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André Lima 18/04/2020 21:51
    Pedalando na América Austral #11

    Pedalando na América Austral #11

    Primeiros quilômetros na Argentina.

    Cicloviagem Acampamento

    Como de costume, deixo aqui o link do post anterior, pois esse post é parte da série Pedalando na América Austral, uma cicloviagem que realizei entre 2015 e 2016, também deixo no final uma lista com todos o posts publicados até o momento.

    No último post contei que entrei na Argentina após pegar uma carona em um caminhão para atravessar a ponte, ainda faltavam 30 km pela frente e logo percebi que aquela rodovia não seria fácil por ser uma rota de caminhões, pouco antes de chegar a entrada de Gualeguaychú há uma pequena vila chamada General Belgrano e que também dá acesso à cidade, resolvi passar por dentro da vila para desviar do transito da rodovia, a essa hora eu estava morto de fome, não carregava nada pronto para comer, tudo o que tinha precisava cozinhar, nesse momento um garoto estava caminhando com uma cesta a beira da estrada começou a acenar para mim, diminui a velocidade, a cesta estava cheia de pães, ele me entregou um e disse “regalo”... presente... obrigado!!! A fome era tanta que comi quase metade do pão ali mesmo.

    Chegando em Gualeguaychú|Argentina

    Passei pelo centro de Gualeguaychú e fui procurar o coushsurfing que eu tinha contatado, o local era um hostel e ficava do outro lado da cidade, estava fora de temporada então estava vazio, encontrei o dono na rua, seu nome é Facundo, ele tinha saído para comprar frango empanado para prepara nosso jantar, ficamos conversando e tomando cerveja enquanto, Facundo recebeu uma ligação de um familiar que o informou sobre o estado de saúde de sua avó, ela estava internada em Buenos Aires e segundo ele não estava nada bem, disse a ele que iria procurar outro lugar caso ele precisasse viajar para Buenos Aires, mas ele disse que não poderia fazer nada e que eu podia ficar tranquilo, no dia seguinte ele recebeu a notícia de que sua avó tinha falecido e que ele iria para Buenos Aires na manhã seguinte, eu ainda estava fazendo meu planejamento para os próximos dias, Facundo disse que eu podia ficar à vontade e poderia até mesmo ficar no hostel até seu retorno, achei a ideia interessante pois tinha internet e um lugar tranquilo para planejar os próximos dias, mas resolvi seguir viagem no dia seguinte, aproveitei que ele tinha uma pick-up e pedi uma carona até Ceibas que era um pequeno povoado a 60km de Gualeguaychú, e estava em seu caminho para Buenos Aires.

    Em Ceibas, ele parou em um posto na beira da estrada, eu disse mais uma vez que sentia muito por sua perda e nos despedimos, depois de montar a bicicleta eu comi um lanche no restaurante do posto e segui viagem, pedalei cerca de 12 km até a entrada da estrada que leva a Villa Paranacito, um pequeno povoado que fica no delta do Rio Paranacito onde ele encontra o Rio Uruguay, mas para chegar a vila eu ainda precisava pedalar mais 20km contra o vento, quando faltavam 5km para chegar na vila o asfalto deu lugar a uma estrada de terra, e logo começaram a aparecer os primeiros campings, encontrei um pequeno camping com um bom preço na beira do rio, o dono ainda fazia algumas obras para prepara-lo para a temporada mas o lugar era tranquilo e bom, nesse camping tinha chuveiro elétrico algo difícil de encontrar ao sul do Brasil onde a maior parte dos lugares usa aquecedor a gás, após montar a minha barraca, fui conhecer a vila caminhando, aproveitei para tomar um sorvete e também comprar alguns mantimentos.

    Eu e Facundo em Ceibas|Argentina

    No dia seguinte o objetivo era chegar em Zarate, uma viagem de 90 km tomei o café da manhã bem tranquilo em uma mesa ao lado o rio, nesse momento eu não sabia esse seria um dos dias mais complicados da viagem até então, tudo por conta da RN 12 uma das mais movimentadas da Argentina e faz a ligação de Buenos Aires com o norte do país e nesse ponto já recebeu o trafego da RN 14 que faz a ligação com o Uruguay, muitos caminhões em uma estrada sem acostamento me obrigou a pedalar olhando pra traz a todo instante e saindo da pista para a grama a todo momento.

