconteceu isto. Eles tinham técnica. Ao menos 20 motoqueiros. Como este vale não é reserva nacional, esta prática é permitida. Parte do grupo veio tomar banho na piscina. Era sábado. Este vale fica vazio durante a semana. O povo das redondezas vem para cá nos finais de semana.

    Perto das nossas tendas e do rio uma marmota desinibida cavava um buraco jogando terra para fora. Volta e meia botava a cabeça fora do buraco para nos espiar. Cris pegou sua câmera e pacientemente esperou o momento para uma foto. Mas a marmota pregava peças. Saia em outro buraco (túneis interligados) e não onde tinha sido vista da última vez. Mas Cris conseguiu uma boa fotografia.

    Resolvi comer no almoço um ramen coreano apimentado que havia comprado no bairro da Liberdade em SP. Cris me avisou para não botar o sachê de pimenta ou só metade dele. Quê? Eu criado na Bahia vou ter medo de pimenta! Kkkkk. Rapaz, primeira garfada fiquei vermelho e comecei a soluçar! Pense numa coisa super picante! Sorte que Fábio me ofereceu uma farofa que ajudou a diluir a pimenta. Comi tudo (na educação luterana botou no prato tem que comer), um suplício.

    Pouco depois tive que deixar o acampamento para o número 2.

    Após o almoço decidimos subir o passo no fundo do vale. Em meia hora estávamos lá em cima. Vi distante, a nordeste, o vulcão Descabezado Grande do outro lado do passo.

    Vista do passo para o Valle das Águas Calientes. Fotos a seguir da Cris.

    Tipico terreno de origem vulcânica.

    Exploramos um pouco aquela área e depois descemos. Chegamos no camp as 16 horas, a tempo de vermos a chegada de Adrian e do Roni. Eles conseguiram fazer cume.

    Nesta subida e passeio ao passo tive de ir mais duas vezes ao banheiro. Agora respeito a comida coreana.

    Fomos todos para a piscina. Como sempre, fui o primeiro a sair. Adrian, Cris e Fábio ficaram conversando. Neste dia ficaram 5 horas dentro da água termal!

    Fiquei na barraca assistindo uma série da Netflix.

    Sairam da piscina quase no escuro. Fizemos a janta. Combinamos com Roni que regressaríamos juntos para as Termas de Chillán dia seguinte. Adrian seguiria para o passo que fomos ontem, seguindo a GPT.

    Vento Norte forte descendo o vale durante a noite. Achei que estava chovendo. Botei a mão fora da tenda e nada. Descobri que o barulho contra o tecido era dos grãos de areia vulcânica jogados contra ele. Uma poeira fina vulcânica estava dentro da barraca. Havia passado pelo mesh do tecido mosquiteiro durante a noite. Esta areia muito fina é o terror dos zíperes das barracas.

    Arrumando o cafofo antes de dormir (foto Cris).

    ...

    Dia seguinte saímos do acampamento 9 horas. Pouco depois o sol iluminou onde acampamos. Difícil sair mais cedo pelo frio.

    Adrian teve oportunidade de se despedir de nós, após trocarmos endereços. Rumou solitário para o passo. Estava vivendo sua epopéia. Cara bom de trilha. Eu gostaria de ter tempo para realizar o que ele estava fazendo.

    Os dois chilenos sairam também. Mais rápido seguiram na frente. desta vez fomos mais junto da encosta (mais seco) e mais rápidos. Tinhamos um ônibus baixando das Termas para Chillán as 16:30.

    No riacho quente os dois chilenos conheciam um ponto para uma travessia seca. Desta vez não tiramos o calçado. Neste lugar uma garota tomava banho tranquilamente de bikini.

    Me chamou a atenção o número de barracas no local, pelo menos 12. Devem ter chegado no sábado e não quiseram andar mais uma hora até o fundo do vale, onde estávamos. Alguns já desarmavam as tendas para voltar as Termas. Ano passado eu e Lúcia acampamos sozinhos aqui (dia de semana).

    Começamos a subir para o passo Pirigallo. Um vento forte nos acompanhava. Vários grupos já estavam subindo. Pela inadequação da vestimenta e dos equipamentos percebemos que poucos eram montanhistas. Rajadas fortes, de 70 a 80 km/h, desequilibraram.

    Vista para trás, do vulcão Chillán Viejo (foto Cris).

    Numa crista antes da subida final, formando um selado, o bicho pegou. O vento afunilado tornava as rajadas mais ferozes. Tive de me abaixar um pouco e botar o bastão da esquerda a 45º contra o chão para me escorar e assim superei o trecho. Pensei que Cris, magrinha, ia voar e nos encontrar lá embaixo nas Termas de Chillán.

    Pouco antes vimos famílias temerosas e uma adolescente chorando, com medo da ventania.

    Nos reunimos pouco antes do passo Pirigallo, a sotavento de uma aresta, aguardando Roni. Ele estava mais lento com uma mochila bem pesada, com piolet e capacete inclusive. Comentamos sobre aquela passagem difícil.

    A descida foi tranquila. Encontramos mais gente que subia para o passo, para fazer um bate e volta ao vale. Creio que não estavam bem preparados para o que tinham pela frente (a descida do outro lado).

    Descendo do outro lado do passo (fotos da Cris).

    Perto das termas, já no bosque, um grupo praticante de downhill subia penosamente, arrastando suas bikes de pneus grossos. Até o passo seriam duas horas suadas. Isto para desfrutar de uma descida de 20 minutos (mas com bastante adrenalina).

    Descemos rápido chegando ao início da trilha. Teríamos que esperar muito pelo busão de 16:30.. Não havia bares e restaurantes abertos, afinal uma estação de ski normalmente só funciona no inverno. Resolvemos adiantar descendo. Porém vi um carro com placa vermelha. Imaginei ser um taxi. Fabio percebeu que o motorista estava dentro, parecia estar cochilando. Fui até lá e perguntei se era taxi e se poderia fazer um flete até La Tranca, 8 km abaixo. Disse que sim, mediante uma propina (gorjeta). Ofereci 10.000 pesos. Entramos os quatro no carro. O motorista estava esperando um grupo que desceria do vale no final da tarde. Era uma oportunidade de ganhar um dimdim extra. Dinheiro bem pago,

    O motorista deixou-nos diante do primeiro restaurante que estava aberto, El Tren. Parte do restaurante era um museu, um vagão leito luxuoso da época da 2ª guerra, que subia até las Trancas. Tinha suíte com banheiro privativo e ducha, camarote com beliches e uma sala de estar. O vagão inteiro foi concebido para um casal com dois filhos.

    Fomos devorar nosso almoço e aproveitar o WIFI.

    Pegamos o ônibus 17:30. Chegamos em Chillán por volta de 18:30 onde compramos as passagens para Santiago. Chegaríamos na capital as 5 da manhã de segunda.

    Assim terminaram nossas aventuras pelo Chile. Gostei muito de percorrer um trecho ainda inédito para mim da Carretera Austral (Puerto Montt-Coihaique). O trecho Coihaique-Cochrane já conhecia de 2016. Deste modo conheço hoje aproximadamente 3/4 da Carretera Austral, faltando o tramo final, de Cochrane até Vila O'Higgins (final da carretera).

    Relato dedicado a estes grandes amigos e trilheiros excepcionais. Sempre de bom humor não importando quão adversa é a situação!

    Peter Tofte
    Peter Tofte

    Publicado em 06/04/2025 09:07

    Realizada de 21/03/2025 até 23/03/2025

    Visualizações

    523

    1 Comentários
    Duda Borges 09/04/2025 20:38

    Que trip dos sonhos! Três amigos queridos e com os quais já tive a honra de trilhar! Obrigado por mais este relato meu amigo!!!

    1
    Peter Tofte

    Peter Tofte

    Salvador, Bahia

    Rox
    4200

    Carioca, baiano de criação, gosto de atividades ao ar livre, montanhismo e mergulho. A Chapada Diamantina, a Patagônia e o mar da Bahia são os meus destinos mais frequentes.

    Mapa de Aventuras


    Mínimo Impacto
    Manifesto
    Rox

    Renan Cavichi, Peter Tofte e mais 451 pessoas apoiam o manifesto.


    Juntos
    Aventuras Inclusivas
    Rox

    Fabio Fliess, Peter Tofte e mais 181 pessoas apoiam o Juntos.