    Eu estava no meio do caminho, quando o céu começou a ficar escuro de uma forma que eu ainda não tinha visto, era possível ver no horizonte uma tempestade muito forte se formando, a chuva começou logo quando eu estava em frente a uma fazenda, vi algumas pessoas e fiz sinal, um garoto correu até a porteira, expliquei que queria me abrigar até a chuva passar para poder seguir viagem, o garoto foi perguntar aos seus pais e logo em seguida retornou para abrir a porteira, ele me indicou uma pequena casa velha ao lado da casa de seus pais, seu irmão mais novo logo veio junto e os dois ficaram curiosos com a bicicleta e com aquele ser estranho fantasiado de ciclista e que não falava muito bem seu idioma.

    Camping na Villa Paranacito

    Enquanto eu esperava a chuva passar, expliquei para os garotos a viagem, de onde eu era e para onde estava indo, um deles saiu e voltou logo depois com uma panela de arroz e um pão, ele serviu o arroz e colocou o único pão que tinha em meu prato, achei o gesto muito generoso e logo lembrei da história de um mochileiro que passou por uma situação parecida, decidi que não podia comer todo o pão, então resolvi corta-lo em 3 pedaços mais ou menos iguais, esse foi um pequeno momento de tranquilidade em um dia difícil, a chuva parou mas o céu continuou cinza.

    Continuei pedalando olhando pra traz e saindo para a grama a cada caminhão que se aproximava, ao longe comecei a ver a primeira ponte gigante que eu teria que enfrentar nesse dia, a Ponte General Urquiza sobre o Rio Parana Guazu, ao chegar perto percebi o quão perigoso era atravessar aquela ponte de bicicleta, não tinha alternativa pois a bicicleta não entrava na passagem de pedestres que era muito estreita, então esperei o momento certo e comecei a travessia pela pista, conforme eu subia a ponte o vento ficava cada vez mais forte o que me fez começar a brigar com a bicicleta para continuar pedalando, foi quando um caminhão me ultrapassou, não tirou fina mas no susto eu me desequilibrei e fui para o lado colidi na mureta e cai de volta na pista, no momento não pensei em mais nada apenas levantar o mais rápido possível para sair do meio da via e ficar o máximo possível colado no canto, olhei pra traz e fiquei um pouco aliviado não vinha nenhum veículo, levantei a bicicleta e a apoiei, meu joelho esquerdo estava esfolado, braço esquerdo todo estava dolorido e essa dor persistiu por muitos dias, principalmente no pulso, um pouco abalado pelo susto resolvi que tinha que sair dali o mais rápido possível e não havia outra forma se não continuar a travessia com muito medo de ser atropelado, acho que de toda a viagem esse foi o momento em que tive mais medo de algo ruim acontecer.

    Garotos que me ajudaram a fugir da chuva

    Cheguei ao outro lado da ponte ainda assustado, desanimado e muito dolorido, sabia que 10 km a frente eu teria outra ponte igual pra atravessar e isso me deixava mais apreensivo, a estrada entre as pontes continuava perigosa me obrigando a olhar para traz e sair para a grama a cada caminhão, cheguei na Ponte General Bartolomé Mitre sobre o Rio Paraná a noite, encostei a bicicleta e fui analisar a passagem de pedestres, no sentido em que eu estava seguindo a passagem era estreita, atravessei a pista e vi que no outro sentido a passagem de pedestres era mais larga, não dava para pedalar por causa dos postes de iluminação mas era possível empurrar a bicicleta, mas tinha um desnível de 50cm para subir na calçada, como é praticamente impossível levantar uma bicicleta carregada com 50kg, resolvi tirar toda a bagagem e subi a bicicleta, após arrumar tudo comecei a empurrar a bicicleta ponte a cima, a passagem pelos postes era estreita e vez ou outra eu tinha que desenroscar um alforge que ficava preso, a travessia da ponte durou mais de uma hora, cheguei em Zarate já havia passado das 22h, olhei no mapa a localização do meu contato do Warmshower, a casa não era difícil de encontrar, mas fiquei pensando se não seria inconveniente chegar tão tarde, isso estava me preocupando não teria outro lugar para ficar, mas tive um dia difícil, meu braço doía e eu queria um lugar tranquilo para descansar, segui até a casa do meu contato, toquei a campainha e uma mulher atendeu e ela me pareceu um pouco assustada, eu expliquei que procurava por Adrian, ela era Romina esposa de Adrian, me convidou para entrar e falou que achava que eu havia desistido de ir até a casa deles, expliquei tudo o aconteceu e porquê cheguei tão tarde, Adrian estava por perto e logo chegou em casa, eles preparavam o jantar enquanto eu fui tomar um banho e me recuperar do dia difícil.

    No jantar Adrian disse que era produtor de cerveja artesanal e abriu uma garrafa de sua produção, na manhã eles foram trabalhar e eu fique na casa, tratei de lavar um pouco das minhas roupas e aproveitei para andar um pouco por Zarate e comprei um chip de celular, nesse dia Adrian retornou mais cedo do trabalho pois tinha uma entrega de um barril de chopp para fazer, eu o acompanhei nessa entrega, também passamos em um mercado para comprar carne para um churrasco mais tarde eu contribui comprando pão e mais alguma coisa. Naquela noite aconteceu um encontro dos produtores de cerveja artesanal locais, eles contrataram um mestre cervejeiro de Buenos Aires para ministrar um curso na casa do Adrian, eu fique lá vi o curso e provei várias cervejas e no fim fizemos o churrasco, fui dormir depois das 2h da manhã pra lá de bêbado.

    Uma amigo do Adrian, Adrian usando a camisa da seleção argentina e Romina

    Sai da casa de Adrian e Romina um pouco mais tarde do que gostaria, mas muito animado pois mais uma vez havia encontrado pessoas boas em meu caminho, na saída de Zarate em uma troca de marcha forcei muito a corrente em uma pequena subida, por esse erro, a corrente quebrou e eu empurrei a bike até um posto de gasolina perto para consertar, reparo feito segui viagem, andei cerca de 8km e parei em outro posto com um lanchonete e fui comer um lanche, quando decidi seguir percebi dei falta da minha capa de chuva, o primeiro pensamento foi furto, mas logo pensei o gps ainda está no guidão, quem roubaria uma capa de chuva e deixaria o gps, lembrei do posto anterior onde parei para consertar a corrente, fiquei pensando se iria prosseguir ou retornar, retornei pois poderia precisar da capa, andei mais 2 km até encontrar um retorno e voltar a Zarate, ao chegar no posto a capa estava no chão no mesmo canto onde eu parei, ninguém a viu ou pensaram que era um pedaço de lixo jogado no chão.

    Capa de chuva recuperada segui viagem, o objetivo do dia era chegar em Luján, seguindo o conselho do Adrian, fui por uma pequena estrada muito tranquila que leva a Capilla del Señor, nesse caminho encontrei um ciclista que estava treinando, seguimos pedalando e conversando, ele morava em Capilla del Señor e perguntou se eu precisava de algo para seguir viagem, apenas água respondi, fomos até sua casa onde peguei agua e descansei um pouco ele me mostrou sua sala de troféus de ciclismo, seu nome era Manangua, fiz um pequeno vídeo para registrar o encontro agradeci pela água e segui viagem. O caminho até Luján não era difícil, mas ao me aproximar da cidade fiquei um pouco desanimado, pois a entrada da cidade era por uma avenida movimentada e barulhenta com um aspecto de periferia, logo localizei a avenida onde haviam dois campings, fui me informar, um estava reservado para uma festa e por isso não estava recebendo campistas e o outro era muito caro, procurei mais e a algumas quadras dali encontrei outro camping, quase desabilitado, o banheiro masculino estava interditado e o feminino tinha só um ou dois chuveiros funcionando precariamente, esse camping era um pouco mais barato que o outro da avenida principal, mesmo assim caro para os padrões de um camping, como eu já estava dentro da cidade, cansado de pedalar e estava ficando tarde resolvi ficar ali mesmo acho que eu era o único campista ali, para quem não conhece a cidade, Luján é muito visitada por conta de sua basílica, muito movimentada e por isso qualquer tipo de hospedagem é muito mais cara que a média de outras cidades próximas. Esse post fica por aqui, no próximo conto o reencontro com o Oscar em Cañuelas e os dias que se seguiram.

    Manangua em Capilla del Señor|Argentina

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    Publicado em 18/04/2020 21:51

    Realizada de 05/10/2015 até 31/03/2016

    Visualizações

    1404

    2 Comentários
    Suelen Nishimuta 22/04/2020 22:43

    Essa parte da viagem foi com um gostinho a mais... gostinho de muita cerveja Argentina, né? Rs...

    1
    André Lima 22/04/2020 22:46

    Su, foi sim, muita cerveza artesanal!!!rsrs

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    Ciclista, viajante e pai do Theo e da Mariana :) Autor do antigo blog PedalandoBicicletas e sempre planejando a próxima aventura!!! Instagram @andr.slima

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